Mais de 200 pessoas foram ao Cine São Carlos, no interior paulista, para assistir ao documentário de Silvio Tendler, com fotografia de Lúcio Kodato e produção do Instituto Angelim.
Após uma hora e meia da exibição de “Ousar Viver! Histórias da Maria”, documentário talhado pelo renomado cineasta Silvio Tendler, uns breves segundos de silêncio tomaram conta do Cine São Carlos. Logo depois, a explosão de aplausos e a plateia vibrando a cada passo de Lúcia Maria Pimentel rumo à tela, onde foi homenageada.
São Carlos, no interior paulista, se vestiu com banners, cartazes e flores para homenagear os 60 anos de militância desta carioca residente em São Paulo. Uma vida de entrega e dedicação ao Brasil e à Humanidade. A cidade-sede do Instituto Angelim, produtor da obra, protagonizou com êxito o lançamento nacional do longa-metragem, com o carinho a Maria sendo retratado nas inúmeras fotos sacadas a seu lado, em cima do tapete vermelho, em frente ao enorme banner que coloria o salão de entrada.
“Este é o resgate de uma memória impagável, o exemplo do que deve ser a política em nosso país”, sintetizou o diretor de fotografia do filme, Lúcio Kodato, fundador da Associação Brasileira de Cinematografia (ABC), ovacionado pelo público.
Em entrevista, Kodato recordou que Silvio Tendler viu no filme sobre Maria, hoje com 76 anos, “a grande chance de resgatar uma figura feminina, ao mesmo tempo em que estava finalizando o de Brizola”. “Então, abraçou com unhas e dentes, deixando para o futuro uma história de grande importância que poucos conhecem. Eu mesmo não tinha noção do trabalho desempenhado por ela durante a ditadura”, declarou. Kodato tem uma longa carreira no cinema. Entre outros feitos, recebeu o prêmio de “Melhor Fotografia” no XIV Festival de Brasília do Cinema Brasileiro com o longa metragem Xingu/Terra. Produziu vídeos musicais para João Gilberto, Paralamas do Sucesso e Yamandu Costa. Foi professor em diversas instituições pelo Brasil.
Para Silvio Tendler, “a proposta é realizar uma conversa aberta sobre gênero, militância e ideologia, apoiada em depoimentos de pessoas que conheceram Lúcia Maria em diferentes fases de sua vida”. “Queremos mostrar que a luta pela democracia não foi apenas um esforço de um grupo seleto, mas envolveu a dedicação de muitas mulheres, que frequentemente permanecem invisíveis na história”, acrescentou.
Entre os inúmeros depoimentos, ricos e vibrantes, encontram-se os do historiador Daniel Aarão Reis Filho; do jornalista Franklin Martins; da ex-presidente da Federação Democrática Internacional de Mulheres (FDIM), Márcia Campos; da ex-vereadora de São Paulo, Lidia Correa; de Mariana, Carmem Silvia e José Almino, filhos do ex-governador de Pernambuco, Miguel Arrraes, que conviveram com “Andrea” na Argélia; de Luiz Rodolfo (Gaiola), liderança estudantil do Rio; de dirigentes internacionais de trabalhadores, como Valentin Pacho, e de Carlos Pereira e Suzana Lischinsky, seus camaradas na época e atualmente amigos e jornalistas na Hora do Povo.
Trajetória de luta e abnegação
A trajetória de Maria começou no combate ao Golpe de 1964, que depôs o governo de João Goulart. Integrante da Dissidência da Guanabara (DI-GB), logo passou a militar no Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8) – organização responsável pela captura do embaixador dos Estados Unidos, Charles Elbrick. Como foi lembrada, a ação viria a ter um papel fundamental não só para a libertação de 15 lideranças opositoras que estavam criminosamente encarceradas, mas pela leitura de um manifesto em rede nacional de rádio e televisão denunciando as torturas e os crimes praticados pelo regime.
Em 1969, Maria passou 100 dias presa por sua resistência ao regime e, posteriormente, exilada, viveu na Argélia e na Suíça, antes de retornar, clandestina, ao Brasil em 1975. Desde então, sua atuação tem sido marcada por uma série de avanços significativos no movimento sindical, incluindo a diretoria do Sindicato dos Gráficos de São Paulo, a liderança da Comissão Organizadora da 1ª Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), em 1981, e do Congresso da Mulher Trabalhadora, em 1985.
A produtora executiva do documentário e coordenadora de projetos do Angelim, Mirlene Simões, destacou o significado de se resgatar a memória de um período sombrio, através da história e da vida de mulheres que atuaram com abdicação e desprendimento pela justiça. Algo que, segundo Mirlene, “contribui para a preservação das nossas bases democráticas e incentiva que as jovens conheçam o nosso passado e as origens do sistema representativo e plural que vivemos, e lutem contra qualquer retrocesso”.
O argumento foi desenvolvido por Fabíola Notari, Lenice Antunez, Maria Beatriz Rocha, Mirlene Simões e Monica Fonseca Severo.
Entre outras entidades, a obra tem o apoio do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp); Centro Popular de Cultura da União Municipal dos Estudantes de São Paulo (CPC-UMES); Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB); Federação Nacional dos Trabalhadores em Energia, Água e Meio Ambiente (Fenatema), Força Sindical; União Geral dos Trabalhadores (UGT); Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentos (CNTA); Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos (Cobap); Sindicato Nacional dos Oficiais da Marinha (Sindmar); Sindimoto Campinas e Região; Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema); Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo (Sintracon); Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing de Campinas e Região (Sintratel); Sindicato dos Trabalhadores de Campo Bom-RS (Sapateiros) e o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Sorocaba e Região.
A próxima exibição está marcada para o dia 20 de novembro, quarta-feira, às 19 horas, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo.
Fonte: Portal Vermelho / Foto: divulgação