Cultura africana

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Por Francisco Porfírio – Professor de Sociologia

Cultura africana, se considerada como um vasto conjunto de hábitos, costumes, religiões e artes do continente africano, tem uma origem diversificada e rica em elementos.

“Cultura africana é vasta e diversificada, dotada de uma enorme riqueza imaterial, fator que se explica tanto pela diversidade de etnias presentes na África quanto pela influência de povos do Oriente Médio e europeus que tiveram contato com os africanos ao longo da história. A combinação dos fatores migratórios, da colonização europeia e da diversidade étnica no interior do continente fez com que a África seja atualmente um continente em que se fala vários idiomas e cultua-se várias religiões e que se caracteriza por ser pluricultural.”

“Diversidade cultural da África
O continente africano pode ser dividido geopoliticamente em duas grandes faixas de terra: a África saariana (região norte) e a África subsaariana (região sul). Ambas são regiões de diversidade cultural, mas a porção sul do continente é mais diversificada e contém a maior parte da população.”

“A região norte, saariana, manteve, ao longo da história, contatos forçados e espontâneos com povos fenícios, turcos, árabes, romanos, gregos e do extremo oriente. Ela é situada numa área árida, logo acima do Deserto do Saara, e é composta por países como Egito, Marrocos, Tunísia, Líbia e Argélia.

Vivem nessa porção de terras cerca de 30% da população do continente, e a maioria desses habitantes cultua o islamismo, seguida por uma minoria cristã. A pessoas que lá vivem têm traços fenotípicos peculiares, oriundos da mistura entre povos do Oriente Médio, negros e brancos, sendo que elas não são brancas como os povos naturais da Europa ou negras como os povos naturais da África subsaariana.

Antes de entendermos a diversidade cultural da África subsaariana, devemos desfazer um preconceito que muitos carregam consigo sobre a porção sul do continente. A miséria, a fome, as doenças e a desigualdade social não fazem parte da história antiga da África.”

“A África subsaariana é composta por povos de várias etnias diferentes que levavam um modo de vida tribal. Dentre as várias etnias, destacamos os povos Bantos, Nagô e Jeje, trazidos para o Brasil durante o Período Colonial. Era comum a guerra entre as tribos, e essas cultuavam diferentes religiões com uma matriz parecida, baseada no culto aos orixás — entidades que na mitologia africana têm um contato espiritual com a natureza e representam a ligação e a proteção dos elementos naturais ou dos seres humanos.

Atualmente, há uma grande parcela da população do sul da África que mantém as suas raízes e cultua as religiões tradicionais, mas também há um número expressivo de muçulmanos e cristãos vivendo na região, o que causa conflitos religiosos oriundos do preconceito e da intolerância, sobretudo por parte dos cristãos e muçulmanos.

As mazelas que atingem o povo africano nos dias de hoje são resultantes do processo de colonização em dois ciclos:

Colonialismo
Liderado sobretudo por Portugal e Espanha, buscou na África subsaariana pessoas para serem escravizadas nas colônias e satisfazerem as necessidades de mão de obra agrícola e da mineração. Nesse processo, assim como os países europeus tomaram riquezas naturais de suas colônias situadas nas Américas, também confiscaram riquezas naturais africanas.

Outra característica dessa primeira colonização foi o acirramento intencional, por parte dos europeus, de conflitos internos entre as tribos africanas, a fim de conseguir, por meio de acordos com as tribos vencedoras, a captura dos escravos vencidos na guerra para que fossem enviados para as colônias. Era um costume comum entre as tribos que os vencedores capturassem os vencidos como escravos.

Esse sistema de escravidão era, no entanto, bem diferente da escravidão de viés europeu, pois os africanos viam-se, mesmo em uma relação de senhor e escravo, como iguais, enquanto os europeus enxergavam os africanos como inferiores.

