Por enquanto, as aulas ainda serão remotas. Iniciaram-se ontem (28). Em casa, à frente do notebook ou pelo celular, o jovem Matheus de Araújo Moreira Silva, de 26 anos, não vê a hora de colocar os pés no campus da Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), em Santo Antônio de Jesus, onde foi selecionado para cursar Medicina, com uma concorrência de 300 candidatos para uma vaga.
Neste ano, o estudante negro, de família humilde, fruto da escola pública, realizou a prova do Enem 2020 e tirou 980 na redação, quase a nota máxima, que é de mil pontos na prova. No geral, ele fez 708 pontos. Para Matheus, que mora no bairro Viveiros, todo o esforço e renúncia valeram a pena durante os quatro anos em que deixou de sair com os amigos, ir a festas, viajar, para ir em busca dos seus objetivos de estudar e um dia se tornar médico.
“Eu nem acreditei realmente, foi um processo seletivo cheio de etapas, e quando eu vi meu nome na lista e vi que o tempo de estudo que eu tive se realizou, só tenho gratidão. Foi surreal pra mim e pra minha família ver o meu sonho de anos se realizando”, contou o estudante em entrevista ao Acorda Cidade.
No dia 6 de abril deste ano, Matheus já havia conversado com a reportagem do Acorda Cidade, e contou como se deu a sua rotina de estudos antes de alcançar a nota do Enem. Com o fechamento das bibliotecas, após o início da pandemia, Matheus ficou sem ter onde estudar e se concentrar para as provas.
Em casa, era muito difícil, com a presença dos irmãos menores. Ele então optou por utilizar a casa de uma amiga, um imóvel vazio no mesmo bairro onde mora. O local não tinha energia elétrica, apenas água encanada. O jovem tentava aproveitar ao máximo a claridade até as 17h, e quando queria esticar o horário de estudo, ligava a lanterna até por volta das 19h.
“Peguei uma mesa e uma cadeira, assinei um pacote de internet e ficava lá estudando até 17 horas, porque escurecia e tinha que voltar para casa, mas de vez em quando eu ligava a lanterna e ficava até as 19h”, revelou Matheus ao Acorda Cidade à época.
Agora, o jovem celebra a vitória e lembra o que serviu de inspiração para que ele superasse todos esses desafios.“Eu tenho um irmão que é especial, teve sequelas da meningite meningocócica e era minha fonte de inspiração. Quando eu pensava em desistir, olhava para ele e isso me dava força.”
Segundo Matheus, o primeiro dia de aula o deixou com um frio na barriga. Ele sabe que de agora em diante terá que se esforçar para permanecer no curso. O desafio é economizar, juntar dinheiro, para quando as aulas retornarem de modo presencial, ele ter condições de residir em Santo Antônio de Jesus.
Nova rotina
“Estou tentando me adaptar à nova rotina. A questão financeira é o que está pesando mais, as aulas começaram ontem, dia 28, e o primeiro semestre termina em outubro. Em novembro ou em janeiro, vou ter que mudar para o pólo da faculdade, então vou precisar de recursos. Teve a aprovação e agora tem o pós, que é o que eu vou fazer para conseguir me manter na cidade. O custo é alto, vou ter que pagar aluguel. A faculdade até oferece auxílio, mas demora bastante”, explicou.
Para diminuir os custos, Matheus planeja recorrer a livros em PDF e materiais na internet, porém há outros materiais que ele vai precisar comprar. Além disso, haverá as despesas em breve com moradia, alimentação e transporte. O jovem está estagiando pela manhã e analisa como adequar a atual rotina de estudos com o trabalho pra continuar se mantendo e ao mesmo tempo economizar.
Ele contou que após sua história ser contada nos meios de comunicação, entre eles o Acorda Cidade, muita gente já o ajudou e ele conseguiu um novo notebook, impressora e notebooks para os irmãos, como também um armário para organizar os livros, sua paixão. Com a fama, conquistou ainda o reconhecimento de outros estudantes, que sempre o procuram para obter orientações.
Atualmente Matheus mora com um irmão, em uma casa construída pelo pai, que é pedreiro. E para sempre se lembrar da sua trajetória de luta, na parede, ele pendurou três quadros com as palavras ‘Sonhe, acredite, conquiste’. Mas olhando depois, ele percebe que uma palavra ficou de fora.
“Faltou colocar ali a ‘fé’, pois sem ela a gente não é nada. São palavras que a gente tem que ter, principalmente com essa pandemia, devido às dificuldades. Uma pessoa sem sonhos é uma pessoa vazia”, refletiu.
Para auxiliar o estudante Matheus de Araújo Moreira Silva a seguir adiante nos estudos, a comunidade pode realizar doações através da chave do Pix 75 982453570 ou da vaquinha virtual criada pelo jovem na internet. Basta acessar o link vaka.me/2065919.
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade