Estudo mostra efeitos da obesidade na capacidade respiratória de mulheres

Ciências Covid-19

A resistência das vias aéreas está relacionada com a dificuldade de o ar se movimentar nessas vias, e afeta a capacidade funcional das mulheres, mesmo que elas não apresentem queixas ou sinais clínicos

Por Bianca Camatta – Segunda, 14 de novembro de 2022 – 00:25

A resistência das vias aéreas é o grau de dificuldade com que o fluxo de ar se movimenta para dentro e para fora dos pulmões, o que está associado ao diâmetro do sistema respiratório. Quanto mais resistência, maior a dificuldade durante a respiração. Alguns estudos já haviam demonstrado que as pessoas com obesidade, tanto homens quanto mulheres, apresentam esse distúrbio.

Agora, uma pesquisa da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP realizada com mulheres com obesidade grau 3, considerada a mais elevada, além de confirmar os resultados anteriores, traz novos dados ao mostrar que, embora haja um aumento da resistência do sistema respiratório, a maioria das participantes não reclamaram de falta de ar e nem de limitações importantes durante os testes de caminhada. Uma possível explicação para isso é que as mulheres que participaram do estudo se declararam fisicamente ativas.

De acordo com a professora Ada Clarice Gastaldi, uma das autoras da pesquisa, mesmo nessas pacientes que não se queixaram durante os exercícios, foi possível identificar que o aumento da resistência das vias aéreas se relaciona com uma diminuição da capacidade funcional do exercício e da habilidade na realização de atividades físicas e diárias. “Isso pode aumentar as chances de complicações em situações de maior demanda, como no controle da ventilação e nos níveis de oxigênio no sangue dos pacientes durante cirurgias, nos períodos de restrição ao leito, ou mesmo com o envelhecimento, e também, em situações críticas, como a necessidade de intubação”, explica a professora ao Jornal da USP.

Em casos de obesidade, o menor diâmetro das vias áreas pode ser causado pela diminuição de volume pulmonar, inflamação no interior das vias aéreas ou alterações hormonais. “Sabemos que os índices de obesidade estão aumentando na população em geral. O acúmulo de gordura no corpo pode causar o comprometimento da respiração, colaborando para insuficiência ventilatória”, diz a professora. Uma das maneiras de lidar com o problema é por meio de fisioterapia, um conjunto de técnicas manuais preventivas ou curativas que podem, por exemplo, melhorar a oxigenação do sangue e reeducar a função respiratória.

Os dados foram publicados na revista PLOS ONE no artigo Increased airway resistance can be related to the decrease in the functional capacity in obese women.

Identificação da resistência das vias aéreas

Participaram do estudo 37 mulheres em pré-operatório para cirurgia bariátrica do Hospital das Clínicas da FMRP. “Dentre as pessoas com obesidade, há uma prevalência maior em mulheres e, além disso, trabalhamos com um grupo vinculado a um serviço de cirurgia bariátrica [para redução de estômago] que atrai principalmente mulheres”, explica a professora Ada sobre o porquê de apenas pessoas do sexo feminino terem participado do estudo.

Além disso, as voluntárias não eram fumantes e tinham idade entre 18 e 50 anos. “Temos um grupo bem homogêneo, o que não é observado em muitas pesquisas. Vários estudos reúnem homens e mulheres ou grupos com diferentes graus de obesidade”, aponta.

A fisioterapeuta também explica que quando a resistência do sistema respiratório de pessoas sem obesidade é analisada, há um valor mais elevado em mulheres, já considerado nos valores de referência utilizados. Nas com obesidade, isso é intensificado.

As participantes foram avaliadas por meio do teste de caminhada de seis minutos, do teste de espirometria e do sistema de oscilometria de impulso.

No primeiro, durante seis minutos, o paciente caminha o mais rápido que conseguir em um corredor de 30 metros. Os níveis de frequência cardíaca, saturação periférica de oxigênio, frequência respiratória e pressão sanguínea são monitorados antes, durante e depois do exercício. E os pacientes informam, com base em uma escala, o nível de desconforto ao respirar e o de cansaço das pernas. A distância percorrida no teste é um indicador da capacidade funcional de exercício, que pode afetar o desempenho em atividades mais intensas e também as diárias.

A espirometria é o teste funcional pulmonar mais comum na prática clínica. Nele, é necessário que a pessoa inspire profundamente e expire o mais forte e rápido possível. A espirometria não fornece diretamente o valor da resistência, mas mostra o resultado que ela provoca no fluxo de ar.

Já a oscilometria é mais restrita às pesquisas. A vantagem desse teste é que não demanda esforço do paciente, que apenas precisa respirar tranquilamente em um bocal e avalia de forma direta o valor da resistência do sistema respiratório. “Na oscilometria, podemos medir a resistência inspiratória ou respiratória, a resistência das vias aéreas centrais ou periféricas”, acrescenta a professora Ada.

Avaliação para prevenção

Mesmo nas participantes que não relataram queixas durante os exercícios foi possível identificar que o aumento da resistência das vias aéreas se relaciona com uma diminuição da capacidade funcional do exercício. Ada acredita que seria interessante ainda adicionar ao estudo um grupo de mulheres com obesidade grau 3 e com queixas de dispneia —  falta de ar —, a fim de identificar se há um comprometimento proporcional da capacidade funcional.

Saber que o distúrbio pode acontecer sem sinais clínicos é positivo para identificação e prevenção desse estado, aponta a professora. “É importante lembrar que estamos trabalhando com avaliação, mas pensando sempre de que forma essa investigação pode contribuir. Não é só avaliar e identificar, mas é pensar, a partir do problema identificado, de que forma podemos tratá-lo”, complementa.

Mais informações: e-mail [email protected], com Ada Clarice Gastaldi

Fonte: Jornal USP

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