A relação entre oprimido e opressor é o tema da peça que ocupa o Teatro Ruth de Souza, em Santa Teresa, nos fins de semana de maio
Dois empregados planejam matar o patrão. Este é o ponto de partida do espetáculo teatral “Voz surda”, que fará temporada nos sábados e domingos de maio, no Teatro Ruth de Souza, localizado no Centro Cultural Municipal Parque das Ruínas, em Santa Teresa. A montagem da Cia Coletivo sem Órgãos é uma dramaturgia autoral de Rodrigo Carvalho, construída durante o processo de ensaio e livremente inspirada na peça “As criadas”, do dramaturgo francês Jean Genet.
No texto de Genet, as duas criadas se revezam no jogo de imitar a patroa, e assim as forças de opressão vão migrando entre elas. A escolha do tema, então, não foi gratuita. As relações entre empregado e empregador, oprimido e opressor, têm tudo a ver com o momento atual do país.
Segundo divulgou o IBGE no dia 31 de março, o Brasil tem 12 milhões de desempregados. Somam-se a eles 4,7 milhões de brasileiros em desalento, ou seja, que desistiram de procurar emprego; 27,3 milhões de pessoas subutilizadas; 6,6 milhões de subocupados; além de 12,3 milhões de trabalhadores sem carteira assinada e 38,3 milhões de trabalhadores na informalidade. Além do mais, a reforma trabalhista aprovada pelo governo prejudicou aquele que vende sua força de trabalho, sua mão de obra.
Muitas reflexões surgiram a partir da pesquisa sobre relações de trabalho. Livros como “A elite do atraso”, de Jessé Souza, e “O que é lugar de fala?”, de Djamila Ribeiro, também foram fontes de pesquisa, já que os autores se propuseram a investigar a construção do subalterno ao longo do tempo.
O nome do espetáculo, aliás, é inspirado no artigo “Pode o subalterno falar”, da filósofa indiana Gayatri Spivak. No estudo, Spivak explica que em muitos momentos, nas relações de trabalho, o patrão parece induzir o funcionário a dizer as questões que lhe incomodam naquele ambiente. O opressor cria formas para que essas insatisfações sejam ditas nos momentos convenientes a ele; entretanto, o que é dito não passa dos locais e das pessoas selecionadas pelo patrão. Dessa maneira, a voz do empregado é impedida de perpetuar, ou seja, o chefe cria uma falsa sensação de poder de fala, fazendo da voz de seu empregado uma voz surda.
SINOPSE
Em “Voz surda”, dois funcionários que trabalham juntos estão prestes a matar o patrão. Enquanto o chefe não chega, os dois funcionários iniciam um jogo de submissão e poder em que imitam os gestos, a voz e os hábitos do patrão em um perverso ritual de faz de contas.
O COLETIVO
A Cia Coletivo Sem Órgãos surgiu em 2015, no bairro carioca do Méier, com o desejo de pesquisar poéticas presentes nas relações do cotidiano. Seu primeiro espetáculo foi “Casulo de fogo”, que circulou durante um ano por Rio de Janeiro, Niterói e Minas Gerais. A peça participou do Festival Nacional Nepopó em São João Nepomuceno/MG (2016) e teve indicações de melhor atriz e melhor direção e do Festival Violeta de Prata em Três Rios/RJ (2016) em que o espetáculo foi contemplado com o prêmio de melhor trilha sonora e teve seis indicações incluindo de melhor espetáculo.
Em 2018, o grupo retoma as pesquisas em sala de ensaio no bairro do Engenho Novo, localizado no subúrbio do Rio de Janeiro e com seus integrantes majoritariamente moradores do subúrbio. O coletivo passa a desenvolver pesquisa sobre corpos periféricos, territórios e espaços de afeto.
Em 2019, a Cia apresentou a cena “Perifa” no festival GTA de cenas curtas no Teatro Armando Gonzaga, tendo dez indicações e seis prêmios conquistados, dentre eles o de melhor espetáculo. No ano seguinte, a revista Moringa, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), publica o artigo “Casulo de fogo: uma proposta cênica pautada na fragmentação e desconstrução”, escrito por Talita Baldin, pesquisadora que fazia parte da Cia e doutoranda em psicanálise pela Universidade Federal Fluminense – UFF, e Rodrigo Carvalho, diretor e dramaturgo da Cia Coletivo Sem Órgãos.
Enquanto isso, na sala de ensaio, o grupo se aprofundava nas relações interpessoais em trabalhos formais subalternos, investigação da qual resultou o espetáculo “Voz surda”.
FICHA TÉCNICA
- Texto e direção: Rodrigo Carvalho
- Elenco: Gustavo Alves e João Mabial
- Assistente de direção: Tatiane Santoro
- Produção: Ralph Campos
- Assistente de produção: Tatiane Santoro
- Iluminação: Bruno Caverninha
- Cenário e figurino: Rona Neves
- Supervisão artística: Jé Oliveira
- Fotografia: Ramon Velasco
- Arte gráfica e gestor de mídias: Franco Albuquerque
- Assessoria de imprensa: Alessandra Costa
SERVIÇO
Espetáculo teatral “Voz surda”
- Teatro Ruth de Souza – Centro Cultural Municipal Parque das Ruínas
- Sessões aos sábados e domingos de 7 a 29 de maio
- Dias 7, 8, 21, 22, 28 e 29, às 16h; dias 14 e 15, às 18h.
- Entrada gratuita
- Classificação indicativa: 14 anos
- Duração: 50 minutos
- Endereço: Rua Murtinho Nobre, 169 – Santa Teresa
- Telefones: 21 2215-0621
Fonte: Sopa Cultural