Pecuária brasileira remove mais carbono do que emite

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Os pesquisadores identificaram duas toneladas de carbono removidas para cada tonelada emitida, já transformadas em equivalente gás carbônico (CO₂), mesmo quando conduzida em pastagens extensivas.

Pesquisas conduzidas na Embrapa Pecuária Sudeste vêm quantificando o total de carbono removido pelos diferentes sistemas de produção. Quando as remoções são consideradas, o balanço entre o que a pecuária retira da atmosfera e o que emite passa a ser positivo. Os pesquisadores identificaram duas toneladas de carbono removidas para cada tonelada emitida, já transformadas em equivalentes gás carbônico (CO2), mesmo quando conduzida em pastagens extensivas. O desempenho continua sendo positivo em sistemas mais intensivos e isso confirma o que profissionais das ciências agrárias já projetavam a partir do conhecimento sobre fertilidade do solo, correções e adubações, morfologia das plantas forrageiras e dinâmicas dos bovinos em pastejo. Sistemas integrados com lavouras e/ou florestas são ainda mais eficientes na remoção de carbono.

Maurício Palma Nogueira – Foto: Arquivo Pessoal

Embora pareça óbvio aos profissionais das ciências agrárias, a sociedade foi muito mal informada durante os últimos 15 anos, no mínimo. O assunto foi sempre tratado de forma parcial, sensacionalista, sem dar a devida atenção a conhecimentos já existentes.

Os debates sobre balanço de carbono não envolveram pesquisadores relacionados à estrutura e fertilidade do solo, formação de húmus, manejo de pastagens, eficiência de colheita do capim, entre outras particularidades do sistema solo-planta-animal-atmosfera.

Por essa razão o assunto ficou focado apenas em questões relacionadas com as emissões de metano pelos animais, praticamente deixando de fora toda a importância da remoção. As emissões foram muito divulgadas pela máquina de comunicação das ONGs, especializadas no tema.

Para dimensionar o acúmulo de carbono no solo, no entanto, demanda-se um esforço muito maior, que envolve a compreensão de detalhes técnicos complexos, difíceis de explicar para quem não é familiarizado. E, ainda assim, há uma diversidade de fatores que não permitem chegar a um número final, definitivo, sobre quanto de carbono é acumulado ou removido da atmosfera. Esse número dependerá do clima, bioma, tipo e composição de solo, sistema de produção, entre outros fatores.

Mesmo diante dessa complexidade e da ciência de que o assunto estava em estudo, por muito tempo as remoções não foram sequer mencionadas, o que tornou as emissões praticamente sinônimos de balanço.

O passivo (emissões) foi integralmente aceito, enquanto o ativo (remoções ou sequestro) precisava ser provado. Sob a luz da ciência, o resultado não poderia ser chamado de balanço sem que as variáveis fossem integralmente consideradas.

É fundamental entender que o objetivo dessa discussão deve ser o de apresentar soluções que estimulem práticas mais eficientes. O tema não pode ficar restrito a um eterno cabo de guerra entre corporativismo em defesa da pecuária ou sensacionalismo em busca de holofotes e doações de recursos para supostamente salvar o planeta.

Entre os anos de 1990 e 2022, o rendimento médio de cada hectare em produção no Brasil melhorou 265%, saltando de 1,37 tonelada por hectare para 5,02 toneladas por hectare de produtos gerados pela produção agropecuária. O cálculo envolve todos os produtos de origem vegetal e animal obtidos a partir das atividades agropecuárias. Em três décadas, a produção brasileira aumentou 250% em uma área 4% menor. Os dados são consolidados pela Athenagro a partir de informações da Conab, IBGE, Inpe e Embrapa (Companhia Nacional de Abastecimento, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, respectivamente). Tal desempenho é fruto direto das soluções tecnológicas geradas pela ciência e implementadas no campo.

Esse sim é um desafio superado com sucesso, movimentando a economia e gerando alimentos para a sociedade. Resolver o problema ambiental restringindo o acesso da população aos alimentos não faz sentido algum.

A relação entre produtividade e a quantidade de carbono retida no solo é diretamente proporcional, conhecimento básico nas disciplinas de ciências agrárias.

O assunto tratado com sensacionalismo também gera receio entre os profissionais do campo. A desinformação diante do tema acaba ofuscando uma das maiores verdades em relação ao assunto.

Seja pela economia de área que poderia ter sido desmatada, seja pela melhoria no balanço de carbono, os produtores rurais brasileiros são os maiores responsáveis por implementar práticas amigáveis às demandas ambientais.

E os pecuaristas não ficam para trás. A produtividade da pecuária aumentou 190% a partir de 1990. Caso a produtividade não houvesse aumentado, os brasileiros precisariam de uma área de 447 milhões de hectares para produzir a mesma quantidade de carne bovina produzida em 2022, conforme projeção da Athenagro.

O receio gerado com a desinformação difundida pelo extremismo ambiental dá margens para que outro grupo atue, dificultando ainda mais que soluções práticas sejam implementadas.

