Carlos Gadelha, coordenador do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, detalha a proposta do Complexo Econômico e Induśtrial de Saúde. Fortalecer o SUS, mostra ele, pode também ser caminho para reindustrializar o Brasil
Depois de afundar em longa regressão produtiva, o Brasil poderá respirar de novo? O que a reconstrução industrial e econômica do país tem a ver com o SUS? Numa live na última quarta-feira, 10/8, o economista Carlos Gadelha expôs em mais detalhes sua resposta a esta questão. Gadelha, que coordena o Centro de Estudos Estratégicos (CEE) da Fiocruz, um think tank sobre Saúde e Desenvolvimento, discorreu sobre o Complexo Econômico e Industrial da Saúde (CEIS). A sigla está se tornando popular. Mas suas implicações reais, ainda não. Por isso, vale acompanhar sua exposição, que pode ser assistida aqui.
A importância do SUS, lembra Gadelha, foi reconhecida pela população durante a pandemia. Mas apesar dos enormes serviços prestados ao país, perdeu-se a oportunidade de fazer da saúde um instrumento de combate ao desemprego e à miséria. É que Saúde, além de cuidado, exige materialidade. Indústria (de remédios e equipamentos) e serviços (inclusive os mais sofisticados). E o Brasil foi perdendo, aos poucos, as condições para oferecê-los. O desmonte da produção nacional de bens de Saúde foi desfilando, dia a dia, na falta de ventiladores em hospitais e leitos de UTI. Ventiladores que eram produzidos no Brasil até dois meses antes da pandemia faltavam de repente. Até máscaras precisavam ser importadas. Muitos profissionais do SUS podem ter morrido por não poder contar com elas.
O Complexo Econômico e Industrial da Saúde, explicou Gadelha, é um jeito de juntar a enorme abrangência e capilaridade do SUS (175 milhões de usuários, em todos os municípios do país) com a industrialização necessária para atendê-los. Fazem falta remédios, respiradores, máquinas capazes de produzir imagens, radioisótopos, equipamentos hospitalares. Mas a carência pode ser convertida em estímulo. Se houver políticas públicas neste sentido, sugeriu o coordenador do CEE-Fiocruz, surgirá uma indústria nacional capaz de atender às necessidades.
A chave para unir as duas pontas são as encomendas governamentais. O SUS precisa de medicamentos, insumos, equipamentos, serviços. O ministério da Saúde, orientado por novas políticas, comunica que dará preferência à indústria nacional. Cria-se, automaticamente, uma demanda gigantesca. Os empreendedores que quiserem atender às necessidades da Saúde Pública – e o fizerem com qualidade – poderão contar com a compra integral do que produzirem.
“A saúde precisa de uma base econômica e material para garantir bem-estar. O SUS é uma inovação fantástica, motivo de esperança no futuro, mas está de joelhos. A ideia do CEIS é tratar a saúde como espaço econômico decisivo para a economia nacional”, defendeu Gadelha. “Ela mobiliza 10% de tudo que se investe no país”, As possíveis encomendas públicas garantiriam, à indústria nacional, a compra da produção. Significaria milhares de empregos (muitos deles de alta qualificação), desenvolvimento tecnológico, condições para investir sem riscos desnecessários.
“A saúde movimenta 9% do PIB, precisa chegar a 12%, enquanto o financiamento público precisa saltar de 4% para 7% do PIB, um patamar mínimo”, lembrou o economista. E frisou: nas condições atuais, a saúde já gera 9 milhões de empregos diretos. “E temos estudos segundo os quais podemos chegar a 25 milhões de empregos. É uma das áreas de maior potencial de colocar o Brasil na quarta revolução industrial e tecnológica”.
Gadelha é enfático em destacar a capilaridade do SUS como um diferencial incomparável. “Quem entra em 90% dos municípios brasileiros observa verdadeiras unidades econômicas espalhadas no território. Todo esse campo de serviço, da atenção básica à alta complexidade, pode mobilizar um poderoso sistema econômico, que talvez seja uma das chaves para um desenvolvimento diferente”.
As perspectivas são enormes, como faz questão de reafirmar Gadelha, para quem o sonho de um país melhor e mais feliz não seja devaneio. “O gradiente tecnológico é imenso, desde as inovações da quarta revolução industrial até uma grande política de cuidadores de idosos num processo de mudança demográfica e envelhecimento populacional. O Programa de Saúde da Família está em 95% dos municípios, usado por 60% da população. Um projeto de fazer saltar essa cifra para 80% da população tem potencial enorme de gerar inteligência, produção e emprego. E rápido.”
Fonte: Outra Saúde