As doenças oftalmológicas são causadas por diversos motivos, desde causas genéticas até hábitos de vida. A médio e longo prazos, algumas doenças oculares podem levar a problemas na visão até mesmo à cegueira. A campanha Abril Marrom chama atenção para a prevenção e combate à cegueira.
Estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que cerca de 285 milhões de pessoas no mundo têm a visão prejudicada, sendo que a maioria dos casos poderiam ser evitados ou podem ser tratados. No Brasil, o último censo demográfico (IBGE 2010) identificou mais de 35 milhões de pessoas com algum grau de dificuldade visual.
Embora os problemas de visão, como miopia, hipermetropia e astigmatismo, sejam comuns, o acesso ao diagnóstico e tratamento não é tão simples e acessível para todos. Especialistas apontam que a desigualdade socioeconômica do país impede que o tratamento chegue a toda a população.
O médico oftalmologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP) João Marcello Fortes Furtado afirma que, atualmente, no Brasil, apenas o médico oftalmologista é habilitado para prescrever o uso de óculos. “Somente o médico pode determinar esse tipo de tratamento, mas, como a prescrição de óculos não é ensinada na graduação de medicina, na prática, somente o oftalmologista faz isso”, afirma Furtado, em comunicado.
Em razão dessa especificidade para indicar o tratamento adequado, em lugares mais remotos, onde não há uma estrutura completa na área da saúde e onde a existência de especialistas é uma exceção, a população tende a ficar desamparada. Nesse contexto, medidas ineficazes são utilizadas para solucionar o problema, como a compra de óculos vendidos em farmácias, cujo grau pode não ser o mais adequado para cada indivíduo.
Falta de acesso
A dificuldade para encontrar um profissional é uma das principais barreiras ao uso dos óculos no país, segundo o médico. Além disso, é preciso considerar o custo que o indivíduo vai ter para comprar os óculos, que é outra limitação, em especial em lugares mais pobres.
“Várias cidades no Brasil não contam com um especialista na área e, quando existe a presença do profissional, nem sempre ele está disponível. Por exemplo, se ele não trabalha na rede pública, o custo para sua consulta torna-se uma barreira para a parte da população mais vulnerável”, diz Furtado.
Apesar das realizações de mutirões para tentar atender à essa população e solucionar o problema, a medida não é suficiente, avalia o especialista.
“Imagine uma situação de uma vez por ano ocorrer um mutirão e, ao fazer os óculos ali, por algum motivo, depois de pouco tempo ele se quebra. Para aquela pessoa que não conseguiu comparecer naquele dia, ela terá que esperar até o próximo mutirão para o seu problema ser resolvido também”, alerta o professor.
Alternativas
Apesar da falta de acesso ao oftalmologista ser uma das dificuldades para o tratamento adequado, o presidente da Sociedade Brasileira de Oftalmologia, Ricardo Paletta Guedes, afirma acreditar que o problema é ainda mais complexo.
“O Brasil possui um número acima do indicado pela OMS para médicos oftalmologistas por habitante. O problema é que existe uma má distribuição, há locais com excesso de médicos e outros com falta”, diz. Para Guedes, é preciso medidas públicas direcionadas para levar à correção dos defeitos refrativos – miopia, hipermetropia e astigmatismo – a toda a população brasileira.
Furtado também destaca que uma melhor integração dos serviços de atendimento de saúde primária poderia ajudar a solucionar esse desafio nas áreas mais carentes.
“Poderia, por exemplo, ser feita uma capacitação dos médicos, que são clínicos gerais, do programa de saúde da família”, diz. Após a capacitação, o médico poderia realizar o exame oftalmológico de casos não complicados, com supervisão de um oftalmologista, que pode ser feita de maneira remota, solucionando a grande maioria dos problemas de refração.
Para o professor da USP, a inserção de programas que forneçam óculos a custo zero também seria uma medida eficaz para as pessoas que não podem pagar por ele. “Da mesma forma que existem programas de fornecimento de medicação para hipertensão arterial, diabete, etc. na rede pública”, pontua. Apesar de reconhecer a importância dos mutirões, o médico diz que a população precisa de algo perene para as queixas do dia a dia.
(Com informações de Ana Beatriz Fogaça, do Jornal da USP)