Uma decisão do Senado Federal da última quarta-feira (4), publicada junto ao projeto de lei de 136/2023, permite que o governo federal não cumpra as exigências de pagar o piso da Saúde para 2023. Ou seja, prevê que o gasto com o setor passe a integrar o valor do mínimo.
Felipe Salto, economista-chefe da Warren Rena, diz que essa decisão resolveria uma parte da questão fiscal do país, mas afirma que não é uma saída trivial.
“A base para usar a receita corrente líquida efetivamente observada é da própria Constituição Federal“, ressalta.
Outra saída que o governo pode obter, segundo Salto, é junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), a quem foi lançada uma consulta pública.
“Como se sabe, para avaliar se seria possível iniciar a aplicação da regra do mínimo (anterior à regra do teto de gastos, mas que voltou a vigorar com a LC 200, a lei do arcabouço) aconteceria apenas em 2024.”
O executivo consultou o TCU sobre a possibilidade de não cumprir o piso Constitucional.
Parte das justificativas do governo para não cumprir a regra é seu impacto nas contas públicas. Caso respeitado o piso, o governo terá gasto extra de R$ 20 bilhões — um empecilho extra na tentativa do governo de ajustar o fiscal.
O presidente do TCU, Bruno Dantas, afirmou em evento nesta quinta-feira (5) que a consulta do Ministério da Fazenda sobre o deve ser avaliada em até 15 dias.
Respiro fiscal X insegurança jurídica
Para Salto, o projeto não desobriga o cumprimento do mínimo, mas altera a receita corrente líquida utilizada. Isto é, passando da receita efetivamente observada, ao longo do ano, para a receita estimada no projeto de lei orçamentária.
“Com isso, o efeito fiscal, ou seja, o aumento de gastos em 2023, seria de R$ 5 a R$ 7 bilhões, a nosso ver. Esse resultado caberia nas condições e regras fiscais deste ano, possivelmente trocando-se a fonte de recursos do financiamento do piso da enfermagem (hoje o fundo social), para que este gasto passasse a integrar o valor do mínimo da Saúde.”
Na visão do economista e especialista em contas públicas, Murilo Viana, ao procurar o TCU, o governo tenta se defender da possibilidade de as manobras para contornar a regra serem apontadas como inconstitucionais no futuro.
“Uma decisão favorável do TCU representaria maior segurança para o governo e para os CPFs que assinam os documentos do governo”, explica.
Contudo, o especialista destaca que o não cumprimento do piso pode representar insegurança jurídica. Isso porque, na prática, a regra de um projeto de lei complementar estaria se sobrepondo a uma regra constitucional.
Murilo Viana alerta que este tipo de movimento pode abrir precedente para o não cumprimento dos pisos em exercícios futuros.
Impacto nas contas públicas
O projeto aprovado pelo Senado basicamente permite que o governo pague o piso com base na receita estimada pelo Orçamento de 2023. A cifra prevista na peça está abaixo da realizada.
Enviado à sanção presidencial, a regra que consta no projeto resultaria em gasto adicional de R$ 5 bilhões, segundo cálculos do governo.
A autoridade do TCU afirmou que a aprovação do projeto não interrompe a análise do órgão. “Se houver necessidade de qualquer complementação, os auditores informarão ao relator”, disse.
Com isso, há três cenários possíveis: não cumprimento do piso, com impacto fiscal zero; cumprimento do piso com base na Receita Corrente Liquida (RCL) prevista, com impacto de R$ 5 bilhões; e cumprimento com base na receita efetivamente realizada, com impacto de R$ 20 bilhões.
O projeto de lei no qual o dispositivo foi incluso dispõe sobre a compensação aos estados e ao Distrito Federal pela perda de receita provocada pela redução do ICMS incidente sobre combustíveis, que funcionou entre junho e dezembro de 2022.
*Com informações de Danilo Moliterno/ CNN Brasil