Especialistas explicam como novas regras para criptos dificultarão lavagem de dinheiro

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Prestadoras terão de seguir padrões mais rígidos de rastreio, transparência e proteção de dados sob supervisão direta do Banco Central, de acordo com normas internacionais

Após o Banco Central (BC) publicar nesta semana as resoluções nº 519, 520 e 521, que inauguram o marco regulatório para os prestadores de serviços de ativos virtuais (PSAVs), especialistas do setor financeiro acreditam que as novas regras devem reduzir a vulnerabilidade de ativos digitais em fraudes e lavagem de dinheiro. As medidas, que entram em vigor a partir de fevereiro de 2026, exigem que todas as prestadoras — corretoras, custodiantes e operadoras de ativos virtuais — obtenham autorização formal do BC para funcionar, além de cumprir padrões elevados de governança, TI, controle de riscos e de capital mínimo.

As novas resoluções criam a figura das sociedades prestadoras de serviços de ativos virtuais (SPSAVs), que deverão se enquadrar em modalidades específicas — intermediária, custodiante e corretora — e cumprir requisitos semelhantes aos das instituições financeiras, incluindo segregação de atividades, controles internos robustos, políticas de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (PLDFT) e segurança cibernética.

Além disso, o BC introduziu uma espécie de “travel rule brasileira”, que obriga a rastreabilidade das transações de criptoativos entre prestadoras e a identificação das carteiras autocustodiadas, alinhando o país às diretrizes internacionais do Grupo de Ação Financeira (Gafi), organismo de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. O grupo estabelece padrões internacionais com 40 recomendações e avalia a aplicação das leis e regulamentos para combater essas atividades nos países membros.

Na avaliação de Janny Castro, diretora da Forvis Mazars, o Brasil finalmente deu um passo decisivo para trazer segurança jurídica e confiança ao mercado de criptoativos. “O desafio agora é técnico: as empresas precisarão traduzir exigências regulatórias em controles operacionais e tecnológicos eficazes, especialmente nas trilhas de PLDFT e cibersegurança. O setor entra em 2026 com uma oportunidade inédita de consolidar credibilidade global”, explica.

As normas de combate à lavagem de dinheiro incluem: endereço físico obrigatório, transparência pública sobre novos controladores, plano de negócios atualizado e divulgação de cancelamentos. Fundos de investimento não poderão controlar corretoras de criptomoedas, e o BC vai monitorar mudanças societárias e encerrar operações não autorizadas, dando 30 dias para clientes transferirem seus ativos caso uma empresa seja barrada ou não se adeque.

Modelo europeu

Segundo o BC, as novas regras reforçam a segurança para investidores, aumentam a supervisão e diminuem oportunidades para práticas ilícitas, pirâmides financeiras e manipulação de mercado. Empresas do setor terão nove meses para se ajustar, sob risco de liquidação ou multa em caso de descumprimento das normas.

Além do Gafi, a medida segue o modelo europeu MiCA (Markets in Crypto-Assets Regulation), reforçando a transparência e a proteção dos usuários ao exigir contas individualizadas. “Com a publicação do marco regulatório, o Banco Central deixa claro que a atuação com criptoativos por parte das fintechs passa a exigir não só estrutura tecnológica, mas também governança, compliance e controles, como no sistema financeiro tradicional. É o momento de as empresas revisarem seus modelos e buscarem assessoramento jurídico especializado para se adequarem”, afirma Marcos Bruno, sócio do Opice Blum Advogados.

Para o setor, o novo marco é visto como positivo e necessário, encerrando um período de incerteza desde a edição da lei de criptoativos. “O BC foi cuidadoso ao conduzir consultas públicas antes da edição das normas, o que resultou em um texto mais aderente à realidade do mercado”, avalia Viviane Prota, advogada sênior do Opice Blum Advogados

Além de trazer segurança jurídica, o arcabouço tende a estimular a competitividade e a inovação, ao deixar as regras mais claras e criar uma nova modalidade de instituição autorizada, capaz de atrair novos players e impulsionar modelos de negócio no segmento.

“Tenho visto muita crítica à nova norma, mas vejo com bons olhos os pontos técnicos trazidos pela regulação. Exigir que as instituições deem transparência à base de tecnologia utilizada, como qual é o mecanismo de consenso e quais protocolos adotam, eleva o padrão de prestação de informações, reduz assimetrias, facilita auditorias e dá base para o cliente avaliar riscos. No fim, isso traz mais transparência e maturidade ao setor”, argumentou Caroline Nunes, fundadora da InspireIP, advogada especializada em direito e tecnologia, que já atuou em capacitações sobre tokenização junto ao Departamento de Regulação (Denor) do BC.

Fonte: Money Report / Foto: Reprodução

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