Alexandre Padilha quer saber o que o Ministério da Saúde pretende fazer para evitar que o hospital que é referência no tratamento do câncer feche as portas aos pacientes do SUS em dezembro
O ex-ministro da Saúde e deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) protocolou na segunda-feira (15) pedido de informações sobre a saída do Hospital A.C. Camargo da rede conveniada do Sistema Único de Saúde (SUS) no tratamento de pacientes de câncer. O parlamentar quer saber o que o Ministério da Saúde fez e pretende fazer para evitar que o hospital que é referência e um dos maiores centros de tratamento do câncer no Brasil feche as portas aos pacientes da saúde pública .
Outro questionamento é sobre os motivos técnicos que levaram a pasta a recusar a inclusão do hospital no Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS). Trata-se de uma aliança entre seis hospitais de referência no Brasil e o Ministério da Saúde para apoiar e aprimorar o SUS por meio de projetos de capacitação de recursos humanos, pesquisa, avaliação e incorporação de tecnologias, gestão e assistência especializada demandados pelo SUS.
Segundo reportagem publicada hoje pelo jornal Folha de S.Paulo, os pacientes do SUS deixarão de ser atendidos pelo A.C. Camargo a partir de dezembro. Atualmente, mais de 3 mil pessoas aguardam vaga para atendimento nos Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacons), reguladas pela plataforma Cross, uma central de regulação de serviços de saúde.
O principal motivo para a saída do A.C. Camargo da rede SUS, segundo o jornal, é a defasagem da tabela paga pelo Ministério da Saúde para consultas, procedimentos e cirurgias. Assim, todos os anos o hospital tem de aportar recursos próprios para cobrir as despesas na área de oncologia e também de diálise, que enfrenta problema semelhante. Em 2021, a receita via SUS foi de R$ 36 milhões, mas o hospital teve que injetar mais R$ 98,46 milhões, oriundos do atendimento privado.
Governo desmonta o SUS
Questionado pelo jornal sobre a defasagem, o Ministério da Saúde transferiu a responsabilidade para o estado e municípios, dizendo que “a tabela não constitui a principal e nem a única forma de financiamento do SUS”. E que “os valores são referenciais mínimos, podendo ser complementados pelos gestores estaduais e municipais, de acordo com as demandas e necessidades de cada território”.
A Secretaria Municipal de Saúde disse ao jornal que vem se reunindo com a Fundação Antonio Prudente para avaliar a possibilidade da continuidade da assistência por meio da parceria. E que a assistência em oncologia aos pacientes da rede municipal continuará por meio dos demais prestadores municipais, como o Hospital Municipal Dr. Gilson de Cássia Marques Carvalho – Vila Santa Catarina, entre outras unidades reguladas pela Cross.
“O mesmo presidente da República, de um governo envolvido em suspeita de mais de mais de R$ 100 milhões em irregularidades em hospitais federais no Rio de Janeiro, comandados pelos seus aliados, vira as costas diante do fechamento para o SUS de um dos mais importantes hospitais para o tratamento de câncer do país”, disse.
O ex-ministro Padilha lembrou que o governo Bolsonaro acabou com o Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (Pronon), criado em 2012, para incentivar ações e serviços de prevenção ao câncer em entidades, associações e fundações privadas sem fins lucrativos que atuam no campo da oncologia.
“O fim do Pronon e a postura irresponsável do governo Bolsonaro de ocupar os investimentos da saúde pelo chamado orçamento secreto está causando um desmonte em cadeia SUS, com fechamento de serviços de tratamentos como o do câncer, entre outras especialidades. O Brasil precisa virar essa página para recriar o Pronon pleno e voltar a fortalecer o SUS e investir na saúde.”
A.C. Camargo já transferiu pacientes
Segundo a reportagem, cerca de 1.500 dos 6.500 pacientes do SUS em tratamento no A.C. Camargo já foram transferidos pela Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo para centros oncológicos da capital. Outros 5 mil devem ser encaminhados até dezembro, segundo o hospital.
A instituição vinha reduzindo nos últimos anos o número de novos pacientes atendidos pelo SUS. Em 2017, por exemplo, foram 1.500. Em 2022, apenas 96. Já pela porta privada, ingressaram quase 7 mil novos pacientes neste ano. No total, cerca de 230 mil são atendidos anualmente. Até 2017, o A.C. Camargo mantinha com a prefeitura de São Paulo um contrato com duração de cinco anos, que previa que 60% dos seus atendimentos fossem dedicados ao SUS.
O presidente do A.C. Camargo, Victor Piana de Andrade, disse à Folha que, com a tabela SUS cada vez mais defasada e o aumento da procura pelos planos de saúde, a instituição optou em 2018 por um novo modelo de contrato, que lhe permitiu ajustar anualmente o percentual de atendimentos SUS conforme a demanda privada.
O acordo teve aval do Ministério Público, mas nem assim as contas fecharam.”Eu tenho a responsabilidade de fazer uma boa gestão dos recursos, de garantir o equilíbrio das contas. A oncologia é cara, a inflação médica é mais alta do que a inflação comum e, com a tabela SUS fixa há 14 anos, e com os custos crescentes, eu não posso trazer esse risco para a instituição.” Segundo ele, o SUS paga R$ 10 por uma consulta médica, enquanto os convênios, em média, R$ 100. Os valores das sessões de quimioterapia e radioterapia reembolsados pelo SUS são 94% e 71%, respectivamente, inferiores aos pagos pelos planos de saúde.
Fonte: RBA