Por Marcelo Zurita,Editado por André Lucena – Sexta, 16 de abril de 2021
Em 12 de abril de 1961, os russos realizaram mais uma grande proeza da humanidade: a bordo da sonda Vostok-1, Yuri Gagarin se tornava o primeiro ser humano a viajar pelo espaço e retornar com segurança para a Terra. Mas somente agora, 60 anos depois dessa aventura, documentos revelam que na verdade, essa viagem não foi tão segura assim. Foi uma viagem bem problemática e que, por pouco, não terminou em uma fatalidade.
Não dá para imaginar que o primeiro voo tripulado ao espaço, em meio a uma insana corrida espacial, seria algo 100% seguro. Na verdade, até hoje não é. Mas o que os documentos, que até há pouco tempo eram confidenciais, revelam, é que a segurança passou longe daquela missão. O histórico voo espacial de Yuri Gagarin foi uma verdadeira “roleta russa”.
Só para se ter ideia, na preparação da nave de Gagarin e de duas missões anteriores com cachorros, pelo menos 70 anomalias detectadas nos instrumentos de bordo foram completamente ignoradas pelo comando da missão. Talvez porque os cachorros não ligariam para isso, e Gagarin era bom demais para depender dos instrumentos. Mas a coisa foi tensa!
Yuri Gagarin foi, realmente, escolhido a dedo. Nascido em uma família de camponeses, Gagarin se interessou pela astronomia desde jovem, e sonhava com o dia em que viajaria ao espaço. Com apenas 21 anos, ele já havia aprendido a pilotar aviões e ingressou para a Força Aérea Soviética, onde passou por um rigoroso treinamento para se tornar um cosmonauta.https://s.dynad.net/stack/928W5r5IndTfocT3VdUV-AB8UVlc0JbnGWyFZsei5gU.html
Na época, com 27 anos, Gagarin era considerado um piloto frio, habilidoso, corajoso, e confiante, mas não arrogante. E como sua altura de 1 metro e 65 era adequada para caber na Vostok-1, tinha o perfil ideal para o primeiro voo tripulado ao espaço.
E ele precisaria de todas essas virtudes para sair vivo dessa missão. Os documentos revelados agora indicam que durante o voo de 106 minutos ao redor da Terra, o sistema de suporte à vida da Vostok-1 não atendeu totalmente aos requisitos do projeto. Ainda assim, ao contrário do que muitos especulam, ele não passou mal durante a missão, mas por pouco, Gagarin não se tornou o primeiro ser humano a morrer asfixiado no espaço.
Também foi relatada uma falha nas válvulas de um dos estágios do foguete Soyuz que levou a Vostok-1 até o espaço. Essa falha colocou a nave em uma órbita bem mais alta, com o perigeu atingindo 327 quilômetros de altitude, 97 quilômetros além do planejado. Isso deu a Gagarin uns instantes a mais para apreciar a Terra do espaço, mas aumentou ainda mais o risco da missão.
Para retornar para a Terra, a Vostok-1 precisaria acionar seu retrofoguete, que funcionaria como freio para a nave. Se o retrofoguete não funcionasse, a nave deveria reentrar naturalmente na atmosfera em uma semana, se tivesse mantido a órbita planejada originalmente. Isso não seria um grande problema porque a Vostok-1 estava preparada com mantimentos para 10 dias. Só que com a órbita mais alta, ela levaria mais de um mês para reentrar naturalmente, e Gagarin não sobreviveria esse tempo todo no espaço.
Felizmente, o retrofoguete funcionou, mas não tão bem. Uma falha em outra válvula fez com que o retrofoguete permanecesse acionado por alguns segundos além do planejado. Isso, além de fazer com que Gagarin pousasse fora do local planejado, também induziu outra falha no sistema de ejeção da cápsula de reentrada, que deveria ocorrer logo após o desligamento do retrofoguete.
O vazamento do gás do sistema de ejeção que não funcionou provocou um desconfortável giro da espaçonave, e o módulo de instrumentos com retrofoguete preso na cápsula introduziu um risco adicional de que alguma peça pudesse se desprender na reentrada e danificar a cápsula, transformando Gagarin no primeiro meteoro humano da história.
Por sorte, o módulo de instrumentos se desprendeu no início da reentrada sem causar danos, e a aerodinâmica da passagem atmosférica estabilizou a cápsula no momento mais intenso do retorno à Terra, quando a resistência do ar reduz violentamente a velocidade da nave, criando uma bolha de plasma em torno dela. Gagarin literalmente, voltou para a Terra dentro de um meteoro.
Quando atingiu 7 quilômetros de altitude, Gagarin se ejetou da nave. Apesar dos soviéticos terem ocultado essa ejeção por vários anos, esse era o plano para evitar que seu cosmonauta se espatifasse no chão dentro da cápsula. Os últimos 7 quilômetros dessa aventura seriam cumpridos fora da nave, e de paraquedas. Mas não sem emoções adicionais.
Durante a ejeção, o cabo que ligava Gagarin a uma bolsa de suprimentos se rompeu. Esses suprimentos seriam essenciais para sua sobrevivência caso pousasse em um local de difícil acesso. Para completar, uma falha no acionamento do paraquedas fez com que o paraquedas reserva se abrisse parcialmente junto com o principal. Dá para imaginar o que aconteceria se os dois se enroscassem.
Felizmente, isso não ocorreu, mas Gagarin ainda experimentou a estranha sensação de não conseguir controlar seu paraquedas devido às restrições de movimento do traje espacial. Em um dos documentos liberados pelos russos, o chefe da missão relata que Gagarin, pasmem, não havia treinado saltos de paraquedas naquelas condições.
Sem mais intercorrências e, ao sabor do vento, Gagarin chegou inteiro, de volta ao solo russo. O último risco que ele ainda correu foi ter sido confundido com um alienígena. Mas foi rapidamente reconhecido pelo idioma e recebido calorosamente por um camponês e sua filha, que o encontraram pedindo ajuda no meio de uma plantação de batatas. Não é todo dia que alguém vindo do espaço pousa no seu quintal, não é?
Com uma ligação para Moscou e com uma comemoração nacional, como não se via desde o fim da Segunda Guerra, terminava com final feliz uma das maiores proezas da humanidade. Superando todas as dificuldades de uma história que tinha tudo para terminar em tragédia, Yuri Gagarin se tornou o primeiro ser humano a viajar pelo espaço e retornar com vida para a Terra. Informações do site Olhar Digital.