Legislação sobre instalação de antenas representa um entrave para o 5G no país

justiça

Por Rafa Santos – Segunda, 29 de março de 2021

De acordo com o Conjur, a  legislação sobre telecomunicações é de competência da União. Contudo, municípios e estados têm normas conflitantes com o regramento federal. Esse nó jurídico pode afetar diretamente a implementação da tecnologia 5G no país.

Apesar dos problemas, a Anatel aprovou edital que determina que até julho de 2022 todas as capitais brasileiras devem ser atendidas pela tecnologia 5G. Para que isso ocorra, a legislação em torno de antenas terá que ser uniformizada.

Isso ocorre porque a rede de 5G é composta por até três tipos de frequência que exigem, cada uma, um tipo específico de antena. A instalação de um número muito maior de antenas — em relação às tecnologia anteriores — portanto, é premissa para implementação da novidade.

A Lei das Antenas (Lei 13.116/2015) estabelece normas gerais para implantação e compartilhamento da infraestrutura de telecomunicações. Conforme a normativa, o licenciamento para instalação de antenas deve se dar de forma simplificada e em um prazo de 60 dias de forma integrada entre todos os órgãos públicos envolvidos.

“Isso não acontece na prática. Na cidade de São Paulo, por exemplo, a média de resposta da prefeitura ultrapassa um ano. E essa resposta muitas vezes é uma exigência inócua”, explica Grazziano M. Figueiredo Ceará, advogado especialista na área e sócio do escritório Valfredo Bessa e Grazziano Advogados.

Ele explica que, sob o pretexto de legislar em temas como meio ambiente e saúde, municípios e estados acabam entrando no âmbito de competência exclusivo da União. “Em relação aos estados, essa invasão de competência costuma se dar por meio de leis sobre saúde. Os estados querem regulamentar o limite de exposição humana aos equipamentos de telecomunicação sob a alegação de que isso causa risco à saúde humana. Muitas vezes essas leis inviabilizam a atividade de comunicação”, explica.

Esse conflito de competências gerou uma série de ações judiciais que começam a dar resultado. Grazziano aponta como um leading case a ADI 3.110, que discutiu uma lei de São Paulo que impõe limites de exposição de ondas eletromagnéticas.

Trata-se da lei estadual 10.995/2001, de São Paulo. Na ocasião, o Plenário do STF acompanhou por unanimidade o entendimento do relator, ministro Edson Fachin, no sentido de que a existência de norma federal expressa sobre o assunto afasta a competência concorrente dos estados. A seu ver, a lei estadual viola o princípio da subsidiariedade, pois a Lei Geral das Telecomunicações (Lei 9.472/1997) atribui à Anatel a definição de limites para a tolerância da radiação emitida por antenas transmissoras.

O ministro lembrou ainda que, na Lei 11.934/2009, a União fixou limites proporcionalmente adequados (segundo precedentes do STF no RE 586.224 e na ADI 4.060) à exposição humana a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos. Esses limites, que seguem expressamente as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Comissão Internacional de Proteção Contra Radiação Não Ionizante (ICNIRP), estão associados ao funcionamento de estações transmissoras de radiocomunicação, de terminais de usuário e de sistemas de energia elétrica nas faixas de frequências até 300 GHz, visando garantir a proteção da saúde e do meio ambiente.

O julgamento da ADI 3.110 serviu para fundamentar decisões de casos similares no STF e a jurisprudência da Corte Suprema é a de que a competência constitucional dos municípios e do Distrito Federal para legislar sobre interesse local não os autoriza a estabelecer normas que tratem de matérias que a própria Constituição atribui à União.

Corrida pelo 5G
Apesar do desafio imposto por conflitos de competência, Graziano aponta que já existem municípios que fizeram um esforço legislativo para viabilizar a implantação do 5G.

Um dos bons exemplos citados por ele é o de Porto Alegre. Para o advogado, a capital gaúcha tem um dos ordenamentos jurídicos mais modernos do país sobre o tema. “O município dialogou muito com o setor e gerou um ambiente de segurança jurídica que possibilita que o investimento seja feito na cidade. É um exemplo do que se chama de ‘cidades inteligentes’, que nada mais são do que municípios preparados para receber novas tecnologias”, explica.

Cidades do ABC paulista já têm se reunido com o setor para criar o ambiente jurídico para implantação da tecnologia. “A importância do 5G é muito grande ainda mais no contexto da pandemia. As cidades que se prepararem para receber a tecnologia vão sair na frente para atrair investimentos”, sustenta.

A Suécia é um dos países onde a tecnologia está mais disseminada na Europa
Divulgação

Apesar dos bons precedentes jurídicos, será necessário esforço estrutural para superar o gargalo atual e viabilizar o 5G. O engenheiro especializado em regulação de telecomunicação e presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura para as Telecomunicações (Abrintel), Luciano Stutz, explica que as restrições impostas por leis estaduais e municipais já deixa a tecnologia 4G defasada. “Quando se fala de 5G, então, o desafio é muito maior. Por conta da frequência empregada, precisaremos de cinco vezes mais antenas do que na 4G. A tecnologia 5G demanda a instalação de antenas menores do que uma caixa de sapato. Serão instaladas em fachadas de prédios, em bancas de jornal e no mobiliário urbano, como se vê em cidades europeias e norte-americanas”, afirma.

Stutz explica que é possível implantar o 5G com a infraestrutura atual, mas a tecnologia estará longe de ser ofertada em todo o seu potencial. A expectativa do setor é que grandes centros urbanos como São Paulo e Rio de Janeiro devem receber primeiro a tecnologia.

A Abrintel tem prestado consultoria para municípios que desejem atualizar sua legislação sobre o tema. “Propomos um projeto de lei padrão formatado com ajuda da Anatel que é muito equilibrado e que não tem apenas o viés empresarial e aborda também toda questão urbanística”, explica.

Apesar do gargalo, Stutz afirma que o setor está preparado para atender a demanda. “O modelo implantado no Brasil é o ideal porque determina menos preço de frequência, ou seja, menos dinheiro do tesouro e mais compromisso de abrangência. A política pública em âmbito federal para o setor dialoga muito bem com investimentos e permite que todos os municípios brasileiros já estejam cobertos por alguma tecnologia”, sustenta.

Por fim, Stutz lembra que existe um item no edital da Anatel que permite que as operadoras priorizem cidades que já tiverem modernizado sua legislação municipal. “Existe uma oportunidade aí para prefeitos. Se eles modernizarem a legislação vão sair na frente. O que vai determinar a qualidade do 5G é a quantidade de antenas. Cidades que facilitarem isso poderão ter acesso às possibilidades mais modernas do 5G como o carro autônomo”, explica. 

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