Neocolonialismo
O neocolonialismo (ou imperialismo) foi uma segunda onda de colonização que literalmente dividiu a África subsaariana e alguns países da Ásia e Oceania entre as principais potências europeias. A maior parte do continente africano ficou sob o domínio da Inglaterra, havendo também países sob os domínios português e francês. Esse fator ocasionou uma divisão de fronteiras e formação de Estados nacionais na região.

O problema é que esses Estados abrigavam diversas etnias e tribos diferentes, com religiões e culturas diferentes, e que eram historicamente inimigas. Isso ocasionou diversos conflitos internos e guerras civis que marcaram a história do continente e contribuíram para a pobreza da população local. Outros fatores que ocasionaram a miséria foram a retirada desenfreada de recursos naturais oriundos da mineração, como ouro e diamantes, e a caça, que esgotaram os recursos naturais em diversos locais do continente.

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Tradições culturais da África
Dentre as tradições culturais, podemos destacar algumas como mais marcantes e disseminadas. Separamos e expomos a seguir seções com as marcas tradicionais dos povos africanos.

Hábitos e costumes
Dentre os povos do norte do continente, destacam-se os hábitos e costumes tradicionalmente islâmicos, pois essa denominação religiosa é predominante por lá. É comum nas sociedades, sobretudo a egípcia e a marroquina, a prevalência do uso do véu para as mulheres muçulmanas e a instituição de um modelo patriarcal de família, baseado nos costumes do islamismo.

Já os povos do sul têm uma cultura mais vasta e, consequentemente, mais diversificada. Em alguns lugares, predomina-se a cultura cristã, sobretudo nos que a colonização estabeleceu-se com maior força, como a África do Sul. Já em outros, como o Congo, Moçambique, Serra Leoa, Somália e Quênia, a prevalência do modo de vida tribal nos interiores ainda é marcante, o que nos remete às religiões politeístas nativas ainda existentes.

Artes plásticas
Os povos africanos do sul desenvolveram diversas formas artísticas ligadas, principalmente, às suas religiões. Trata-se de artefatos, como máscaras, trançados de corda, estatuetas e outros, esculpidos em madeira, pedra ou confeccionados com tecidos. O simbolismo dessas formas artísticas remete às divindades ou a elementos do cotidiano e têm significados diferentes para cada povo, representando o sagrado, o profano ou ações que fazem parte da cultura, como a guerra e a coleta de alimentos (a maioria das tribos subsaarianas possuía uma vida nômade, baseada na caça e na coleta, antes da chegada dos europeus ao continente).

As máscaras são elementos da cultura africana que unem as artes plásticas e a religiosidade.
As esculturas em marfim dos povos Bakongo evidenciam a tradicional caça de elefantes, animais que já foram abundantes em alguns lugares da África, para a alimentação. As presas desses animais são feitas de um material denso e calcificado, o marfim, e eram utilizadas para fazer esculturas e adornos, como colares.

Os povos que habitavam as regiões de Savana (bioma presente em grande parte da África subsaariana) conheciam a metalurgia, fundindo metais para fabricar armas de caça e de guerra, além de artefatos de decoração.

Música e dança
A música e a dança fazem parte das culturas tribais africanas. Embaladas por um ritmo marcado por instrumentos de percussão, as danças africanas geralmente têm ritmo e compasso rápidos, o que permite variações e movimentos diferentes.

Ambas artes, muitas vezes, possuem conotações religiosas e são utilizadas para marcar cultos tradicionais, sendo elementos que atraem e agradam os orixás (ou os bons espíritos) e afastam os maus espíritos. A música e a dança também são utilizadas nas tribos em comemorações e festivais, sendo praticadas por todos os integrantes.

Alguns ritmos de origem africana são a capoeira (uma mistura de arte marcial com dança), o batuque, o lundu e o coco. Muitos ritmos musicais ocidentais originaram-se com base na música africana, como o samba, o axé e o maracatu no Brasil; o reggae na Jamaica; e o jazz nos Estados Unidos.

São instrumentos típicos da cultura africana para a composição da música:

Atabaque: um instrumento de percussão fabricado com madeira e couro de animais, geralmente tocado com as mãos, também pode ser tocado com baquetas finas de madeira. É utilizado hoje na capoeira, no samba, no axé e no maracatu, entre outros ritmos.

