O que realmente diz a ‘bula da Pfizer’, que Bolsonaro disse ter lido para decidir não se vacinar

Brasil

Após a operação da Polícia Federal que investiga a suposta emissão de certificados falsos de vacinação contra a covid-19, Jair Bolsonaro (PL) declarou que “leu a bula da Pfizer e decidiu não tomar a vacina”.

O argumento foi repetido horas depois pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente. Ele escreveu no Twitter: “[Jair] Bolsonaro sempre disse que não tomou vacina porque leu a bula da Pfizer”.

Mas, afinal, o que está escrito na bula da vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Pfizer? E onde é possível encontrar esse documento?

As bulas de todas as vacinas e medicamentos estão disponíveis para qualquer pessoa no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa.

As farmacêuticas responsáveis pelo produto também costumam manter uma cópia do arquivo em sites institucionais.

No caso específico das vacinas contra a covid-19, a Anvisa também criou um site especial onde é possível baixar e ler o descritivo de todas as doses aprovadas no Brasil.

Portanto, além da bula da Pfizer, a página online também traz informações sobre os imunizantes CoronaVac, da AstraZeneca e da Janssen.

Ainda segundo a Anvisa, a bula “é um documento legal sanitário que serve para obter informações e orientações sobre medicamentos”, e são “necessárias para uso seguro e tratamento eficaz”.

Há dois tipos de bulas regulamentadas hoje no Brasil: uma versão para pacientes, que traz termos mais acessíveis e informações resumidas, e outra para profissionais de saúde, que reúne dados técnicos e detalhes mais complexos.

O que tem na ‘bula da Pfizer’?

A primeira informação disponível nesse documento detalha as três versões disponíveis da vacina desenvolvida pela farmacêutica, cujo nome comercial é Comirnaty:

  • Ampola roxa: destinada a todos os indivíduos com mais de 12 anos;
  • Ampola laranja: para crianças de 5 a 11 anos;
  • Ampola vermelha: para crianças de 6 meses a 5 anos.

Na sequência, a bula fala sobre a composição do produto. Segundo os fabricantes, cada dose proveniente da ampola roxa, destinada a adolescentes e adultos, contém 30 µg (microgramas) da vacina. Nas demais, essa quantidade diminui: 10 µg na ampola laranja e 3 µg na vermelha.

A tecnologia usada neste imunizante é a do mRNA. Em resumo, ele traz informações genéticas que instruem as próprias células do nosso corpo a fabricar a proteína S (de Spike, ou espícula em português), que aparece na superfície do coronavírus. Daí o sistema imune reconhece essa molécula e gera uma resposta, capaz de proteger contra o patógeno causador da covid-19.

A próxima seção do documento resume as informações mais relevantes a quem receberá a dose. Os fabricantes explicam para quê esta vacina é usada, como ela funciona, quando é contra-indicada, o que saber antes de tomar…

Ali também estão as orientações sobre a manutenção, a refrigeração e a diluição das doses — algo que é cuidado de perto pelos profissionais da saúde que trabalham nos postos de vacinação.

Depois, aparecem os detalhes sobre o esquema vacinal: a princípio, duas doses com um intervalo recomendado de 21 dias entre elas, com a possibilidade de um reforço após alguns meses.

Efeitos colaterais da vacina da Pfizer

O ponto que gera maior atenção é respondido na oitava questão da bula desta vacina: quais os males que este produto pode causar?

A farmacêutica é obrigada a descrever aqui todos os eventos adversos que foram observados nos testes clínicos, e classificá-los segundo a frequência com que eles acontecem.

