O compositor e intérprete baiano Tiganá Santana é o curador da nova exposição temporária do Museu da Língua Portuguesa, na capital paulista: “Línguas Africanas Que Fazem o Brasil”. A mostra destaca a influência das línguas iorubá, eve-fom e do grupo bantu no português falado no Brasil e na cultura nacional e será aberta na próxima sexta-feira (24).
O projeto busca mostrar como o dia a dia do povo brasileiro é atravessado pelas presenças africanas na forma como nos expressamos, seja na entonação, no vocabulário, na pronúncia ou na forma de construir o pensamento. Neste sentido, a curadoria de Tiganá é preciosa, já que, além de estudioso no tema, foi pioneiro na apresentação de um álbum com canções em línguas africanas no país.
“Ao mesmo tempo que a gente quer mostrar ao público que falamos uma série de expressões e estruturas que remontam a línguas negro-africanas, também desejamos revelar de que maneira isso acontece. Por que falamos caçula e não benjamim? Por que dizemos cochilar e não dormitar? Essas palavras fazem parte de nosso vocabulário, da nossa vida, do nosso modo de pensar”, afirma o baiano.
A exposição, que fica em cartaz até janeiro de 2025, recebe o público com 15 palavras oriundas de línguas africanas impressas em estruturas ovais de madeira penduradas pela sala. Serão destacadas palavras como bunda, xingar, marimbondo, dendê, canjica, minhoca e caçula, que o público também poderá ouvir nas vozes de pessoas que residem no território da Estação da Luz, onde o museu está localizado.
Outros baianos
Outro destaque no espaço é a obra do artista plástico baiano J. Cunha – um tecido estampado com os dizeres “Civilizações Bantu”, que vestiu o tradicional Ilê Aiyê, primeiro bloco afro do Brasil, no Carnaval de 1996. Por sua vez, a conterrânea Rebeca Carapiá assina obras de arte criadas em diálogo com frequências e grafias afrocentradas, a partir de seu trabalho com metais. Já a conceituada designer Goya Lopes apresenta dois trabalhos, cujas principais referências são as capulanas, panos coloridos usados por mulheres em Moçambique, que enfatizam uma articulação significativa com a língua iorubá.
Cerca de 20 mil búzios também estarão suspensos e distribuídos pelo ambiente, reforçando a tradição afro-brasileira, na qual as conchas são usadas em práticas divinatórias e funcionam como linguagem que conecta o mundo físico e espiritual. “Os búzios estão presentes nos espaços afro-religiosos no Brasil que foram, não os exclusivos, mas os principais núcleos de preservação e reinvenção das línguas africanas do Brasil. A partir deles, as presenças negras se irradiaram para outras dimensões da cultura popular brasileira”, diz Santana.
Música
Sendo fruto da curadoria de Tiganá, um músico da mais alta qualidade, a exposição não poderia deixar de “falar” de música e mostra como canções populares no Brasil foram criadas a partir da integração entre línguas africanas e o português, como “Escravos de Jó” e “Abre a Roda, Tindolelê”.
O público terá acesso a uma série de registros de manifestações culturais afro-brasileiras e de conteúdos sobre as línguas africanas e sua presença no português do Brasil. Há performance da cantora Clementina de Jesus, imagens da Missão de Pesquisas Folclóricas idealizada por Mário de Andrade, entrevistas com pesquisadores como Félix Ayoh’Omidire, Margarida Petter e Laura Álvarez López, além de gravações de apresentações do bloco Ilú Obá De Min e da Orkestra Rumpilezz.
Todas essas obras estarão expostas em meio a sons de canções rituais e narrativas em iorubá, fom, quimbundo e quicongo, captados pelo linguista norte-americano Lorenzo Dow Turner nos anos de 1940 na Bahia e cedidos pela Universidade de Indiana, nos Estados Unidos. Será possível, ainda, assistir aos filmes sobre o Quilombo Cafundó: um que já existia há mais de 40 anos e outro que foi concebido para a exposição, versando sobre a língua cupópia de modo mais enfático.
O Museu da Língua Portuguesa fica na Praça da Língua, na Luz, em São Paulo, e pode ser visitado de terça a domingo, das 9h às 16h30.
Fonte: Alô alô Bahia / Foto: Guilherme Sai