Críticos ferrenhos do ambientalismo radical também pecam por desconhecer questões básicas de ordem agronômica e zootécnica. Dessa forma acabam também adotando uma postura radical contrária às sugestões técnicas que vêm sendo apresentadas para melhorar o balanço de carbono.
Desde que conduzido tecnicamente, com base no conhecimento científico consolidado, a redução nas emissões de carbono implicarão também em aumento nos resultados financeiros. Esse acréscimo explica-se pelo combate ao desperdício e aumento da produtividade.

Estratégias de redução de emissões pela pecuária envolvem, necessariamente, aumento no desempenho dos animais em produção. Redução da idade ao primeiro parto, redução do período de terminação, aumento do ganho de peso médio, redução da mortalidade, aumento da taxa de natalidade, etc. farão parte das ações que contribuirão com as reduções de emissões por unidade produzida na pecuária.

O mesmo raciocínio ocorre com as estratégias de aumento das remoções de carbono (sequestro de carbono). As remoções ocorrerão à medida que o solo acumular maiores quantidades de carbono em seu perfil. Para que isso ocorra, o sistema de produção precisará ser conduzido de tal forma que as sobras de plantas não exportadas (retiradas da área) sejam incorporadas de forma eficiente ao solo. As sobras incluem tanto a parte aérea da planta como as suas raízes. Incluem as plantas de soja, milho, algodão e outros produtos não retirados da área no momento da colheita, assim como o restante não aproveitado das plantas colhidas por inteiro, como é o caso das pastagens e da cana-de-açúcar, por exemplo.

Administrar esse processo em ambiente tropical é um desafio que vem sendo superado com muito êxito pelo agronegócio. São conquistas possibilitadas pelo conhecimento de manejo de solo.

Há décadas, muito antes do assunto carbono (que inclui metano) ganhar importância no debate global, alunos de ciências agronômicas estão aprendendo que não se deve queimar o resto das plantas para limpeza das áreas de produção. Exceção aos casos que envolvem prevenção a doenças, específicos em algumas culturas.

Aprendem também que manejar a relação entre carbono e nitrogênio possibilitará ganhos em produtividade ao longo dos anos. Lentamente, as práticas tradicionais de aração e gradagem da área foram substituídas pelo plantio direto e pelo cultivo mínimo. O plantio direto, raro no início dos anos 1990, já ocupa cerca de 40 milhões de hectares em todo o território nacional.

O mesmo ocorre com os sistemas de integração entre pastagens e lavouras (ou florestas). A área conduzida em sistemas integrados, no Brasil, se aproxima de 15 milhões de hectares. Sistemas mais intensivos de produção de pastagens também possibilitam aumento da quantidade de plantas remanescentes (parte aérea e raízes) na área. Por mais eficiente que sejam ao pastejar, os bovinos tendem a retirar apenas cerca de 40% a 50% da matéria seca produzida nas pastagens. Considerando a composição entre raízes e parte aérea nas forrageiras tropicais (pastagens usadas no Brasil), é possível concluir que os bovinos consumirão apenas entre 20% e 30% do total da produção vegetal necessária para mantê-los.

Ao contrário do que geralmente é pregado por especialistas em carbono, porém leigos em conceitos de fertilidade do solo, a capacidade de estocagem no solo pode aumentar ao longo do tempo. Essa, inclusive, é uma das grandes metas agronômicas conduzidas nas fazendas brasileiras: aumentar a capacidade produtiva do solo, o que pode ser comprovado pela elevação da produtividade do país.

Especificamente no caso de pastagens, sistemas mais intensivos de produção ainda possibilitarão outros ganhos em melhoria de balanço de carbono. Operações mecanizadas de correção, adubação e aplicação de defensivos nos pastos demandarão menos combustíveis por hectare do que operações de aração, gradagem e roçada das áreas. A quantidade de diesel, pela mesma quantidade produzida, será inferior.

Enfim, o fomento de estratégias que reduzam as emissões não é novidade na produção brasileira. Pesquisas e profissionais do campo estão nessa luta há décadas. A única novidade é a abordagem diferente, buscando compreender o ciclo de carbono. Mas as ações são as mesmas.

O mesmo vale para o investimento em moléculas que reduzam as emissões de metano pelo bovino. Enganam-se aqueles que acreditam que tais produtos servirão apenas para reduzir as emissões totais dos bovinos. Sem possibilitar aumento da eficiência produtiva e ganho financeiro no processo, essas moléculas não serão incorporadas pelas empresas de nutrição e, muitos menos, pelos produtores.

Por essa razão julgamos de suma importância que o tema seja tratado de forma mais transparente, com linguagem adaptada e, principalmente, com o envolvimento de pesquisadores e profissionais que conhecem o tema relacionado ao solo e construção da fertilidade do sistema.

Uma abordagem mais prática permitirá uma aceleração no ritmo de ações que implicam em mitigação da quantidade de carbono na atmosfera.

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Fonte: Por Maurício Palma Nogueira, engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária

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