Frank Hofmannhá – Segunda, 12 de fevereiro de 2024
Levantamento da Conferência de Munique em países ricos e emergentes, entre eles o Brasil, coloca migração devido a guerras e mudanças climáticas como maior desafio à segurança global.
Se em 2023 a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia foi considerada a maior ameaça à segurança mundial na pesquisa da Conferência de Segurança de Munique (MSC, na sigla em inglês) – em especial nos países do G7 –, este ano a migração por causa de guerras e das mudanças climáticas é vista como a maior ameaça pelas 12 mil pessoas entrevistadas em países do G7 e também no Brasil, China, Índia, África do Sul e Ucrânia.
A ameaça representada pela Rússia continua a ser classificada como mais elevada do que antes da invasão da Ucrânia, há dois anos. Ela apenas ficou um pouco para trás na percepção das pessoas entrevistadas entre outubro e novembro de 2023, dando a entender que elas se habituaram um pouco à guerra.
Na Ucrânia, a pesquisa também perguntou sobre as “condições aceitáveis para um cessar-fogo”, com 92% pedindo a retirada completa das tropas russas do país, incluindo a Crimeia. Apenas 12% considerariam aceitável que apenas a Crimeia permanecesse anexada pela Rússia. Mais de dois terços gostariam que a Ucrânia se unisse rapidamente à UE e à Otan.
A Conferência de Segurança de Munique ocorre todos os anos, em fevereiro, na capital da Baviera, e reúne militares, especialistas em segurança e políticos de alto escalão de todo o mundo. O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, também deverá participar do evento deste ano, que começa nesta sexta-feira (16/01) e vai até domingo.
China e Taiwan
De acordo com a pesquisa, a percepção de risco de um conflito militar no Indo-Pacífico entre a China e Taiwan aumentou drasticamente. Os temores oriundos de uma China cada vez mais autoconfiante deram um grande salto especialmente no Japão, na Índia, nos EUA, na Alemanha e na França.
Nos países do G7 (Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Japão, Canadá e EUA), “grande parte da população acredita que seus países serão menos seguros e prósperos daqui a dez anos”, afirma o presidente da MSC, Christoph Heusgen, no relatório que analisa a pesquisa.
A análise mostra que as pessoas nos países do G7 esperam um aumento no poder e na influência da China e dos países do Sul Global em detrimento de seus próprios países.
Globalização em marcha à ré
De modo geral, a insatisfação com as condições econômicas no mundo está crescendo, segundo o relatório. “Apesar das enormes conquistas na era pós-Guerra Fria”, não só os “principais atores do Ocidente” como também as “poderosas autocracias e os países do chamado Sul Global” estão todos insatisfeitos com o “status quo – e com sua própria parte do proverbial bolo”.
A globalização como um todo engatou marcha à ré, prossegue o documento. A concorrência e uma necessidade muito maior de segurança claramente prevalecem no mundo atual. Globalmente, menos capital está fluindo sobretudo para a China. “A intensificação da rivalidade geopolítica enterrou a crença de que a globalização orientada pelo mercado leva a uma distribuição justa dos lucros”, afirma o relatório. De acordo com o texto, os países estão priorizando “a resiliência e a segurança em detrimentos da eficiência”.
“As mudanças políticas dramáticas” no mundo se refletem na “realidade macroeconômica”. Os fluxos de capital ocidentais estão sendo redirecionados da China para outros parceiros. “Os fluxos comerciais também estão mostrando sinais de reestruturação ao longo das linhas geopolíticas”, de acordo com o levantamento, que, em geral, apresenta um quadro bastante pessimista das cadeias de produção no mundo.
Fluxos globais de capital
As cadeias de suprimentos entre a Ásia e outras regiões do mundo estão sendo separadas. A Europa, no entanto, e a Alemanha em particular destacam-se como uma exceção: “As empresas alemãs continuam a investir pesadamente na China, desafiando os esforços de Berlim para reduzir sua dependência”, diz o relatório. “O investimento estrangeiro direto alemão na China permaneceu num nível recorde no primeiro semestre de 2023.”
O governo alemão adota uma política de “redução de riscos” para a China – em outras palavras, de redução da dependência econômica. Isso começou na pandemia do coronavírus, quando cadeias de fornecimento entre a Alemanha e a China entraram em colapso durante os lockdowns. Essa política ganhou impulso como o rompimento da dependência de longa data das importações de energia da Rússia. No entanto, isso ainda não parece se refletir em números.
Região do Sahel
A crescente influência militar da Rússia no Sahel também desempenha um papel na análise. O golpe no Níger mostra a perda de influência da antiga potência colonial, a França. A Rússia, por outro lado, estaria tentando “dissociar os países do Sahel da Europa e dos EUA”.
Aqui, também, os autores do relatório dizem que há sobretudo perdedores. “As pessoas da região estão perdendo a chance de paz e progresso democrático, já que cada golpe desde 2020 resultou em mais violência.”
De acordo com o estudo, outros temores são o perigo representado pelos ataques cibernéticos e as consequências negativas do uso da inteligência artificial (IA). “O progresso tecnológico, há muito tempo uma força motriz do bem-estar global, está sendo cada vez mais instrumentalizado por rivais”, afirma a análise.
Segundo o Índice de Segurança de Munique, os entrevistados nos EUA classificam essa ameaça como particularmente alta, seguidos pelos da Índia. De um modo geral, os entrevistados apontaram como fonte de preocupação as campanhas de desinformação nas redes sociais.
Fonte: DW