Mistura de estilos e liberdade de interpretação marcam as obras do artista Cleber Alexsander na mostra Paisagens Imaginárias
Está em cartaz no Centro MariAntonia da USP a mostra Paisagens Imaginárias, do artista plástico Cleber Alexsander. Por meio de uma mistura de estilos, que passa pela xilogravura, pela gravura em metal, pela pintura, pelo estêncil e pelo desenho, o artista representa imagens que opõem o natural ao urbano, mas tendo como característica a liberdade para a interpretação subjetiva de cada um.
A exposição é resultado da tese de doutorado de Alexsander na área de artes plásticas, defendida no dia 18 passado na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, onde também fez mestrado na mesma área. A mostra fica em cartaz até 23 de março.
A cidade e a natureza
Paisagens Imaginárias tem obras em diferentes escalas, algumas delas manuseáveis e com uma grande variedade de tons e estilos. A maior parte também não tem título, exceção feita a 4 Estações, Coisas Frágeis e Night Shadows. Ainda assim, as temáticas de cidade e de natureza se mantêm. A escolha por fazer essas representações parte, segundo Cleber Alexsander, de uma subjetividade dele: “Essa figuração representa os ambientes em que me sinto confortável. Eu vivo desde sempre na cidade grande e tenho uma relação muito próxima com a natureza também”.
Para ele, não faria sentido representar, por exemplo, a praia, que é um lugar de que gosta, mas com o qual não tem tanto contato. “O caos urbano é capaz de despertar uma relação sinestésica e sensorial devido às memórias que eu tenho de cheiros e de sons, por exemplo. E, como eu comecei a fazer essas obras na pandemia, o sentimento de saudade estava ainda mais aflorado. Da mesma forma, a natureza traz a ideia kantiana de sublime, de que quanto mais inóspito é um ambiente menor você se sente.”

O artista Cleber Alexsander – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
O artista reitera, porém, que esse sentimento não é negativo. “Não é um apequenamento que faz você se sentir mal, porque você já parte da ideia de que não tem significância e de que a natureza não se preocupa com você. E isso me encanta muito”, ele diz. Uma obra que representa bem essa ideia é a que ilustra um rosto (Sem Título). Indagado a respeito da parte da exposição — natural ou urbana — à qual o rosto pertence, ele diz que a obra está ligada à parte urbana. “Pessoas são parte da paisagem urbana. Todos os dias cruzamos com várias ‘pessoas sem-rosto’ nas ruas, porque é como se elas fossem parte da paisagem.”

Maioria das obras na exposição não tem nome – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Diferentes estilos artísticos são vistos na mostra – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
O uso de diferentes estilos nas obras — inclusive de forma sobreposta — também está ligado a uma preferência pessoal. “Eu gosto da ideia da gravura, não só pela ideia tradicional da reprodutibilidade da imagem, mas pelo embate que eu tenho com a matéria: eu tenho que aprender a cortar madeira, fazer a matriz e depois as cópias. Tenho que construir esse tipo de diálogo”, explica. Mais do que isso, ele pretende unir o gráfico ao pictórico. “Eu gosto da ideia de construção de imagem por cor, então o pensamento é totalmente pictórico. E os dois, gráfico e pictórico, são livres, porque, para comportar uma matriz, eu não faço nenhum tipo de projeto antes.” Como exemplo, tem-se a obra 4 Estações, que parte da mesma matriz para todas as estações, mas tem a passagem de tempo indicada pela mudança na cor.
Afetos e sensibilidades


Ao analisar a exposição, nota-se uma semelhança entre várias das representações — o que, segundo Alexsander, é intencional. “As obras funcionam como reproduções de uma mesma ideia. No caso das peças referentes à cidade, por exemplo, são cores diferentes, situações diferentes, mas é o mesmo elemento urbano presente em todas elas.” O mesmo acontece com as obras relacionadas com a natureza, em que as montanhas são quase iguais. “Isso tem um porquê muito claro para mim, o mesmo que explica não ter título na maioria das obras ou não ter um texto na parede: se você chega aqui e lê um texto na parede, isso vai induzir seu olhar, vai tirar sua liberdade”, argumenta. Ele cita um exemplo sobre as obras que ilustram montanhas: “Se eu dou o título da obra de Mont Blanc, uma montanha na França, você vai achar que é uma reprodução do Mont Blanc. Se eu não dou título, pode ser qualquer montanha. Pode ser a sua montanha. Assim, a arte demonstra força e valor por si mesma”.
Para o artista, a livre interpretação é um ponto-chave na arte, mas, mais do que isso, pode democratizar a forma como as mensagens são recebidas pelo público. “Isso dá uma fruição entre espectador e obra. E, no mundo em que vivemos, em que muitas pessoas se sentem constrangidas em ir a exposições de arte porque acreditam não ser para elas, ter essa relação confortável com a imagem, que traga as coisas para as suas realidades, criando afetos e sensibilidades, é muito importante.” Cleber Alexsander conta que levou esse pensamento também para a sua tese de doutorado, que não tem citações e aborda seus gostos pessoais e formas de trabalhar. “Um físico, por exemplo, precisa de um modelo mais descritivo para que seu método possa ser replicado. A minha arte não precisa disso. Acho isso fundamental quanto à produção artística em qualquer esfera.”
A exposição Paisagens Imaginárias, de Cleber Alexsander, fica em cartaz até 23 de março, de terça-feira a domingo e feriados, das 10 horas às 18 horas, no Centro MariAntonia da USP (Rua Maria Antônia, 294, Vila Buarque, região central de São Paulo, próximo às estações Higienópolis-Mackenzie e Santa Cecília do metrô). Entrada grátis. Mais informações estão disponíveis no site do Centro MariAntonia.
*Estagiário sob supervisão de Roberto C. G. Castro / Fonte: Jornal da USP / Foto: Cecília Bastos/USP Imagens