Cacau Protásio diz que cultura do cancelamento é cruel com erros dos artistas

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A artista diz não deixar “de viver ou dizer o que pensa” por causa dessa cultura. “É óbvio que a gente se preocupa, porque querendo ou não influenciamos várias pessoas que nos seguem”, afirma ela, que soma 3 milhões de seguidores no Instagram

 POR FOLHAPRESS – Segunda, 28 de Junho. de 2021

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Mãe, eu fui cancelada na internet, você não sabe o que é isso.” É assim que a cantora de funk Kellen, vivida por Lellê, 23, tenta explicar para a mãe, Cleide (Cacau Protásio), o tamanho que ela considera uma grande tragédia pessoal.

A cultura do cancelamento é o tema central da comédia “Barraco de Família”, filme que estreia nos cinemas e no streaming no segundo semestre deste ano. “Para a minha geração, isso tem uma importância muito grande”, diz Lellê, antes conhecida como a Lellêzinha do grupo Dream Team do Passinho.

Após ficar muito famosa, se mudar para um bairro chique de São Paulo e deixar de ver a família por mais de um ano, a jovem funkeira volta para a casa dos pais, na periferia da capital paulista, por um motivo: limpar a imagem depois que um vídeo comprometedor dela vazou na internet.

Se no filme, Cleide, a mãe de Kellen interpretada por Cacau Protásio, 46, não tem a exata dimensão do que representa essa pressão da internet sobre o comportamento das celebridades, na vida real, a atriz sabe bem o que é viver constantemente sob a tensão de a qualquer momento ser alvo do tribunal das redes sociais.

A artista diz não deixar “de viver ou dizer o que pensa” por causa dessa cultura. “É óbvio que a gente se preocupa, porque querendo ou não influenciamos várias pessoas que nos seguem”, afirma ela, que soma 3 milhões de seguidores no Instagram.

“Mas a gente bate na tecla de que precisa ser perdoado. A gente erra. Sou humana, de carne e osso, então, pode ter um dia que não estou bem, que não estou a fim, que cometo algum erro”, diz Protásio.

“Estamos em um momento que não podemos errar, não podemos falar, e isso é muito ruim”, completa. O longa, afirma Protásio, propõe de forma leve e bem-humorada essa reflexão. “A gente erra, pede desculpas e recomeça.”

A importância do apoio familiar é outro destaque da trama, pondera o diretor Maurício Eça (dos filmes “Carrossel” e a “A Menina que Matou os Pais”). “Estamos fazendo comédia, mas ela não é simples. É uma comédia que debate um tema forte, que é a família, a sua raiz, da onde você veio e com quem você pode contar.”

Além de Cleide, mulher batalhadora que sustenta praticamente sozinha a casa com a venda de lingeries, produtos de beleza e fazendo design de unhas, outros tipos bem peculiares formam a família de Kellen. A começar pelo pai da cantora, Eupídio (Eduardo Silva), um corretor de imóveis que não vende nada há meses e ainda trouxe para morar com eles Eulália (Lena Roque), sua irmã que passa o dia no Tinder.

Cleide e Eupídio tem mais um filho, Kleverson, vivido pelo ator Robson Nunes. Zuleica, interpretada por Sandra de Sá, faz parte da trupe como a mãe de Cleide. O cantor Péricles, o influenciador Hugo Gloss, e os humoristas Yuri Marçal e Maurício de Barros são outros nomes que participam da produção.

Para Cacau Protásio, o filme se destaca ao mostrar uma “família de pretos fazendo sucesso”, e sem estereótipos. “As pessoas tinham uma coisa que família preta não anda na moda, não se veste bem, não é antenada. E que família de pobre anda mal-arrumado, está sempre descombinado. E não é isso.”

Ela acrescenta que o mundo “começa a abrir os olhos” sobre a realidade da diversidade, e a retratar isso nos filmes, novelas e produções culturais. “Estamos evoluindo, abrindo portas, se entendendo e respeitando. Ainda é uma porta muito estreita, uma janela pequena e muito apertada, mas a cada dia que passa a gente consegue mostrar mais.”

Um sinal disso, segundo a atriz, são os diferentes tipos de cabelos usados pelas personagens de “Barraco de Família”.

Lellê e Sandra de Sá, por exemplo, usam os seus fios naturais crespos. Já a personagem de Protásio adota um cabelo ao “estilo henê”, diz a atriz, modelo muito comum nos anos 1980 em que as mulheres negras usavam o produto chamado henê para alisar os fios –para a caracterização, a atriz, que está com o cabelo bem curto na vida real, usou perucas.

“É libertador ter várias opções. Quando tinha a idade de Lellê, eu não havia em que me inspirar. Tinha a necessidade de ter o cabelo liso e odiava o meu fio natural, porque todo o mundo falava: seu cabelo é duro, não presta. E eu fiquei muito tempo acreditando nisso.”

“Graças a Deus, eu, Cacau, me libertei. Eu raspo, eu uso mega hair…eu me acho linda. A gente já se aceitou, e o mundo agora tem que aceitar a gente. Mulher negra existe, mulher cabeluda existe, magra, gorda, alta, baixa. E o mundo tem que aceitar”, complementa.

Para Lellê, outro ponto importante do filme é mostrar uma mulher cantora de funk, gênero musical que, de acordo com ela, sempre fez parte de um movimento “masculino e machista”. “E nós temos essas mulheres quebrando esse tabu.”

Cacau Protásio afirma que o próprio funk sofre certo preconceito. “Muitas pessoas têm medo de dizer que gostam. É igual aquela música: ‘é som de preto, de favelado, mas quando toca ninguém fica parado'”, cantarola a atriz. “Você pode ir em qualquer festa, qualquer evento, e você pode odiar funk, mas, se botar uma batida, na hora você começa a dançar.”

GRAVAÇÕES NA PANDEMIA

“Barraco de Família” foi gravado em quatro semanas em São Paulo, seguindo os protocolos de segurança para evitar a disseminação da Covid-19. “Nunca pensamos em falar da pandemia no filme. As pessoas já estão de saco cheio [do assunto], porque a gente está vivendo isso”, diz o diretor Maurício Eça.

“A nossa ideia é trazer um pouco de alegria e leveza nesse momento”, afirma ele. A proposta do longa surgiu antes da pandemia, mas o roteiro final foi adaptado já para as restrições impostas pelo novo coronavírus. Boa parte das gravações, por exemplo, se passa no cenário da casa da família. “E não podíamos filmar externas à noite, porque tinha toque de recolher em São Paulo. Mas nada disso impacta no roteiro.”

Eça afirma que o mercado de cinema no Brasil sempre “foi muito guerrilheiro”. Antes mesmo da Covid-19, ele diz que a indústria cinematográfica nacional já sofria sem apoio do governo. Com a pandemia e o fechamento dos cinemas, a situação piorou.

Ele é o diretor dos aguardados filmes “A Menina que Matou os Pais” e “O Menino que Matou Meus Pais”, ambos sobre o caso Suzane Von Richthofen. A previsão inicial de lançamento dos longas era para março de 2020, mas foi adiada por causa da crise sanitária. “Estamos esperando o melhor momento para lançar.”

Cacau Protásio também teve a estreia do filme “A Sogra Perfeita” adiada por causa da pandemia. No caso de “Barraco de Família”, além dos cinemas, ele já tem a proposta de ser lançado no streaming. “É uma batalha que a gente vai seguir lutando e conquistando espaço, é o que nos resta fazer”, diz o diretor. Informações do site Notícias ao Minuto.

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