Taxa foi para 76,1 anos, a menor no país desde 1996; a Covid-19 foi o fator determinante para a diminuição
Após uma queda histórica em 2020, a expectativa de vida nos Estados Unidos sofreu outro golpe significativo em 2021.
De acordo com dados provisórios publicados nesta quarta-feira (31) pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), a expectativa de vida ao nascer caiu quase um ano entre 2020 e 2021 — um total de mais de dois anos e meio de queda no índice desde o início da pandemia.
A expectativa de vida ao nascer foi para 76,1 anos, a menor no país desde 1996, e o maior declínio em dois anos consecutivos registrado em um século.
A Covid-19 foi o fator determinante, com as mortes pelo vírus contribuindo para metade do declínio de 2020 a 2021, de acordo com o relatório do Centro Nacional de Estatísticas de Saúde do CDC.
A taxa de mortalidade por Covid-19 foi maior em 2021 do que em 2020, por isso não foi particularmente surpreendente que a expectativa de vida caísse novamente, afirmou Bob Anderson, estatístico-chefe de mortalidade do CDC, à CNN.
Além disso, os óbitos por overdose de drogas atingiram um recorde em 2021, matando cerca de 109 mil pessoas. As mortes causadas por lesões não intencionais — cerca de metade das quais devido à overdose de drogas — foi a segunda principal causa do declínio na expectativa de vida nos EUA.
A Dra. Nora Volkow, diretora do Instituto Nacional de Abuso de Drogas, apontou que o dado não é surpreendente, mas é frustrante.
“É angustiante ver um impacto negativo contínuo da overdose de drogas na expectativa de vida dos americanos. Essas mortes geralmente ocorrem em adultos jovens e, portanto, representam um número tragicamente alto de anos de vida perdidos e um impacto devastador em indivíduos, famílias e comunidades”, disse ela.
“Temos a ciência e as ferramentas disponíveis para nos ajudar a reverter essa tendência e reduzir o número de mortes por overdose neste país, mas essas ferramentas não estão sendo usadas de forma eficaz.”
Mesmo sendo esperado, o declínio ainda é extraordinário. Em 2021, as taxas de mortalidade por influenza e pneumonia diminuíram e, se não fossem esses “efeitos compensatórios”, o declínio na expectativa de vida nos EUA teria sido ainda maior, segundo o relatório.
“A mortalidade em geral, principalmente desde a década de 1950, mudou muito lentamente”, pontuou Anderson. As mudanças de mais de alguns décimos de um ano para outro foram consideradas substanciais.
Um declínio “surpreendente”
O recente declínio entre os índios americanos e os nativos do Alasca é particularmente “surpreendente”, afirmou Anderson.
A expectativa de vida desse grupo caiu quase dois anos entre 2020 e 2021 e 6,6 anos desde 2019 — mais que o dobro em comparação com o índice para a população total dos EUA.
Com 65,2 anos, a expectativa de vida dos índios americanos em 2021 era igual à expectativa de vida geral dos EUA em 1944.
“Quando eu vi isso no relatório, meu queixo simplesmente caiu”, confessou Anderson.
“Foi bastante difícil imaginar um declínio de 2,7 anos em dois anos na taxa geral. Mas, em seguida, ver uma redução de 6,6 anos de expectativa de vida para a população indígena americana apenas mostrou o impacto substancial que a pandemia teve nessa população”.
As mortes por Covid-19 foram, diretamente, o principal contribuinte para o declínio da expectativa de vida entre os índios americanos em 2021, mas as mortes por overdose de drogas e outras lesões não intencionais, bem como por doença hepática crônica, que é geralmente causada pelo abuso de álcool, contribuíram quase igualmente para a mortalidade deste grupo.
Quando se trata da pandemia, Anderson acrescenta: “Não estou falando apenas da Covid-19 necessariamente, mas também dos outros fatores que parecem ter aumentado durante a pandemia”.
