Todo fim de ano a gente fala que o tempo está voando. Cada vez mais distraídos, temos de fato a impressão que está tudo indo muito rápido
O tempo não está passando mais rápido. Todo fim de ano a gente fala que o tempo está voando, mas a verdade é que os dias duram as mesmas vinte e quatro horas, a semana os mesmos sete dias, o ano os mesmos dozes meses. Por que então temos de fato a impressão que está tudo indo tão rápido?
Imagine que você está na estação do metrô e observa o trem passando por você. Ele é veloz, mas se você prestar atenção é possível enxergar os passageiros lá dentro, até mesmo notar o comportamento de alguns deles, identificar rostos. Agora o que acontece se, na hora em que o trem está se aproximando seu telefone celular apita e você se distrai lendo a mensagem. Quando ergue os olhos o trem já passou – parece que foi muito mais rápido, mesmo tendo ido à mesma velocidade.
É isso o que acontece com a vida: vamos ficando cada vez mais distraídos.
Primeiro porque envelhecemos. Quando você tem cinco anos de idade, um ano representa vinte por cento de sua vida inteira – é muito. Proporcionalmente, hoje, vinte por cento da minha vida é uma década; um ano representa só 2% da minha existência. É quase nada. Claro que muita coisa pode acontecer nesse período, mas estatisticamente representa pouco. E o pouco parece que passa rápido.
Mas além disso – e talvez principalmente – prestamos menos atenção às coisas conforme envelhecemos. Quando somos crianças e tudo é novidade, o cérebro fica constantemente ligado, atento a tudo, absorvendo tudo. Conforme as novidades minguam, a atenção se dispersa. É o equivalente – mas em maior escala – do fenômeno que faz a volta ser mais rápida do que a ida.
Normalmente a ida – cheia de expectativa e descoberta – prende nossa atenção, ao contrário da volta em que nem o caminho é novo. E quando estamos desatentos, com o cérebro no automático, não registramos detalhes, não notamos o entorno, sequer percebemos a nós mesmos, não marcando a passagem do tempo. Ao despertarmos dessa divagação, parece que o tempo voou e não o vimos passar.
Compare com o que acontece num feriado muito movimentado: você vai com a família num parque pela manhã, vão almoçar na casa dos vizinhos, preparam a comida juntos, à tarde levam as crianças para uma festa infantil e assistem a um filme no cinema antes de ir buscá-los, para então fazerem um lanche diferente antes de irem dormir. Aquele dia parece que durou uma eternidade, pois como muitos estímulos relevantes nossa memória fica cheia de registros, o que nos traz a sensação de que o tempo deve ter sido longo para caber tanta coisa.
A cada vez que nos queixamos de que o tempo está passando rápido, portanto, estamos confessando nosso desligamento do aqui e agora. Seja pela pressão das obrigações ou por indiferença e cansaço da nossa rotina, o tempo acelera na mesma proporção que nos descolamos da vida. Fenômeno que, nem precisaria dizer, só fez se agravar com o advento das telas que sugam nossa atenção para o universo paralelo do mundo virtual, nos roubando do planeta Terra.
O crescente movimento de busca por práticas contemplativas, mindfulness e reconexão com a natureza são tentativas de reverter esse processo. Desacelerar, olhar para o aqui e agora, criar memórias é se agarrar ao momento, impedindo-o de voar de nossas mãos. Não é possível impedir o tempo de passar; mas se não conseguimos freá-lo, podemos ao menos mantê-lo numa velocidade menos vertiginosa. Que prestemos atenção.
Fonte: CNN Brasil / Foto: Tânia Rego/Agência Brasil