Estudo da Fiocruz: consumo de álcool custa R$ 18 bi por ano ao país e causa 12 mortes por hora

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O consumo de bebidas alcoólicas representou um custo para o Brasil da ordem de R$ 18,8 bilhões em 2019. É o que aponta o estudo Estimação dos custos diretos e indiretos atribuíveis ao consumo do álcool no Brasil, realizado pela Fiocruz Brasília sob a liderança do pesquisador Eduardo Nilson do Programa de Alimentação, Nutrição e Cultura (Palin), a pedido das organizações Vital Strategies e ACT Promoção da Saúde como parte da iniciativa RESET Álcool.

Deste total, R$ 1,1 bilhão referem-se a custos federais diretos com hospitalizações e procedimentos ambulatoriais no Sistema Único de Saúde (SUS). Os custos indiretos atribuíveis ao consumo do álcool, por sua vez, compreenderam R$ 17,7 bilhões e incluem as perdas de produtividade pela mortalidade prematura, licenças e aposentadorias precoces decorrentes de doenças associadas ao consumo de álcool, perda de dias de trabalho por internação hospitalar e licença médica previdenciárias. Dentro das estimativas indiretas está o custo previdenciário, que atingiu R$ 47,2 milhões em 2019. Do total, 78% (R$ 37 milhões) foram referentes aos gastos com o público masculino, enquanto 22% relacionado às mulheres (R$ 10,2 milhões).

O levantamento usou como base estimativas de mortes atribuíveis ao álcool feitas pela Organização Mundial da Saúde e levou em consideração para o cálculo de custo um total de 104,8 mil mortes em 2019 no Brasil, o que significa uma média de 12 óbitos por hora. Os homens são as principais vítimas e representaram 86% das mortes, das quais quase a metade foi decorrente de doenças cardiovasculares, acidentes e violências. No público feminino, que responde por 14% dos registros fatais, os malefícios do álcool levaram a doenças cardiovasculares e vários tipos de câncer em mais de 60% dos registros.  

“Podemos concluir com o estudo que o consumo de álcool no Brasil tem impactos significativos na saúde e no bem-estar da população e, consequentemente, custa muito caro aos cofres públicos. Nesse cenário, fica clara a necessidade de adoção de medidas como o imposto seletivo sobre bebidas alcoólicas. Essa é uma das ações recomendadas pela Organização Mundial da Saúde para reduzir o consumo de álcool e, consequentemente, seu impacto negativo. Com a redução do consumo, podemos salvar vidas e reduzir os impactos sociais do álcool, poupando bilhões de reais todos os anos”, afirma Pedro de Paula, diretor-executivo da Vital Strategies. 

O custo do SUS com a hospitalização de mulheres relacionada a problemas decorrentes do consumo de bebidas alcoólicas responde por 20% do total, ou seja, bem inferior ao custo com o público masculino. Isto ocorre porque a prevalência de consumo de álcool pelas mulheres é menor, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS 2019), na qual cerca de 31% das pesquisadas relataram ter consumido álcool nos 30 dias anteriores a pesquisa, enquanto o percentual masculino é de 63%.  

Outra razão refere-se ao fato de que as mulheres procuram mais os serviços de saúde e realizam o autocuidado, como exames de rotina. Isso faz com que sejam tratadas antes que as complicações mais graves de saúde aconteçam. “Quando os homens procuram o serviço de saúde possivelmente já estão com a saúde muito mais comprometida, o que acarreta mais hospitalizações”, afirma Eduardo Nilson, pesquisador da Fiocruz e responsável pelo estudo.

Já quando se trata de custos relacionados ao atendimento ambulatorial atribuível à ingestão de álcool, a diferença entre os públicos masculino e feminino cai significativamente, considerando que 51,6% dos custos referem-se ao público masculino.  “Isso confirma que as mulheres buscam mais atendimento precocemente do que os homens: elas são responsáveis por quase metade dos atendimentos ambulatoriais, mesmo com a prevalência de consumo de álcool entre elas seja menor’, explica Nilson. Em relação à faixa etária, a incidência maior no atendimento ambulatorial ocorre nas pessoas entre 40 e 60 anos, sendo que 55% dos custos referem-se às mulheres e 47,1% aos homens.

Embora atualmente os maiores custos decorrentes do consumo de álcool sejam relacionados aos homens, que historicamente sempre beberam mais, dados do Vigitel mostram que, entre 2006 e 2023, a ocorrência de episódios de consumo abusivo de álcool (quatro ou mais drinques em uma mesma ocasião) quase dobrou entre as mulheres.  A tendência de aumento de consumo entre elas também é comprovada pela PeNSE (Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar) de 2019, que mostra que enquanto 60% dos adolescentes do sexo masculino já tinham experimentado álcool antes dos 17 anos, 67% das meninas já tinham tido o comportamento no mesmo período.  