O atabaque é um instrumento muito utilizado em jogos de capoeira, cerimônias religiosas e em outros contextos.
Berimbau: instrumento de origem angolana composto por um arco de madeira, uma corda de arame e uma caixa de cabaça, que amplifica o som que resulta da vibração da corda. O berimbau é tocado com uma vareta, feita de algum graveto de madeira resistente, e normalmente é acompanhado por um chocalho, que movimenta a vareta, e uma pedra, que segura o berimbau e serve para interromper a vibração da corda. Em Angola, o berimbau é conhecido como m’bolumbumba. O instrumento é utilizado, desde a sua criação, na capoeira, para produzir os sons típicos que entoam a dança dos capoeiristas.

Agogô: é um instrumento de metal que possui duas ou mais campânulas (parte de fora de um sino sem a campainha, que é o pêndulo interno) de metal e de tamanhos diferentes, presas por uma haste também de metal. Uma baqueta de metal ou de madeira é utilizada para vibrar as campânulas, que produzem o som.

Afoxé: é uma espécie de chocalho feito com uma cabaça e uma rede trançada com linhas e sementes. A rede cobre a cabaça, mas fica solta, de modo a permitir um atrito entre as sementes e a cabaça quando movimentadas, o que gera o som amplificado pela cabaça.

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Cultura afrodescendente no Brasil
A cultura africana chegou às terras brasileiras pelos africanos trazidos para cá para servirem de escravos. Os navios negreiros ou tumbeiros (grandes embarcações europeias que traziam em seus porões dezenas e até centenas de africanos em condições degradantes) carregavam pessoas de várias etnias africanas, o que permitiu a pluralidade cultural de origem africana no Brasil.

Com a fusão entre a cultura africana e os vários elementos da cultura indígena e europeia, nasceu no país uma cultura muito vasta. Se buscarmos em nossas origens, diversos são os elementos que compõem a nossa formação tradicional e têm origem no continente africano.

Candomblé e umbanda
São religiões originalmente brasileiras, mas que surgiram com base em elementos religiosos africanos. O candomblé consiste no culto aos orixás da cultura iorubá, enquanto a umbanda é uma forma sincrética entre o candomblé, o catolicismo e o espiritismo kardecista.

As religiões afro-brasileiras estão presentes principalmente no estado da Bahia.
Culinária
Nossa culinária é repleta de pratos e ingredientes originários da cultura africana ou criados por africanos no Brasil. Podemos listar o acarajé, o vatapá, o abará e o caruru. Apesar da crença comum de que a feijoada tem sua raiz na cultura dos africanos escravizados no Brasil, a sua origem incerta parece apontar que, ao menos como é feita hoje, não foi uma criação dos escravos.

Em primeiro lugar, como defende o historiador e folclorista brasileiro Luís da Câmara Cascudo, muitos escravos eram muçulmanos, e a religião islâmica interdita o consumo da carne de porco pelos seus adeptos por considerá-lo um animal impuro. Em segundo lugar, a carne seca e a carne de porco, mesmo os pedaços menos cobiçados hoje, como a orelha, o rabo, o focinho e a pata, eram de grande valor, devido à dificuldade em criar-se os animais e conservar suas carnes no Período Colonial, o que distancia a tese de que esses pedaços eram servidos aos escravos.

O historiador Carlos Alberto Dória aponta que a feijoada como conhecemos hoje foi criada em restaurantes brasileiros no século XIX e tem sua origem no “feijão gordo”, que consiste no feijão cozido com carne seca.

Dança
Temos hoje diversas danças brasileiras que foram trazidas por africanos ou surgiram com base em elementos culturais dessas pessoas que viviam no Brasil. São elas: a capoeira, que é também uma arte marcial utilizada como defesa dos escravos fugitivos contra os capitães do mato; o samba; o axé, dança originária do ritmo afoxé que tem origem nas tradicionais danças religiosas); o coco; e o maracatu.


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