Feto sente dor? Especialistas explicam fases do desenvolvimento gestacional

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Com voto favorável de Rosa Weber, julgamento de ação sobre descriminalização do aborto deve retornar em plenário físico, ainda sem data marcada

Depois que a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF)Rosa Weber, votou, no último dia 22, a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez, um pedido de destaque do ministro Luís Roberto Barroso travou o julgamento no plenário virtual e o caso será levado para o plenário físico — ainda sem data estabelecida.

Contrárias ao aborto, antes do início do julgamento, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Frente Parlamentar Mista contra o Aborto e em defesa da Vida, a União dos Juristas Católicos e o Instituto em Defesa da Vida e da Família protocolaram uma petição pedindo o adiamento do julgamento.

Os argumentos dos que criticam a legalização da interrupção da gravidez são vários: questões religiosas, inviolabilidade do direito à vida, além de pontos ligados diretamente ao ser que está sendo gerado, como sua capacidade de sentir dor, por exemplo.

Do outro lado, os grupos que defendem o direito ao aborto costumam apontar para os direitos reprodutivos da mulher, as questões de saúde pública e críticas à ideia da vida desde a concepção.

Assim como do ponto de vista social e moral, o lado científico ligado ao aborto também possui questões dúbias.

Confira o que dizem especialistas sobre alguns dos pontos que envolvem o desenvolvimento fetal:

Feto sente dor?

A discussão sobre a dor fetal é controversa, porque o conhecimento atual não é suficiente para ser preciso sobre o momento em que o feto começaria a sentir dor — ou algo semelhante a essa sensação.

Para iniciar a discussão, porém, é necessário entender como funciona o mecanismo da dor.

“Quando você recebe um estímulo na pele, ele é levado por fibras nervosas para uma região da medula, isso é reconhecido e sobe por fibras, que a gente chama espinhais, para o sistema nervoso lá em cima, nessa região central que é chamada de tálamo. E aí você tem a sensibilidade”, explica o médico Mario Burlacchini, presidente da comissão de Medicina Fetal da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) e professor de Obstetrícia da Faculdade de Medicina da USP.

Isso significa que a sensação de dor está associada ao sistema nervoso. Apesar de a estrutura cerebral estar bastante desenvolvida por volta de 16 semanas, de acordo com o especialista, é necessário mais algum tempo até que o sistema nervoso amadureça.

Segundo o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas, o que sabemos de conclusivo é que, aos menos até 24-25 semanas, o feto não tem capacidade de sentir dor.

“Dor é um mecanismo, um processo multifatorial, que não depende só dos mecanismos neuronais biológicos. Então o fato de, por exemplo, um feto de 12 semanas reagir com movimento a um estímulo não significa que ele tem dor. Significa que ele tem terminação nervosa que transmite a informação daquele contato para o cérebro”, afirma a médica ginecologista e obstetra Helena Paro, coordenadora-geral do Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia.

Segundo Helena, a partir de semanas mais avançadas da gestação, o que temos são teorias. “Mesmo porque fetos anencéfalos [que não têm cérebro] vão apresentar as mesmas reações de fetos com cérebro desenvolvido até o final da gravidez, em relação à pesquisa de estímulos dolorosos”, pondera a especialista.

O que significam as datas limites para o aborto?

Os países que descriminalizaram o aborto usam datas diferentes como limite para que o procedimento seja realizado. No caso do Brasil, a discussão atual é para que a interrupção da gestação seja legal até 12 semanas.

De acordo com a médica ginecologista, o prazo limite para a interrupção da gravidez não tem relação com os marcos de desenvolvimento, mas podem ter a ver com alguma “estratégia de negociação”.

“É um critério arbitrário, não tem embasamento nas ciências da saúde. É um critério jurídico”, afirma.

Já Burlacchini elenca alguns dos pontos que podem ser levados em conta. Segundo o especialista, o procedimento é mais simples, no âmbito médico, quanto mais cedo for a gestação.

“Você tem uma resposta à eliminação do produto do abortamento de forma mais fácil, então é menos traumático para mulher, do ponto de vista mais biológico. Ela vai ter uma resposta e uma recuperação mais rápida.”

Além disso, também há a questão psicológica, na avaliação do médico. Quanto mais avançada for a gravidez, “provavelmente, deve ser muito pior. Talvez essa vivência da gestação ainda seja menor no início da gravidez do que quando você já está com uma gestação mais avançada”.

Helena ressalta, porém, que, quando o procedimento é realizado de maneira adequada, seguindo as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) “em qualquer tempo gestacional, o aborto é um procedimento muito seguro para a vida da pessoa gestante”.

Sobre as tais 12 semanas de gestação, o ultrassonografista Carlos Reinaldo, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco, afirma que se trata do “começo da maturidade neurológica. A gravidez é dividida em período embrionário, que é até dez semanas, e período fetal, que é de dez semanas e um dia para a frente. Então 12 semanas está muito perto do período embrionário, de formação”.

Em outros países, o médico afirma que o peso fetal também costuma ser um critério para estabelecer esse limite da interrupção. “Em torno de 500 a 600 gramas, que é em torno de 22 a 23 semanas”, diz Reinaldo sobre o que costuma ser adotado como prazo máximo para o aborto.

Quando começa a vida?

Outro ponto que também suscita discussão é o momento em que a vida começa.

O professor explica que diferentes critérios, além da fecundação, poderiam ser vistos como marcos importantes da vida.

“Estar vivo envolve vários conceitos. Do ponto de vista jurídico, por exemplo, se você aborta até 19 semanas, você não teve filho [uma vez que não há indicação para emissão da Declaração de Óbito]. Agora, se o aborto ocorreu quando o feto tinha mais de 500 gramas e acima de 20 semanas de gestação, legalmente, você teve o nascimento de um filho morto”, afirma.

Outro momento que poderia ser considerado um marco, segundo Burlacchini, é o início dos batimentos cardíacos. “A partir de seis semanas de gravidez você tem um coração batendo no embrião. Um bebê com 2 mm, em geral, você já vê um coração batendo.”

Além desses, também há o começo da atividade cerebral. “Tem trabalho que mostra que já tem algum tipo de reflexo a partir do segundo mês da gestação”, explica o especialista.

Já Helena afirma que, embora do ponto de vista biológico a vida esteja relacionada à qualquer unidade celular que se reproduza, os direitos não devem ser associados a tal critério.

“Se a gente pegar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, toda pessoa nasce igual em direitos e deveres. É preciso ter um nascimento com vida para ter direitos. E nunca um feto pode ter mais direitos do que uma pessoa com uma biografia e não só uma vida biológica”, defende a médica.

*Publicado por Renata Souza

Fonte: CNN Brasil

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