Especialistas dizem que a pandemia exacerbou as disparidades já existentes entre os índios americanos e outros.
O Dr. Matthew Clark, diretor médico do Serviço de Saúde Indiano, considera que as descobertas do novo relatório do CDC são preocupantes, mas sabe-se que os índios americanos e os nativos do Alasca “sofrem desproporcionalmente com relação à saúde por uma ampla variedade de condições.”
Existem “aspectos únicos para abordar à saúde” nessas comunidades, frisou ele, e esses dados devem ser vistos como um “chamado à ação, uma oportunidade para redobrar nossos esforços” para abordar uma ampla gama de fatores que afetam a saúde dessas populações e se envolver com comunidades tribais para encontrar soluções.
“Mesmo no meio de um relatório preocupante como este, acho que ainda há esperança”, afirmou Clark. “Há uma oportunidade de mover a agulha para outra direção”.
Para fazer isso, o objetivo deve ser explorar as causas profundas dessas disparidades entre os índios americanos e o restante da população, completa Ruben Cantu, diretor de programa associado do Prevention Institute, uma organização sem fins lucrativos focada em equidade em saúde.
“Muito dessa conversa será em torno da pandemia”, disse Cantu. “Mas precisamos pensar sobre o que levou às condições que permitiram que certas comunidades ficassem mais vulneráveis em primeiro lugar”, como moradias lotadas, acesso precário à assistência médica e empregos de baixa renda que não permitem licença médica remunerada.
Um estudo separado, publicado como um pré-print em junho, descobriu que a diminuição da expectativa de vida nos EUA ao longo da pandemia foi “altamente racializada” e substancialmente maior em comparação com um conjunto de outros países.
De fato, esse estudo mostrou que a expectativa de vida aumentou ligeiramente entre 2020 e 2021 para o conjunto de 21 nações pares.
Diferenças demográficas
Os novos dados do CDC destacam as diferenças nas tendências de expectativa de vida por raça e etnia, bem como por gênero.
No primeiro ano da pandemia de Covid-19, a expectativa de vida diminuiu menos entre os brancos. No segundo ano da pandemia, no entanto, esse grupo viu o segundo maior declínio na expectativa de vida — e as mortes por Covid-19 contribuíram para a queda entre os brancos mais do que qualquer outro grupo racial ou étnico.
Agora, o grupo mais vacinado, a parcela da população branca que é totalmente imunizada com o esquema vacinal primário fica atrás da população negra, hispânica e asiática, mostram os dados do CDC.
A expectativa de vida em 2021 foi mais alta entre mulheres asiáticas (85,6 anos) e homens asiáticos (81,2 anos), mostram os dados do CDC. As mulheres hispânicas foram o único outro grupo com expectativa de vida superior a 80 anos.
Na população total dos EUA, a expectativa de vida caiu mais entre os homens do que entre as mulheres em 2021, ampliando uma lacuna que vem crescendo na última década.
A disparidade na expectativa de vida entre homens (73,2 anos) e mulheres (79,1 anos) é agora de quase seis anos.
A expectativa de vida dos índios americanos em 2021 era de 61,5 anos, menor do que qualquer outro grupo. Os homens negros tiveram a segunda menor taxa, com 66,7 anos.
Um projeto recente do Instituto de Prevenção se concentrou na saúde mental e no bem-estar de homens e meninos. Descobriu-se que homens e meninos de cor — especialmente homens negros e nativos americanos — “começam com taxas mais altas de trauma e desafios de saúde mental”, disse Cantu, o que pode torná-los mais vulneráveis a outras condições.
“Nos últimos cinco ou seis anos, ouvimos muito mais sobre doenças do ‘desespero’ — como uso de substâncias, alcoolismo e suicídio — e muitas delas estão conectadas”, disse ele. “Isso ajuda a apontar o quão vulneráveis certas comunidades podem ser em muitas outras condições”.
Fonte: CNN Brasil