O reconhecimento dos trabalhadores do cuidado é tema incontornável. Por isso, os sistemas de saúde também precisam garantir que eles possam zelar por si, tanto em seu emprego quanto na vida social, intelectual e espiritual.
Por Solange Caetano, autora convidada
O texto a seguir é a coluna de estreia de Solange Caetano, enfermeira e presidenta da Federação Nacional dos Enfermeiros. Solange Caetano passa a colaborar mensalmente com o Outra Saúde e representa uma importante voz dessa categoria profissional que emprega milhões de pessoas e é a força de trabalho mais numerosa do sistema de saúde brasileiro.
Um assunto dos mais importantes, imprescindível, que deve estar constantemente nos debates das esferas públicas e privadas do segmento da saúde é o autocuidado na enfermagem. E por que chamamos atenção para tal questão? Porque é um ato de preservação da vida profissional e garantia de dignidade pessoal; produz autoestima, gera fortalecimento e confiança em si mesmo.
Vale ressaltar que a prática é muito importante para o profissional, reflete na tomada de decisões e proporciona o autoconhecimento entre as fronteiras da mente e do corpo. Enfermeiros e enfermeiras são os pilares do cuidado, que se dedicam ao bem-estar e à saúde dos outros, muitas vezes passando por cima de sua própria saúde física e mental.
Nesse contexto, chamamos atenção para a necessidade de reforçar a importância do autocuidado como parte integral da prática de enfermagem. Não apenas para garantir a qualidade do serviço prestado, mas também promover a sobrevivência destes profissionais.
O evento paralelo à 68ª sessão da Comissão das Nações Unidas sobre o Estatuto da Mulher (UNCSW68) ofereceu uma plataforma crucial para discutir questões de igualdade de gênero e políticas de cuidado. Sob o tema “Caminhos para Igualdade de Gênero e Políticas de Cuidado”, líderes em saúde e igualdade de gênero se reuniram para abordar desafios e oportunidades. Entre eles, está a necessidade de reconhecer e valorizar o trabalho de cuidado, especialmente aquele historicamente realizado por mulheres e muitas vezes invisível.
A Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE) tem reiterado que a valorização do autocuidado na enfermagem não se limita apenas ao reconhecimento profissional, mas também à implementação de políticas que promovam condições de trabalho adequadas, tanto físicas, a fim de evitar acidentes e agressões, quanto no sentido de produzir as estruturas permanentes de apoio emocional, promover a saúde mental e evitar depressão e outros transtornos.
Chamamos atenção para não deixarmos de lado o autocuidado social, no convívio essencial ao desenvolvimento cognitivo que estimula o senso de pertencimento, traz o sentimento de aceitação, acolhimento e reconhecimento, o que também nos gera consciência para resoluções de conflitos. O autocuidado espiritual, que segunda a própria ciência tem impacto na saúde como um todo ao respeitar questões de crença e fé, aumenta a expectativa de vida e traz conforto.
O autocuidado intelectual contribui na ativação da criatividade, o exercício da leitura e do aprendizado garante um repertório mais perene e condizente com cada momento, de maneira que o profissional evolui em suas expertises, habilidades e afinidades.
Temos reforçado por meio dos sindicatos filiados à FNE em todo país, nos mais diversos eventos dos quais participamos, que o autocuidado não é apenas uma opção, mas uma necessidade para se garantir a saúde e a longevidade dos profissionais de enfermagem; consequentemente, a qualidade do cuidado prestado.
Portanto, investir no autocuidado é apostar na sustentabilidade e na eficácia de um sistema de saúde, de fato, para todas e todos, incluindo os que cuidam de nós.
Solange Caetano é presidenta da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE)
Fonte: Outra Saúde / Foto: Divulgação