Terça, 19 de novembro de 2024
O plano para executar, em 2022, o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), começou tendo como alvo o ministro Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral e relator de inquéritos contra Jair Bolsonaro (PL) no Supremo Tribunal Federal.
Essa informação está no relatório da Polícia Federal enviado a Alexandre narrando o plano para assassinar Lula e Alckmin, chapa vencedora na eleição de 2022, assim como o próprio ministro do Supremo.
O relatório faz parte da investigação que culminou na prisão de militares e um agente da PF nesta terça-feira (19/11). Alexandre mandou prender o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima; o general da reserva e ex-ministro interino da Secretaria-Geral Mário Fernandes; o major das Forças Especiais do Exército Rafael Martins de Oliveira; o major Rodrigo Bezerra de Azevedo; e o policial federal Wladimir Matos Soares.
Fernandes ocupa o posto de maior patente. Ele foi secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência durante o governo de Bolsonaro e chegou a ocupar a chefia da pasta.
Além dos militares, há indícios de envolvimento do próprio ex-presidente em atos golpistas, e também de seu vice na chapa derrotada em 2022, o general da reserva Braga Netto, que exerceu os cargos de ministro da Defesa e da Casa Civil no governo passado.
‘Punhal Verde e Amarelo’
O material da PF relata o plano, batizado de “Punhal Verde e Amarelo”, para “neutralizar” Alexandre e derrubar a chapa eleita em 2022. O objetivo era manter Bolsonaro no poder.
A ação é descrita em um documento impresso por Mario Fernandes no Palácio do Planalto no dia 9 de novembro daquele ano. Nele, há diversos tópicos relacionados à logística de uma operação clandestina contra Alexandre. Fernandes seria o responsável pelo planejamento.
O documento descreve como deveria ocorrer o sequestro e/ou homicídio de Alexandre. Também indica possíveis rotas de deslocamento do ministro, registra informações sobre sua segurança pessoal e lista itens necessários para executar a operação. A data escolhida foi 15 de dezembro.
O plano se valeu de seis pessoas utilizando telefones celulares com chips habilitados em nome de terceiros e que constavam em um grupo do aplicativo de mensagens Signal. Os investigados utilizavam nomes de países como codinomes.
A ação que ocorreria em 15 de dezembro foi batizada de “Copa 2022”. “Foram consideradas diversas condições de execução do ministro Alexandre de Moraes, inclusive com o uso de artefato explosivo e por envenenamento em evento oficial público”, diz o relatório da Polícia Federal.
Um dos tópicos do plano “Punhal Verde e Amarelo” descreve os “danos colaterais” aceitáveis, considerando não só a morte de Alexandre, mas de toda a equipe de segurança do ministro.
“Tal fato é reforçado pelo tópico denominado ‘Danos colaterais passiveis e aceitáveis’, em que o documento descreve como passível ‘100%’ e aceitável também o percentual de ‘100%’. Ou seja, claramente para os investigados a morte não só do ministro, mas também de toda a equipe de segurança e até mesmo dos militares envolvidos na ação era admissível”, diz a investigação.
Um carro oficial do Exército foi utilizado. Em 15 de dezembro, o automóvel se deslocou de Goiânia para Brasília. No final das contas, no entanto, a ação não foi adiante.
O planejamento considerou também a possibilidade dos assassinatos de Lula e Alckmin, com o “objetivo de extinguir a chapa presidencial vencedora do pleito de 2022”.
Para a execução de Lula, o documento descreve sua “vulnerabilidade de saúde” e ida frequente a hospitais. E sugere, em seguida, “a possibilidade de utilização de envenenamento ou uso de químicos para causar um colapso orgânico” no presidente.
Já a morte de Alckmin é citada como necessária para que a chapa fosse definitivamente extinta, sem a possibilidade de condução do vice ao cargo, por exemplo.
A data limite para executar o plano era 19 de dezembro, já que, no dia seguinte, o comando militar seria passado para militares indicados pelo governo eleito, explica a PF.
Após a conclusão da ação clandestina, em 15 de dezembro, seria instituído um “gabinete de crise” como resposta às mortes de Lula, Alckmin e Alexandre. O comando do gabinete ficaria com o general Augusto Heleno, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e Braga Netto.
Circulava ainda, na mesma época, uma minuta de decreto prevendo novas eleições. A proposta instauraria estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral.
O documento dizia ter como objetivo “garantir a preservação ou o pronto restabelecimento da lisura e correção do processo eleitoral presidencial do ano de 2022, no que pertine à sua conformidade e legalidade, as quais, uma vez descumpridas ou não observadas, representam grave ameaça à ordem pública e a paz social”.
A participação de Braga Netto
O plano para executar os assassinatos foi discutido na residência Braga Netto, que estava presente na reunião, segundo a PF. Também teriam participado do encontro Mauro Cid, o major Rafael de Oliveira e o tenente-coronel Ferreira Lima.
Depois da reunião, em 14 de novembro, Oliveira teria enviado para Cid um documento com o título “Copa 2022”, contendo informações sobre necessidades logísticas e de orçamento para executar o plano. A PF também afirma que foi a partir do encontro que os militares passaram a monitorar Alexandre.
“As atividades anteriores ao evento do dia 15 de dezembro de 2022 indicam que esse monitoramento teve início, temporalmente, logo após a reunião realizada na residência de Walter Braga Netto. Pelo que se observou, com base na cronologia, atividades identificadas, os levantamentos iniciais em ‘pontos de interesse’, relacionados ao Ministro Alexandre de Moraes, sugerem ter contado com levantamentos iniciais realizados por Helio Ferreira Lima e Rafael Martins de Oliveira”, diz a PF.
O órgão aponta que Braga Netto é um dos principais envolvidos na tentativa de golpe e que buscou manter Bolsonaro no poder a todo custo, apesar da derrota nas eleições.
Bolsonaro editou minuta
A PF também deu detalhes sobre a participação de Jair Bolsonaro na edição da “minuta do golpe”. O então presidente pediu alterações no texto, mantendo o trecho que determinava a prisão de Alexandre.
O texto, um decreto, previa a prisão de Alexandre e do também ministro do STF Gilmar Mendes, além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD). O documento ainda determinava que novas eleições deveriam ser convocadas.
A minuta teria sido apresentada a Bolsonaro em 9 dezembro, em reunião com o general Estevam Theofilo. O objetivo seria organizar o apoio militar para consumar o golpe de Estado.
“Mensagens encaminhadas por Mauro Cid para o General Freire Gomes, então Comandante do Exército, sinalizaram que o então presidente Jair Messias Bolsonaro estava redigindo e ajustando a minuta do ilegal decreto golpista já buscando o respaldo do general Estavam Theophilo Gaspar de Oliveira, tudo a demonstrar que atos executórios para um golpe de Estado estavam em andamento”, disse Alexandre na decisão que autorizou a prisão dos militares.
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Fonte: Conjur