Encontro é uma das ações da Estratégia Nacional para Mitigação e Reparação dos Impactos do Tráfico de Drogas sobre Populações Indígenas
Com a participação de pesquisadores, gestores governamentais e representações indígenas, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) promoveu, por meio das secretarias de Política sobre Drogas (Senad) e de Segurança Pública (Senasp), a oficina de trabalho “Tráfico de drogas, criminalidade e violência na Amazônia”.
Na abertura, Michele Gonçalves dos Ramos, diretora de Ensino e Pesquisa da Senasp, destacou a importância da soma de forças e da “articulação entre governo, organizações, especialistas, de todos os que trabalham com a questão das dinâmicas de criminalidade e enfrentamento das diferentes formas de violência que afetam os territórios e populações indígenas e comunidades tradicionais de todo o país, sobretudo na Região Amazônica”.
Aiala Colares Couto, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), ressaltou que o debate sobre a agenda de segurança pública e desenvolvimento regional para a Amazônia deve compreender a convergência de crimes e que suas origens e impactos ultrapassam o limite territorial do Brasil. “Outros países da América do Sul que congregam a Amazônia enfrentam problemas similares ao Brasil. Por isso, um passo importante é criar uma cooperação interinstitucional que envolva os países amazônidas em uma perspectiva integrada”, afirmou.
Couto lembrou que, diante da conexão entre o narcotráfico e outras atividades ilegais – como exploração ilegal de madeira, construção de pistas de pouso clandestinas que envolvem terras de fazendeiros, garimpo em terras indígenas e territórios quilombolas, comércio de drogas em áreas de garimpo, entre outros – é preciso considerar a importância do pacto federativo das políticas públicas, que devem ser dialogadas com as comunidades locais, pensando a vulnerabilidade social como elemento que acaba sendo central para se compreender essa dinâmica do crime. Nesse caso, a pesquisa tem papel fundamental para apontar o caminho de uma lógica que considere a importância de respeitar os direitos humanos e a dignidade dos povos da floresta”, argumentou.
Na mesa “Dinâmicas das violências e da criminalidade na Região Amazônica – Parte 1”, David Marques, coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também apresentou dados de estudos do órgão, como os que mostram o aumento da taxa de violência letal na Amazônia, que é 50% maior do que a taxa média nas demais regiões brasileiras.
Vivian Calderoni, pesquisadora do Instituto Igarapé, apresentou estudo do Instituto que utilizou dados de operações da Polícia Federal com foco em crimes ambientais na Amazônia e procurou aprofundar o conhecimento a partir desse olhar.
“A partir das cinco principais economias ilícitas que impulsionam o desmatamento ilegal – extração ilegal de madeira, grilagem de terras públicas, mineração ilegal, o desmatamento em si e a agropecuária com passivo ambiental e ilegalidades em sua cadeia – chegamos ao conceito do ecossistema do crime ambiental na Amazônia. Os crimes ambientais dependem, tanto para ocorrer como para garantir a fruição de seus lucros, da interconexão de diversos outros crimes”, explicou. A pesquisa apresentada pelo Igarapé aponta a necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos de proteção contra lavagem de dinheiro para lidar com produtos de ilícitos ambientais.
A primeira mesa teve, ainda, uma apresentação de Tasso Azevedo, do MapBiomas, que é uma rede colaborativa de mapeamento de cobertura e uso da terra, e comentários de Ana Carolina Alfinito, da Amazon Watch, da pesquisadora Natália Dino e de Márcio Santilli, do Instituto Socioambiental.
Articulação de políticas
A segunda mesa, que também abordou dinâmicas das violências e da criminalidade na Amazônia, teve mediação de Maria Paula Gomes dos Santos, diretora de Pesquisa, Avaliação e Gestão de Informação da Senad. Os expositores foram Bernardo Medeiros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e Cláudio Dantas Monteiro, Vinícius Couto e Jairo Hidalgo, do Centro de Excelência para a Redução da Oferta de Drogas Ilícitas (CdE), projeto fruto de parceria entre a Senad, Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
A diretora de Pesquisa da Senad resgatou o histórico de violência presente na ocupação da Amazônia, apontando que o processo que levou pessoas de outras partes do país para a região, durante os projetos para ocupar o território, “se relaciona com uma sociabilidade violenta e criou uma série de camadas que geraram essa violência. Para trazer soluções à questão, é fundamental pensarmos que não vamos resolver isso com combate militarizado, que é um erro que tem se repetido ao longo dos anos. É necessário promover uma repactuação entre o Estado e as populações locais e entre elas próprias também”, enfatizou Maria Paula.
As dinâmicas sobre regularização fundiária, titulação, demarcação indígena e conflitos na Região Norte, principalmente a partir dos anos 1970, vêm sendo objeto do estudo apresentado pelo Ipea durante o debate. “Nosso maior foco de atenção são as dinâmicas das facções criminosas no território. Discutimos na pesquisa, também, a questão da falta de integração entre forças como polícias e escritórios da Funai e do Ibama nos níveis federal, estaduais e locais”, explicou Bernardo Medeiros.
Tráfico
Os primeiros achados do relatório “Tráfico de Drogas na Região Amazônica: mapeamento de possibilidades de pesquisa” foram apresentados pelo CdE. A iniciativa do Centro busca compreender o tráfico de drogas na região amazônica, principalmente o praticado por organizações criminosas, por meio do mapeamento das rotas de tráfico de maconha e cocaína na Região Norte.
Como debatedoras e comentaristas sobre o tema, participaram a secretária de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Juma Xipaia; Manuela Picq, pesquisadora da Universidade San Francisco de Quito (Equador); e Thais Lazzeri, jornalista e fundadora da Fala Amazônia.
“É muito importante estarmos neste espaço hoje para a discussão de políticas sobre drogas e sobre o avanço do tráfico nas comunidades indígenas. Mas, ao longo da história do Brasil Colônia, do Brasil invadido, do Brasil usurpado, esse contexto de violência é de longa data e precisa ser reparado”, ressaltou Juma Xipaia. “Hoje temos espaço para falar livremente e abertamente e temos organizações, sejam elas nacionais ou internacionais, e também políticas de enfrentamento a essa violência, e estamos dando visibilidade aos meios ilícitos que têm sido utilizados para continuar violando não só direitos, mas também territórios e tudo aquilo que eles significam pra gente, por isso esse momento é fundamental”, disse a secretária do MPI.
Fonte: Ministério da Justiça e Segurança Pública