Economistas questionam otimismo de Haddad sobre inflação e juros

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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, causou algum alvoroço no mercado financeiro ao afirmar, em evento que o governo Lula pode encerrar o mandato com a inflação média mais baixa desde o Plano Real, e que, com a combinação do novo arcabouço fiscal, reforma tributária e câmbio favorável, seria possível iniciar um ciclo de cortes de juros com sustentabilidade. Em um momento de instabilidade global e gastos públicos mantidos, economistas do mercado financeiro não compartilham do mesmo otimismo sobre o acumulado no período presidencial que se encerrará em 2026. Eles apontaram sérias dúvidas sobre as previsões de Haddad.

Embora Haddad fale com confiança sobre a trajetória de queda da inflação, diversos economistas não acreditam que o cenário seja tão favorável quanto ele sugere. Para Gustavo Assis, CEO da Asset Bank, a visão do ministro carece de uma análise mais profunda sobre os desafios do crédito no Brasil. “O desemprego em 5,6% impressiona, mas mostra apenas parte da história. Por trás dos recordes de ocupação, há um crédito bancário que continua restrito e caro, incapaz de sustentar sozinho a atividade”, alerta Assis. Segundo ele, a crise do crédito e a Selic elevada podem comprometer a recuperação da economia, paralisando negócios e impedindo novos investimentos que são essenciais para sustentar o crescimento.

De forma semelhante, Richard Ionescu, CEO do Grupo IOX, também questiona o otimismo do ministro. Para ele, o mercado de crédito, ao mesmo tempo em que se mostra resiliente no curto prazo, apresenta sérios desafios estruturais. “A baixa tração para novas operações de securitização, justamente porque a Selic em 15% encarece o custo e mantém investidores seletivos, pode atrasar o ciclo de crescimento sustentável. O risco não está no aumento imediato do desemprego, mas na dificuldade de transformar esse dinamismo em projetos estruturados de longo prazo”, comenta Ionescu. Ou seja, a incapacidade de reduzir os custos do crédito poderia limitar o crescimento futuro da economia brasileira, sem que as promessas de inflação baixa e cortes de juros se concretizem de forma sólida.

Por fim, André Matos, CEO da MA7 Negócios, acredita que a alta taxa de juros vai frear mais do que apenas os investimentos, mas também as expectativas de crescimento. Embora reconheça que o mercado de trabalho brasileiro está “aquecido”, Matos é cauteloso quanto ao impacto de uma Selic mantida em níveis elevados. “O alerta global fica por conta do ambiente externo mais sensível à política monetária e geopolítica. Se os choques persistirem, a economia segue andando, mas a passos mais curtos“, avalia. A instabilidade externa, juntamente com uma política monetária apertada, pode agravar o cenário.

Os economistas alertam que, apesar do cenário de desemprego baixo e da relativa resiliência do mercado de trabalho, a política monetária atual e as condições do crédito no Brasil não são favoráveis ao tipo de otimismo que o ministro Haddad propõe. De acordo com Pedro Ros, CEO da Referência Capital, a Selic elevada, ao mesmo tempo que contribui para a estabilidade, limita o fôlego necessário para um crescimento mais robusto. “A Selic em 15% ainda limita investimentos mais intensivos em capital, mas ao mesmo tempo preserva estabilidade, reduzindo o risco de uma alta repentina no desemprego”, observa Ros.

O consenso é claro: a previsão de uma inflação controlada e de um ciclo de queda de juros sustentável depende de fatores que ainda estão longe de se concretizar. O risco de uma paralisia na atividade econômica continua alto, e os investidores, por sua vez, parecem cada vez mais seletivos, o que pode dificultar ainda mais a atração de investimentos no Brasil.

Com a expectativa de que a Selic continue elevada, o desafio será encontrar alternativas de crédito estruturado que consigam sustentar o crescimento sem sobrecarregar o sistema bancário. Se o governo não conseguir equacionar esse dilema, o risco é de que o otimismo de Haddad se mostre furado.

Fonte: Money Report / Foto: Reprodução

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