No caso específico da vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Pfizer para adolescentes e adultos, os efeitos colaterais descritos em bula são:

  • Reações muito comuns (ocorrem em 10% dos indivíduos vacinados): dor de cabeça, diarreia, dor nas articulações, dor muscular, dor e inchaço no local da injeção, cansaço, calafrios e febre;
  • Reações comuns (ocorrem em 1% a 10% dos vacinados): náusea, vômito e vermelhidão no local da injeção;
  • Reações incomuns (ocorrem em 0,1% a 1% dos vacinados): aumento dos gânglios linfáticos (ou ínguas), reações de hipersensibilidade [por exemplo, erupção cutânea (lesão na pele), prurido (coceira), urticária (alergia da pele com forte coceira), angioedema (inchaço das partes mais profundas da pele ou da mucosa)], diminuição de apetite, insônia, tontura, letargia (cansaço e lentidão de reações e reflexos), hiperidrose (suor excessivo), suor noturno, dor nos membros (braço), astenia (fraqueza, cansaço físico intenso), sensação de mal-estar e prurido no local de injeção;
  • Reações raras (ocorrem em 0,01% a 0,1% dos vacinados): paralisia facial aguda;
  • Reações muito raras (ocorrem em menos de 0,01% dos vacinados): miocardite (infecção das fibras do coração) e pericardite (inflamação do revestimento externo do coração);
  • Reações desconhecidas (os números são tão pequenos que nem podem ser estimados a partir dos dados disponíveis): reação alérgica grave (anafilaxia), parestesia (aparecimento, sem estimulação, de sensações espontâneas e mal definidas, como “formigamento”), hipoestesia (diminuição da sensibilidade), eritema multiforme (reação na pele que causa manchas ou placas vermelhas, que se parecem com um alvo ou “olho de búfalo” e apresenta um centro vermelho escuro rodeado por halos vermelhos e pálidos), sangramento menstrual aumentado, inchaço extenso do membro vacinado, inchaço da face (pode ocorrer em pacientes que receberam preenchedores dermatológicos faciais).

Essas manifestações se modificam ligeiramente em crianças de 6 meses a 12 anos, como descrito em detalhes na própria bula.

O documento orienta a pessoa que foi vacinada a falar com o médico, o farmacêutico, o enfermeiro ou o responsável pelo posto de saúde se determinado efeito colateral não for embora depois de dois ou três dias.

Todos esses casos de reações devem ser notificados à Anvisa, que faz uma investigação aprofundada para saber se o evento adverso que um indivíduo sente está relacionado à vacina ou não.

Vale destacar que, segundo as avaliações de cientistas e agências regulatórias de todo o mundo que aprovaram essa vacina, os benefícios superam os riscos: ou seja, a proteção contra o coronavírus obtida através do imunizante é mais valiosa que qualquer incômodo relacionado à aplicação das doses.

A miocardite pós-vacinação

Em outro trecho, a bula da vacina da Pfizer detalha melhor as inflamações cardíacas (miocardite e pericardite) que foram observadas em alguns indivíduos logo após a aplicação da dose.

Esse efeito colateral é classificado como “muito raro” — ou seja, acontece em menos de 0,01% dos vacinados.

“Normalmente, os casos ocorreram com mais frequência em homens mais jovens e após a segunda dose da vacina, e em 14 dias após a vacinação”, informa a farmacêutica.

“[As inflamações cardíacas] foram menos relatadas em crianças com 5 a 12 anos de idade do que em adolescentes de 12 a 17 anos”, continua o texto.

“Geralmente, os casos são leves, e os indivíduos tendem a se recuperar dentro de um curto período de tempo após o tratamento padrão e repouso.”

“Após a vacinação, você deve estar alerta para sinais de miocardite e pericardite, como falta de ar, palpitações e dores no peito, e procurar atendimento médico imediato, caso ocorram”, conclui a bula.

Para ler a bula completa da vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Pfizer, acesse o site da Anvisa ou da própria farmacêutica — ali, também é possível ler os documentos das doses bivalentes, desenvolvidas para proteger contra as variantes mais recentes da ômicron e usadas atualmente na campanha de vacinação brasileira.

Fonte: BBC