Por Jorge Wellington (Portal Ipirá City) – Sexta, 19 de dezembro de 2025
As recentes operações da Polícia Federal não são apenas mais um capítulo na luta contra o crime. Elas revelam, com precisão cirúrgica e detalhes estarrecedores, uma verdade que a sociedade suspeitava, mas cuja magnitude e profundidade chocam: a existência de uma infecção sistêmica que corrói as bases do Estado Democrático de Direito.
Os nomes e cargos que surgem nos mandados de busca e apreensão, nas delações e nas prisões temporárias compõem um retrato aterrador da contaminação geral: senadores, deputados, prefeitos, vereadores, empresários, instituições financeiras, policiais, desembargadores, juízes, e traficantes de drogas. Não se trata de casos isolados de “maçãs podres”. A imagem que se forma é a de uma rede – uma simbiose nefasta entre o poder político, o poder econômico e o crime organizado.
Nessa teia, os crimes se entrelaçam e se alimentam mutuamente: corrupção ativa e passiva abre as portas do erário; lavagem de dinheiro injeta o produto do crime e do desvio na economia formal, branqueando-o por meio de empresas e instituições financeiras coniventes; o crime organizado fornece o fluxo de ilegalidade e violência, comprando proteção e influência. O resultado final é um só: o dinheiro público, suado pela população, escoa pelo ralo da falta de vergonha.
Esse desvio monumental de recursos tem um rosto: é o da escola sem recursos, do hospital sem medicamentos, da estrada esburacada, da infraestrutura que desmorona. É o desrespeito mais profundo à população, tratada não como cidadã, mas como espectadora passiva e vítima silenciosa de um esquema que a rouba no presente e hipoteca seu futuro.
A participação de figuras do Judiciário e da polícia no esquema é particularmente grave. São justamente os pilares que deveriam conter essa maré de ilegalidade. Quando esses agentes se tornam partícipes, a mensagem de impunidade se amplifica, e a desconfiança da sociedade nas instituições atinge níveis perigosos, minando a já frágil fé na justiça e na lei.
Não podemos, contudo, ceder ao cinismo ou à desesperança. A própria revelação desses esquemas, fruto do trabalho técnico e corajoso de investigadores, promotores e juízes íntegros, é um sinal de que o sistema, embora gravemente doente, ainda possui anticorpos. A Polícia Federal, neste momento, atua como um bisturi tentando extirpar um tumor de dimensões nacionais.
O que se exige agora, além das ações da justiça, é uma resposta cívica enérgica e permanente. A sociedade não pode se acomodar. É preciso:
- Acompanhar e exigir que as investigações sigam a todos os envolvidos, sem protecionismos ou “pactos de silêncio” que poupem poderosos.
- Cobrar das instituições – Congresso Nacional, Tribunais, Ministério Público – medidas concretas de transparência, responsabilidades e reformas que fortaleçam os mecanismos de controle.
- Refletir no voto. As urnas são o instrumento supremo de saneamento. É imperativo rejeitar nas eleições qualquer candidatura associada, direta ou indiretamente, a esquemas de corrupção, independentemente de partido ou ideologia.
- Manter a pressão social por meio da mídia, das organizações da sociedade civil e do debate público constante.
Os escândalos em curso são um diagnóstico assustador, mas também um chamado à ação. Eles mostram que a doença é grave, mas não terminal. A cura, porém, não virá apenas de cima. Dependerá da capacidade da população de transformar o choque e a indignação em vigilância ativa, em memória eleitoral e em uma demanda inegociável por ética e respeito. O dinheiro público é do povo. A República é do povo. Chegou a hora de resgatá-las das mãos daqueles que as sequestraram para benefício próprio. O ralo da falta de vergonha precisa ser tapado – e a ferida, exposta e limpa, precisa cicatrizar.