Julia Roberts estrela ‘Gaslit’ e deixa heroínas românticas para trás em nova fase

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É assim que o dicionário da Universidade de Cambridge descreve o termo “gaslighting”, ainda inédito nos glossários daqui, mas cada vez mais presente nas rodas de conversa.

(FOLHAPRESS) – A ação de enganar ou controlar uma pessoa fazendo com que ela acredite em coisas que não são verdadeiras, especialmente ao sugerir que ela tem transtornos mentais; forma de abuso psicológico. É assim que o dicionário da Universidade de Cambridge descreve o termo “gaslighting”, ainda inédito nos glossários daqui, mas cada vez mais presente nas rodas de conversa.

Ele inspira também a primeira protagonista de Julia Roberts em alguns anos, na série “Gaslit”, que estreia no Starzplay nesta semana. Nela, a atriz encarna Martha Mitchell às vésperas do escândalo de Watergate, um divisor de águas na política americana.

Mas enquanto “Todos os Homens do Presidente” e “The Post: A Guerra Secreta” usaram jornalistas para retratar a derrocada do governo de Richard Nixon, na nova série observamos esse movimento a partir de uma figura central entre os aliados do republicano -a mulher do então procurador-geral dos Estados Unidos, John Mitchell.

Roberts aparece em cena distante dos modelitos colados ao corpo que a acompanharam em seus filmes mais adorados, como “Uma Linda Mulher” e “Erin Brockovich, uma Mulher de Talento”, e que a transformaram não apenas numa das atrizes mais reconhecidas de sua geração, como também num sex symbol.

“Gaslit” vem numa onda de papéis nos quais ela abraça a maturidade. Das comédias românticas que a popularizaram antes, a atriz de 54 anos agora abre espaço no currículo para personagens mais densas e sóbrias, que atravessam traumas e dramas espinhosos.

Ela borrou a maquiagem e se estressou pelos filhos em “Olhos da Justiça”, “Álbum de Família” e “O Retorno de Ben”, recentemente. Em “Homecoming: De Volta à Pátria”, seu primeiro papel fixo numa série, ela ajudava soldados a se reintegrar à sociedade civil. Agora, em “Gaslit”, ela até usa alguns figurinos brilhantes e sofisticados, mas também sérios e com ar não muito jovial.

Vemos, através deles, uma atriz muito mais versátil que aquela que emplacou comédia romântica atrás de comédia romântica nos anos 1990, de “Satisfaction: No Amor e no Rock”, sua primeira protagonista no cinema, a “Um Lugar Chamado Notting Hill”, que ainda hoje arranca suspiros apaixonados de quem o vê.

“Para mim tudo se resume ao papel. Ser um projeto para a televisão ou o cinema é uma coisa secundária”, diz ela a este repórter. A atriz se junta a uma coleção de estrelas de Hollywood fazendo a transição do cinema para as telinhas, como Nicole Kidman, Reese Witherspoon e Kate Winslet.

“Mas, no fim, o que pesa são as pessoas com quem eu quero trabalhar, pela primeira vez ou de novo. É dessa maneira que eu tento me guiar, afinal, há todo tipo de gente criativa pela indústria. O que eu sempre senti é que as personagens certas me encontram nos momentos certos”, diz ela sobre a fase atual da carreira, entregando que gostaria de um dia trabalhar com o cineasta Wes Anderson ou repetir as parcerias já feitas com Denzel Washington e George Clooney.

O último ator já contracenou com ela em sete filmes, mas a contagem vai subir em breve, pois ambos devem dar vida a um casal divorciado em “Ticket to Paradise”, de Ol Parker. Será um retorno às comédias românticas, após duas décadas em que ela diz não ter encontrado nada no nível de “Notting Hill” e que, portanto, a motivasse a voltar para o gênero.

Criador de “Gaslit”, Robbie Pickering também acredita que Roberts, com o papel na nova série, mostra uma faceta ainda inédita, sendo “incrível ver essa mulher, que nós conhecemos há tantos anos, indo a lugares para os quais nunca foi na carreira, entregando uma performance tão dolorosa e crua, que certamente vai surpreender as pessoas”.

A Martha Mitchell de Roberts, concebida graças a um vasto acervo de aparições televisivas deixadas pela americana, morta em 1976, é desbocada, fala o que pensa e não se deixa intimidar pelo marido nem pelos políticos republicanos que a rondam. Ela ganhou fama por dar entrevistas em que falava o que queria, sem filtro, expressando até sua oposição à Guerra do Vietnã, encampada na época por Nixon.

Por isso, quando Watergate estourou -em parte graças a informações que Martha distribuía para seus contatos na imprensa-, ela foi silenciada, rotulada de mentirosa e levada a crer que tinha problemas psiquiátricos. Ela até inspirou a medicina no batismo do efeito Martha Mitchell, processo no qual um psiquiatra erra no diagnóstico e diz que a percepção da realidade de um paciente é fruto de um delírio.

A americana terminou sozinha e sem dinheiro, apesar de ter inspirado toda uma geração de mulheres entre os anos 1960 e 1970. Roberts se relaciona com isso, já que ela própria é como um ídolo cinematográfico para tantas pessoas, especialmente mulheres, e uma das poucas atrizes de Hollywood intrinsecamente fixadas no imaginário popular, vista nas telas anualmente desde 1987 -apesar de ter ficado ausente nos últimos quatro anos.

“E, bem, eu certamente entendo o que é ser a única mulher na sala. Eu sei o que é tentar expressar sua opinião e mostrar a sua voz num ambiente masculinizado, então há uma semelhança aí”, diz Roberts.

Agora, já numa posição confortável dentro da indústria, ela aproveita o sucesso e a influência conquistados para tornar seus desejos realidade. Nos últimos anos, por exemplo, ela vem investindo também na carreira de produtora, papel que repete em “Gaslit”, a fim de acelerar e viabilizar projetos que caem nas suas graças. E é bom poder fazer parte do processo criativo de uma série ou filme desde o princípio, completa ela.

“Enquanto produtora, a Julia tem as melhores observações. Às vezes elas são frustrantes, porque envolvem cortar alguma cena ou algo assim, mas ela quase sempre está certa. Como roteirista, você não espera que os atores com quem trabalha tenham tanto conhecimento da história e da escrita, mas a Julia conhece muito bem como as coisas funcionam e tem opiniões bastante fortes”, avalia Pickering.

Sua exigência para participar de “Gaslit”, inclusive, se tornou um presente, na visão dos criadores da série -ela disse que só entraria em cena se Sean Penn, seu amigo de longa data, interpretasse John Mitchell. O resultado é um casamento hipnotizante entre os dois, que certamente chamará a atenção do público e dos prêmios.

Além de “Ticket to Paradise”, Roberts tem outros dois filmes para lançar no futuro próximo. “Leave the World Behind” a enquadrará com Ethan Hawke e Mahershala Ali, em mais um drama familiar, e há também “Little Bee”, este um drama político.

Em todos ela atua também como produtora, deixando claro que, após uma carreira de mais de três décadas, ela acumulou experiência e influência suficientes para oferecer mais do que um sorriso icônico e uma risada reconfortante.

Fonte: Notícias ao Minuto

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