Marcelo Pedroso comenta a repercussão do seu documentário “Por trás da linha de escudos”

cultura

Por Iyalê Tahyrine

Obra foi lançada inicialmente em 2017, mas ganhou nova versão neste ano e está sendo relançado com debates públicos

O realizador audiovisual Marcelo Pedroso apresentou pela primeira vez o longa Por trás da linha de escudos, em 2017, nos festivais de cinema de Cachoeira (BA) e Brasília (DF). Nessas ocasiões, o documentário foi recebido pelo público de forma crítica, levando a equipe realizadora a retirar o título de circulação. “Diante do momento histórico que estávamos vivendo, nos pareceu impossível continuar veiculando aquele filme”, ponderou o diretor e roteirista em narração no início da versão inédita, trabalhada durante os últimos cinco anos. 

O longa de Pedroso teve como ponto de partida os embates entre a Pollícia Militar de Pernambuco e os ativistas do Movimento Ocupe Estelita (MOE). O movimento iniciou em 2012, e a reintegração de posse do terreno aconteceu em junho de 2014 no cais da capital pernambucana. O uso de força naquele episódio, utilizando as armas tradicionais ficaram marcados na história da militância pelo direito à cidade no Recife. 

Ao abordar a questão da segurança pública no Brasil, o documentário assume uma postura crítica sobre o caráter militar da polícia e foi sobre o processo de reflexão na nova edição e a recepção do público no relançamento que o Brasil de Fato conversou com Marcelo Pedroso. Confira: 

Brasil de Fato Pernambuco: Marcelo, como começou sua trajetória no cinema, sendo documentarista? 

Marcelo Pedroso: Eu sou realizador audiovisual, né? Fiz faculdade de comunicação 20 anos atrás e na faculdade a gente montou um cineclube.  Minha vocação era ser jornalista na época, eu estava estudando para trabalhar no jornal impresso, mas quando eu entrei no Cineclube conheci as pessoas, a gente fundou um coletivo e aí eu comecei a me envolver mais com cinema. 

Fiquei trabalhando por um tempo ainda depois que eu me formei no jornalismo impresso na mídia corporativa, mas continuava exercendo as atividades de audiovisual e fui me afastando do jornalismo até que passei a me dedicar exclusivamente  ao audiovisual, então dirigi alguns curtas, acho que uns seis longas metragens também, a maioria são documentários, mas tem também filmes de ficção e são filmes que tem uma reflexão política e social sobre o Brasil.

BdF PE: O seu longa documental “Por trás da linha de escudos” foi lançado inicialmente em 2017 e está sendo relançado agora nesse ano de 2023. O que foi que aconteceu nesse período e o que mudou de 2017 para cá?

Marcelo Pedroso: Quando o filme foi lançado em 2017 no festival de Cachoeira e de Brasília, ele sofreu muitas críticas e a gente entendeu que tinha uma sensação de uma ambiguidade no filme, que não dava pra ver exatamente um posicionamento crítico nosso frente a polícia então a gente resolveu recolher o filme. 

Aproveitamos a oportunidade para fazer uma autocrítica e fazer um aprofundamento da pesquisa, e ao longo desse período, surgiu também a ideia por meio de Ernesto de Carvalho, o qual é o montador do filme de fazer uma revisão do corte, então a gente entrou no processo de remontagem. Passamos esses últimos anos trabalhando nisso. Aí estamos chegando agora no cinema com uma nova versão do filme, onde a gente acredita ter conseguido erradicar aquela sensação de ambiguidade que tinha naquela primeira versão. E com isso ter um filme mais propositivo.

Então nesse período também no plano político tivemos a deposição de Dilma, o golpe, o governo de Jair Bolsonaro. Era um momento em que o filme estava amadurecendo suas perspectivas, compreendendo um pouco melhor, eu acho, a condição do país que a gente tá passando e também esmerando um pouco mais esse gesto que o filme tenta fazer que é de falar sobre a segurança pública, falar sobre a polícia militar, mas não excluindo os policiais militares do debate, buscando interpelá-los, buscando trazer junto e compreendê-los enquanto a gente ativos, sujeito de direitos que precisam estar envolvidos também nesse debate. 

Então esse é o grande desafio do filme. Conseguir fazer essa interpelação, ter o posicionamento crítico, mas, ao mesmo tempo, preservar a possibilidade do policial estar engajado e refletir sobre as questões que a gente tá levantando.

Você tem feito esse relançamento, fazendo debates, como é que tem sido a recepção do filme nesse novo momento?

Tivemos a estreia em Recife, Fortaleza e em Maceió, eu só pude estar presente na estreia de Recife. Foi um debate muito bom, eu achei um debate muito propositivo, onde a gente conseguiu abordar os temas de segurança pública, da desigualdade social, da luta por direitos, do racismo com a reflexividade muito assertiva, bem perspectivada também. 

A partir de agora o filme vai ser lançado em outras cidades e capitais brasileiras. A gente pretende chegar ao Sudeste, chegar ao Centro-Oeste, Norte, enfim, compreender todas as regiões do país, mas a gente ainda está iniciando essa trajetória. Então por enquanto a gente tem uma primeira situação de estreia com debate muito propositivo, dando uma reflexão sobre os temas que a gente tá querendo puxar para conversa.

Quais são as suas expectativas em relação ao fomento ao cinema nacional nesse novo governo?

A categoria do audiovisual ela sofreu bastante, como várias outras categorias de trabalhadores e trabalhadoras, a gente como representantes da cultura sofreu muitos ataques nos últimos anos. Teve um desmonte, houve uma perseguição, houve censura, enfim todo um quadro desfavorável à nossa atividade. 

Então as pessoas que permaneceram, porque muitas infelizmente tiveram que procurar outras alternativas para suas vidas, mas as pessoas que permaneceram levantaram essa bandeira da resistência e chegam no momento muito cansadas, mas ao mesmo tempo esperançosas de que tenhamos uma política pública referendada socialmente democratizante,  que a gente possa retomar os mecanismos de financiamento e de democratização, compreendendo a importância de descentralizar os recursos, de não concentrar os recursos em certas categorias de sujeitos que historicamente são privilegiados para o acesso.

É preciso que a política seja retomada a partir do ponto que ela foi interrompida durante o golpe em 2016, mas visando um Horizonte de expansão e de ampliação do caráter democrático da distribuição dos recursos. Então a gente tá muito esperançoso e seguimos engajados nessa nessa luta esperando que a gente consiga retomar uma produção mais regular, mais consistente e com condições de trabalho menos precarizadas do que a gente está vivenciando nos últimos anos

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Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vanessa Gonzaga

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