Mercados emergentes ficaram mais atrativos com alta de commodities, enquanto investir nos EUA é mais simples
Inflação alta ao redor do mundo, países avançando em ciclos de alta de juros, guerra. Pode não parecer, mas mesmo com um cenário adverso, analistas apontam que as pessoas interessadas em investir fora do Brasil conseguem encontrar boas oportunidades.
O investimento em outras regiões ou países leva em conta uma série de elementos, como o quão favorável o momento econômico atual é para um determinado país, a composição de empresas na sua bolsa, a facilidade para investir e os riscos atrelados ao processo.
Especialistas afirmam ao CNN Brasil Business que o investimento no exterior é importante não apenas no momento atual, mas em qualquer um, já que é uma ferramenta de diversificação e proteção, em especial nas fases ruins no mercado brasileiro.
Por isso, é preciso ficar atento a alguns cuidados para garantir que, ao mesmo tempo em que boas oportunidades não estão sendo perdidas, o investidor tenha seletividade para contornar maus negócios, seja nos Estados Unidos, na China, na Índia ou em outro país.
Oportunidades no exterior
Em um relatório publicado em abril deste ano, a XP Investimentos buscou classificar como vê atualmente a atratividade de algumas regiões do globo.
Jennie Li, estrategista de ações da empresa e uma das autoras do estudo, afirma que a visão sobre esses mercados mudou pouco desde então.
“De janeiro até o começo de abril deste ano, a gente tinha um cenário para pensar em investimentos no exterior, e hoje temos outro. A Europa, por exemplo, começou o ano bem, recuperando da pandemia e beneficiada pela alta de commodities, mas tudo mudou com a guerra”, diz.
Para os estrategistas da XP, os mercados mais atrativos no momento são o Brasil e outros países emergentes. Já para os Estados Unidos, Europa, Japão e China, a visão é neutra, ou seja não há recomendação para investir e nem para retirar investimentos.
Ela observa que os investimentos internacionais envolvem muitos riscos globais no momento, por mais que seja positivo ter uma carteira com exposição no exterior, o que torna ainda mais importante saber realizar uma boa alocação de recursos.
No caso da China, o principal ponto de atenção para Li é a piora de indicadores econômicos e os efeitos de lockdowns recentes em centros econômicos como Xangai, indicando uma desaceleração da economia, negativa para o mercado de ações.
Já a Europa enfrenta problemas de inflação mais urgentes, com uma economia fraca e um banco central menos agressivo no combate às pressões inflacionárias. O maior risco, porém, é a alta exposição à guerra no continente, entre Ucrânia e Rússia.
Os Estados Unidos também ficaram menos atraentes neste ano devido ao processo de alta de juros para combater a maior inflação em 40 anos, e parte do mercado teme uma recessão em 2023, o que prejudica os ativos nas bolsas do país, que entraram em uma tendência de queda.
E há ainda o caso do Japão, uma das maiores economias do mundo, mas com “poucos catalisadores” e estagnada, segundo Li, o que obriga uma gestão muito ativa dos investimentos para ter bons retornos.
O ambiente é um pouco mais positivo em mercados como na América Latina e no resto da Ásia, em especial em tradicionais exportadores de commodities. Como os preços desses produtos dispararam, e empresas do setor costumam ter forte presença na bolsa, investir nesses mercados ajuda a surfar a onda de lucros com esse cenário.
Li ressalta que essa tese “começou a ser questionada em abril por causa dos lockdowns na China, com os preços subindo menos. Mesmo assim, são mercados positivos, os preços de commodities seguem bem elevados, e são mercados menos sensíveis à alta de juros por serem menos dependentes de empresas de tecnologia.
Apesar desses elementos, ela avalia que os investimentos estrangeiros mais seguros ainda costumam ser nos Estados Unidos, em dólar e nos títulos do Tesouro do país, os chamados Treasuries. É o que tem ocorrido nos últimos meses, com a migração de capital de mercados vistos como mais arriscados ou que podem ser prejudicados pelos juros altos para a renda fixa norte-americana.
