Por Rebeca Fonseca
Evento começa nesta quinta-feira, dia 22, com palestra do professor José Miguel Wisnik, e se estende até 2024
Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Júnior são intérpretes clássicos da realidade brasileira. Seus textos canônicos serão discutidos no ciclo de seminários Intérpretes do Brasil: Ontem e Hoje, ao lado de obras de outros pensadores, como Antonio Candido, Davi Kopenawa Yanomami e Marilena Chauí. Promovido pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, o ciclo começa nesta quinta-feira, dia 22, e se estende até 2024. Estão previstos 14 seminários (confira abaixo a programação completa do ciclo).
No primeiro seminário, nesta quinta-feira, às 19h30, o professor José Miguel Wisnik, da FFLCH, vai falar sobre o último capítulo do seu livro Veneno Remédio – O Futebol e o Brasil, que em 2023 completa 15 anos. A obra compara interpretações canônicas do Brasil com visões sobre o papel do futebol na vida brasileira. O livro “contém um contraponto problematizador das visões de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Júnior, no modo como elas alternam visões positivas e negativas da formação do País”, explica o professor. A ideia é que Wisnik avalie como o que ele escreveu em 2008 se relaciona com a atualidade do Brasil.
Os seminários vão seguir um percurso histórico. Depois de Wisnik, os encontros abordarão as ideias sobre o Brasil elaboradas nos anos 1930, passando pelo desenvolvimentismo dos anos 50 e 60, até chegar à contemporaneidade. “É preciso conhecer as obras, os autores e os subsídios teóricos de suas análises para, enfim, poder julgar as interpretações do Brasil”, defende Vitor Morais, graduando em História pela FFLCH e organizador dos seminários.
“A democracia racial, de Freyre, é algo muito distante de hoje”, diz Morais. “Parece-me que no lugar dela existe o extermínio da população negra e periférica, mas não dá para fazer a crítica sem passar por esses autores (Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Júnior).” As críticas feitas aos autores clássicos pela historiadora Beatriz Nascimento (1942-1995) e pela antropóloga Lélia Gonzalez (1935-1994), por exemplo, ganham mais clareza diante do percurso dos debates, continua o organizador.
Entender o momento histórico em que as interpretações foram produzidas, refletir se elas conservam alguma atualidade e, caso contrário, como podem ser criticadas são algumas das propostas das discussões. “Casa Grande e Senzala, de Freyre, é dos anos 1930 e nós já estamos em 2023. São 90 anos de diferença. Muitas das estruturas daquele momento se conservaram e muitas outras não. Muitas foram arrasadas pelo bolsonarismo, pelo avanço da extrema direita”, destaca Morais.
Para Morais, é necessário também transformar a troca de ideias em mudanças efetivas. “A gente precisa estabelecer uma ponte entre a reflexão histórica, sociológica e política desses autores e capacidades de transformação social”, aponta.
A interpretação que o organizador tem do Brasil atual é de um país dividido e com expectativas decrescentes. “As perspectivas não são boas e acredito que nós, dentro da Universidade, precisamos agir para impedir que essa catástrofe se coloque. Nossa ideia no seminário é não condenar o passado, mas buscar como ele pode nos ajudar a construir algo diferente e encontrar saídas para nossa crise.”
O Seminário Marx, que nas décadas de 1950 e 1960 reuniu professores e alunos da então chamada Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) da USP – antecessora da FFLCH – para discutir questões do Brasil à luz da obra O Capital, do pensador alemão Karl Marx (1818-1883), serviu de inspiração para o evento. “Daquele seminário saíram as teses mais importantes da história da faculdade e que tiveram um forte impacto na forma como nós recebemos todas essas heranças de intelectuais de outras épocas”, explica o organizador.
O ciclo de seminários Intérpretes do Brasil: Ontem e Hoje começa nesta quinta-feira, dia 22, das 19h30 às 22 horas, no Auditório Milton Santos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP (Avenida Professor Lineu Prestes, 338, Cidade Universitária, em São Paulo). Os demais encontros vão acontecer na sala 21 do Departamento de História da FFLCH. Entrada grátis. Mais informações sobre o primeiro seminário do ciclo, com o professor José Miguel Wisnik, estão disponíveis neste link. Mais informações sobre os seminários seguintes estão neste link.
Encontros críticos sobre teorias clássicas
Abaixo, a programação do ciclo Intérpretes do Brasil: Ontem e Hoje, que acontece na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP em 2023 e 2024
22 de junho: seminário 1, “Veneno Remédio – 15 anos depois”
18 de agosto: seminário 2, “Gilberto Freyre e a formação cultural e social brasileira”
24 de agosto: seminário 3, “Sérgio Buarque de Holanda e a formação do homem brasileiro”
14 de setembro: seminário 4, “Caio Prado Jr. e o sentido do mundo colonial”
28 de setembro: seminário 5, “Encontro 5: Celso Furtado e a formação econômica do Brasil”
19 de outubro: seminário 6, “Antonio Candido – a formação do sistema literário e a emergência da malandragem no findar da Colônia”
9 de novembro: seminário 7, “Chico de Oliveira e a crítica ao nacional-desenvolvimentismo”
23 de novembro: seminário 8, “Roberto Schwarz e a crítica dialética no pós-1964”
7 de dezembro: seminário 9, “Caetano Veloso e a derradeira formação”
21 de dezembro: seminário 10, “Paulo Arantes e a impossibilidade da formação”
Em 2024 estão previstos os seguintes seminários, ainda sem data determinada:
Seminário 11: “Pensamento ameríndio na interpretação do Brasil”
Seminário 12: “Pensamento afro-brasileiro na interpretação do Brasil”
Seminário 13: “Interpretações do Brasil recente – o lulismo”
Seminário 14: “Interpretações do Brasil recente – o bolsonarismo”
Fonte: Jornal da USP