Aos 22 anos, Samuel Tamanini Camargo, paciente do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da USP em Bauru, cursa Ciências Biológicas na Universidade Estadual de Maringá e sonha em se dedicar à área de genética
Domingo, 20 de fevereiro de 2022
“Se eu imaginasse que um dia iria escrever um livro, teria feito um diário ao longo desses anos todos, para registrar os detalhes dessa caminhada.” A afirmação é de Célia Tamanini, 57, de Porecatu (PR), mãe que relatou em livro passagens de lutas, adversidades, fracassos e também de alegrias e vitórias vivenciadas durante os 19 anos de vida do segundo filho, Samuel Tamanini Camargo, nascido com uma síndrome rara.
Durante um ano e meio, entre meados de 2019 até o final de 2020 – já no decorrer da pandemia de covid-19 – a paranaense, munida de papel e caneta, decidiu partilhar suas experiências e trajetória em busca da reabilitação, inclusão e autonomia do filho. Nesse processo, a memória e as lembranças foram aflorando, dando vida a uma comovente e inspiradora obra, que mostra a dimensão do amor e a obstinação de uma mãe para propiciar ao filho uma vida com o mínimo de limitação possível e despertar nele a força para seguir sempre em frente e vencer os obstáculos impostos pelas deficiências decorrentes da síndrome.
Com incidência de 1 em cada 100 mil recém-nascidos, a síndrome de Pfeiffer é um distúrbio genético raro caracterizado pela fusão prematura de ossos do crânio (craniossinostose). O indivíduo com a síndrome pode ter alterações no terço médio da face, olhos salientes, avanço mandibular, polegares e dedos dos pés aumentados, entre outros sinais. A maioria das pessoas afetadas também apresenta perda auditiva.
A descoberta da condição do filho ocorreu somente após o parto. Segundo Célia, os médicos envolveram Samuel em um lençol e deixaram somente uma parte do rosto de fora. Naquela madrugada, ela diz apenas ter ouvido o choro baixo do bebê e o visto rapidamente. Não pôde acariciá-lo naquele instante. Só na manhã seguinte recebeu a notícia de que o filho havia nascido com distúrbio genético e pôde, então, ver melhor a criança. Célia conta que não chorou nem se desesperou. Apenas contemplou aquele momento, amou o seu filho – ainda que seu bebê fosse diferente – e prometeu a si mesma lutar por aquela vida.
Trajetória de tratamento no Centrinho
“O início não foi nada fácil. Samuel chegou ao Centrinho, Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC) da USP em Bauru, ainda no primeiro mês de vida. Além da aparência diferente, teve muita dificuldade para comer e respirar. Ele já passou por diversas cirurgias, tratamento odontológico, atendimento na área de saúde auditiva, entre outros procedimentos. Agora estamos na expectativa para a cirurgia ortognática, a qual deverá melhorar sua estética facial, a mordida e também a fala”, assinala Célia, que é aposentada de um banco público e trabalha até hoje com o irmão em uma corretora de seguros.
“Já sofri com bullying, principalmente no ensino médio. Era comum também ser excluído de atividades, principalmente esportivas, ou porque o time comigo geralmente perdia, ou por excesso de cuidado, de medo que eu me machucasse. Então muitas vezes eu deixava de participar para não ‘atrapalhar’”, recorda Samuel.
“Hoje tenho uma vida praticamente normal, como a de qualquer jovem da minha idade. Dirijo, saio com amigos, participo de grupo de jovens da igreja, faço faculdade e tenho meus sonhos. Desejo me especializar e trabalhar na área de genética”, frisa o jovem, que tem na mãe uma grande incentivadora e encorajadora, especialmente nos momentos de hesitação. Atualmente, o jovem cursa o segundo ano de Ciências Biológicas na Universidade Estadual de Maringá (UEM), cidade onde reside.
No último retorno ao HRAC, em 25 de janeiro deste ano, para adaptação de novo aparelho auditivo, Samuel diz sair do hospital com uma forte lembrança: “Hoje ouvi uma frase que nunca mais vou esquecer: você pode ser aquilo que quiser ser”.
“O Samuel nunca aceitou o papel de ‘coitado’. Ele é determinado, quer conquistar o seu espaço. Nosso sentimento é de gratidão, admiração e respeito a todos os profissionais do Centrinho, por todo o progresso do Samuel. Conseguimos chegar até aqui graças a todo o acolhimento, orientação e tratamento multidisciplinar oferecido”, ressalta Célia.
Enquanto Você Crescia: Linhas do Amor de Mãe foi publicado em 2021, pela Kotter Editorial. O livro narra momentos marcantes e desafiadores desde a gestação, o nascimento, a descoberta do HRAC e da síndrome, passando pelas cirurgias, as artes de criança, a vida escolar, até o ensino médio e a chegada de Samuel à universidade.
Mais informações sobre o livro: https://kotter.com.br/loja/enquanto-voce-crescia-linha-do-amor-de-mae-celia-tamanini.
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Texto: Tiago Rodella, da Assessoria de Imprensa do HRAC
Fonte: Jornal USP