“Essa mudança comportamental traz um sinal de alerta para uma tendência de aumento na quantidade de pessoas consumindo álcool no Brasil impulsionado pelo consumo das mulheres e, consequentemente, dos seus impactos para saúde e em custos aos cofres públicos. É preciso um olhar muito cuidadoso para a população feminina a fim de frear esse crescimento estimulado por mudanças culturais e pelo próprio esforço da indústria de bebidas em deixarem seus produtos com um apelo mais unisex”, comenta Luciana Sardinha, Diretora Adjunta de Doenças Crônicas não Transmissíveis da Vital Strategies. 

Custos indiretos 

Quando se trata dos custos indiretos, o estudo mostra que também há uma predominância dos impactos na população masculina. Os impactos econômicos indiretos do consumo de álcool são vastos e multifacetados. Segundo o pesquisador da Fiocruz Brasília Eduardo Nilson, há implicações significativas na produtividade e na força de trabalho, resultando em absenteísmo, presenteísmo (quando o trabalhador comparece ao trabalho, mas apresenta queda na produtividade), acidentes de trabalho e mortes prematuras evitáveis. Além disso, a ingestão de bebidas alcoólicas está associada a um aumento no comportamento criminoso, incluindo violência doméstica, crimes e ocorrências de trânsito.

Metodologia 

O estudo Estimação dos custos diretos e indiretos atribuíveis ao consumo do álcool no Brasil foi baseado em uma metodologia de análise comparativa de risco que estima as frações atribuíveis a uma exposição (fator de risco ou proteção) em relação a desfechos de saúde diretamente causados por esta exposição. Foram consideradas as doenças e mortes associadas ao consumo de álcool com uma relação dose-resposta entre a quantidade consumida de álcool e o risco relativo dos desfechos a partir de metanálises publicadas e utilizadas pelo estudo de Carga Global da Doença (GBD – Global Burden of Disease) e pela Organização Mundial da Saúde. Em conjunto com a prevalência de consumo de álcool para cada grupo de sexo e idade, foi estimada qual a carga atribuível para cada doença, segundo faixa de consumo de álcool, aplicada posteriormente para os custos por doença. 

As informações sobre custos diretos foram obtidas em bases de dados públicos como sistemas de informação em saúde e relatórios e microdados de pesquisas populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os custos diretos atribuíveis ao consumo do álcool incluíram informações do SUS a partir de dados de internações hospitalares (Sistema de Informações Hospitalares – SIH/SUS) e de procedimentos ambulatoriais (Sistema de Informações Ambulatoriais – SIA/SUS), desagregados por tipo de doença atribuível ao consumo de álcool, sexo e idade. 

“Importante destacar que o estudo adotou uma abordagem conservadora, já que é baseado exclusivamente em dados oficiais de fontes públicas, como os dados relativos ao SUS e pesquisas populacionais do IBGE, e em nível federal, considerando os gastos da União e não incluindo complementos de custeios por estados e municípios. O levantamento também não considera os custos da rede privada de saúde, nem o total de perdas econômicas à sociedade. Portanto, embora quase 19 bilhões de reais por ano já seja uma cifra extremamente significativa, o custo real do consumo de álcool para a sociedade brasileira é provavelmente ainda muito maior”, afirma Eduardo Nilson, pesquisador responsável pelo estudo. 

Campanha reforça mensagens sobre efeitos nocivos do álcool 

Está sendo lançada a segunda fase da campanha publicitária do programa RESET Álcool. A iniciativa tem como objetivo conscientizar legisladores e a sociedade sobre os efeitos nocivos do álcool para a saúde e o para bem-estar social, tendo em vista a discussão do imposto seletivo sobre bebidas alcoólicas no âmbito da reforma tributária.  

Promovida pela Vital Strategies e a ACT Promoção da Saúde, a campanha intitulada Quer uma dose de realidade? será veiculada em São Paulo, Rio de Janeiro e em locais estratégicos de Brasília por um período de 30 dias. Estará presente em mídias digitais como o Facebook, Instagram, além de sites e portais de notícias. Também estão previstas transmissões em canais de TV fechada, rádio e outdoors. A agência Moringa é responsável pelo desenvolvimento criativo de toda a campanha. 

As imagens são fortes e a mensagens trazem dados sobre os impactos negativos do álcool na saúde e na vida dos brasileiros. Um hotsite apoia a campanha e apresenta dados de pesquisas e estudos que mostram os danos que o álcool causa à saúde e à vida dos brasileiros.

A Vital Strategies é uma organização global de saúde presente em mais de 80 países que trabalha com governos e sociedade civil para conceber e implementar estratégias e políticas para enfrentar alguns dos maiores desafios mundiais de saúde pública. A ACT Promoção da Saúde, uma organização não governamental, trabalha para desenvolver e defender políticas públicas que combatam doenças crônicas não transmissíveis.

Fonte: Portal Fio Cruz / Foto: © Getty imagens

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