“Outros países, como Brasil, têm juros maiores, então o rendimento é maior, o problema é que emergentes sempre têm mais riscos, e os desenvolvidos são mais seguros, mas com rendimentos menores”, afirma.
Adeodatto Neto, sócio-fundador da Eleven Financial Research, vê o mercado dos Estados Unidos como o mais simples, e com acesso mais rápido e direto, para os investidores, onde é possível encontrar muitos ativos e inclusive investir em outras regiões do mundo a partir de índices de ações.
“É um mercado mais maduro, desenvolvido, com ferramentas mais diretas. Mesmo com a situação atual, vale a pena, não pode deixar de comprar só porque está caindo, e quando os ativos estão caindo é uma boa oportunidade de comprar”, afirma.
Ele ressalta, porém, que o mercado norte-americano é muito maior que o brasileiro, e mais desconhecido, então é importante estudar ainda mais antes de investir. “É como entrar em um supermercado gigantesco sem saber o que quer comprar. Ter inteligência, apoio de estratégia, análise, uma visão para guiar esse investidor, tudo isso é fundamental”.
Na visão dele, o mercado europeu passa por um momento “bastante difícil”, e é mais complexo devido às questões envolvendo a zona do euro, em especial pensando no mercado de títulos.
Considerando as bolsas da região, ele considera que existem companhias fundamentais para alguns setores a nível mundial, com “muita coisa boa e ativos bons”, e que é possível achar boas oportunidades, mas com cuidado.
A análise da Europa como um todo, porém, é mais difícil de ser feita para Ásia, que acaba sendo dividida devido à heterogeneidade dos países.
“A China ainda é vista como controversa por causa de credibilidade, interferências públicas, é mais complexo para investidores médios. Japão é mais maduro, mas é um mercado mais letárgico. Índia já tem como acessar boas empresas pelo mercado dos EUA”, avalia.
Neto afirma que “muita coisa pode ser aproveitada no continente, mas se o investidor não é mais sofisticado, não tem um grande patrimônio, fica difícil passar por essas regiões”.
Olhar micro
Para o sócio da Eleven, a diversificação setorial nos investimentos é tão importante quanto a geográfica, e é preciso olhar também para as boas oportunidades dentro de cada setor, composto por companhias “extraordinárias e ruins”.
“Períodos de incerteza geram processos de seletividade, a gente vai ver uma questão de sobrevivência, empresas que saem mais fortes desse ciclo, e isso vai acontecer em cada setor”, pondera.
Ele avalia que a tendência de investimento no exterior por brasileiros é forte, tem ganhado mais espaço e é um caminho irreversível. “Quanto mais educação financeira, acesso, instrumentos, o investidor tem, mais ele faz essa busca. Nos próximos anos, décadas, isso só vai crescer”.
Li, da XP, afirma que, pensando em setores, empresas de alto crescimento como as de tecnologia, que costumam ser mais endividadas e vulneráveis aos juros, e as small caps, com valor de mercado menor, costumam ser as que mais sofrem em momentos como o atual, de alta de juros.
Ela avalia que os setores com ambiente mais favorável no momento são os de crescimento, ligados a commodities, ou de alta qualidade, cujo crescimento é menos atrelado ao desempenho da economia.
Há ainda os chamados setores defensivos em relação à inflação, como o de empresas elétricas, que costumam ter uma demanda alta mesmo com quadro inflacionário ruim.
Ao mesmo tempo, a baixa em diversos setores pelo mundo acaba trazendo oportunidades. “Existem empresas que estavam caras, em especial nos Estados Unidos, que tiveram um reajuste com quedas e agora ficam mais atrativas, mas é preciso escolher com cuidado, nem tudo que caiu tem que comprar agora, porque pode cair mais”.
Fonte: CNN Brasil