A morte do chefe da milícia Wagner e de dois dos seus líderes, na última quarta-feira (23), foi um golpe duro para o grupo paramilitar, embora o modelo, indiretamente ligado ao Estado russo, deva sobreviver.
Yevgueni Prigozhin, seu braço direito, Dmitri Utkin, e o comandante operacional do grupo, Valery Chekalov, morreram na quarta-feira quando o avião em que viajavam caiu perto de Moscou.
Desde então, os movimentos russos de extrema direita próximos ao setor militar lamentam o fim do grupo, disse o analista Lucas Webber, co-fundador da rede Militant Wire.
“Eles descrevem uma elite política e militar decadente, corrupta e desconectada da realidade do front. Prigozhin, por outro lado, era considerado um personagem corajoso que não tinha medo de criticar a hierarquia militar e visitava frequentemente seus homens em combate”, explicou à AFP.
Em 24 de junho, Prigozhin rebelou-se contra o Estado-Maior e o ministro da Defesa, Serguei Shoigu. Ele tomou quartéis no sul da Rússia e marchou com suas tropas em direção a Moscou.
Durante o motim, o presidente russo, Vladimir Putin, não escondeu sua raiva e acusou o seu antigo aliado de “traição”.
A morte de Prigozhin deixa Putin livre para repensar a estrutura deste império paralelo, que provavelmente pagou o preço por ter acreditado ser mais forte do que era. E do setor de grupos militares privados russos (SMP).
– “Um único homem” –
“Uma lição que Putin provavelmente aprendeu com os motins de junho é o perigo de dar tanto poder e responsabilidade (…) a um único homem”, escreveu a especialista em mercenários Catrina Doxsee, do think tank CSIS em Washington.
“Embora a Rússia tente manter o modelo dos SMP para a sua política externa e sua assistência à segurança, o mercado provavelmente se diversificará” para evitar o surgimento de um novo Prigozhin, acrescentou. Já existem vários grupos na lista, como Redut, Convoy e Patriot.
“Para que isso funcione, é necessária uma série de parâmetros. Entre eles, ter o ouvido e a capacidade financeira de Putin, e ter uma ferramenta de influência”, resume Lou Osborn, da ONG All Eyes on Wagner e co-autora de um livro sobre o grupo.
Estes grupos “têm muito menos presença e são menos treinados que Wagner, mas seguem a mesma estrutura”, especifica.
A pesquisadora já notou a chegada de outros grupos de dissidentes de Wagner e os laços estreitos que mantêm com o GRU, o serviço de inteligência militar russo.
Assim como aconteceu com Wagner, o Kremlin poderia atuar em um jogo duplo. Por um lado, controlar e apoiar esses grupos. Por outro, manter uma distância suficiente para não ter que responder por cada uma das suas ações, especialmente na África.
“É provável que o Estado russo exerça um controle mais direto sobre os SMP em países estrangeiros, sem admitir plenamente que estão sob a autoridade direta do Kremlin”, explica Aditya Pareek, do Instituto de Inteligência Privada Janes, do Reino Unido.
– Conquistas na Ucrânia –
O desmantelamento da milícia Wagner, por enquanto, está envolto em incertezas.
O procedimento poderia incluir “um novo nome e as empresas na órbita de Wagner poderiam ser divididas em entidades separadas”, segundo Catrina Doxsee.
Também poderiam ser nacionalizadas ou mantidas como organizações quase independentes, acrescentou.
A lealdade do Kremlin não será mais negociável. O acidente de quarta-feira à noite “é uma mensagem muito clara: ‘não me ultrapassem, é uma questão de sobrevivência’”, afirma Lou Osborn.
Ao mesmo tempo, Moscou não pode prescindir de uma ferramenta como essa, que provou o seu valor ao longo dos anos na África, no Oriente Médio e também na Ucrânia, invadida por Moscou em fevereiro de 2022.
“As últimas conquistas táticas na Ucrânia foram obra do grupo Wagner”, lembra Maxime Audinet, do Instituto de Pesquisa da Escola Militar (IRSEM) de Paris.
Fonte: Isto é