Com roteiro e pesquisa musical de doutora em Recursos Florestais pela USP, “Baile das Onças” une divulgação científica e cultura
“Uma forma de reconhecer o nosso território, o nosso povo e a nossa música.” É assim que a bióloga Francesca Belem Lopes Palmeira classifica o programa de rádio Baile das Onças, que ressalta a presença da onça na música popular brasileira. Produzido por Francesca, o programa tem cinco episódios e está disponível no site do Coletivo Tocaya, responsável pela iniciativa, em parceria com o projeto Onças-Pintadas do Contínuo de Paranapiacaba. Com cinco episódios, Baile das Onças foi transmitido pela Rádio Ufscar, a emissora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), em novembro passado. Já estão confirmadas a segunda e a terceira temporadas.
Os cinco episódios da primeira temporada contam com locução e apresentação de Nat Rozendo e edição de Jônatas Micheletti. Os episódios estão divididos em cinco eixos temáticos, que abordam temas como o simbolismo da mulher como onça, a figura do “amigo da onça”, a caça à espécie e a relação da onça com a natureza. Incluindo composições de Tom Jobim, Milton Nascimento, Alceu Valença, Tião Carreiro e Linn da Quebrada, a primeira temporada reúne 49 músicas. “Estou tentando fazer também uma análise temporal, destacando como eram as primeiras músicas que abordam a onça, até aquelas que estão sendo lançadas agora”, conta Francesca, que é doutora em Recursos Florestais pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP.
Inicialmente, a ideia da pesquisa de Francesca, que resultaria no programa, era somente analisar como a figura da onça é utilizada nas músicas – quais sentimentos aparecem mais frequentemente e se são positivos ou negativos, por exemplo –, mas o trabalho resultou em um repertório com cerca de 20 horas de registros fonográficos. Para isso, Francesca faz uso de uma linguagem de programação para contabilizar e analisar as composições.
O diferencial do projeto, segundo a bióloga, é ser desenvolvido “por um grupo diversificado que reúne profissionais da conservação ambiental e um coletivo de DJs, misturando informações científicas com aspectos empíricos e culturais”. A multidisciplinaridade da equipe, segundo Francesca, foi primordial para estabelecer uma linguagem acessível nos episódios, a fim de alcançar o maior e mais diverso público possível.
“É também uma ação cultural, de envolvimento com a sociedade, de apropriação pela sociedade”, expõe a bióloga. “O Brasil ama a onça, e nós estamos tentando mostrar isso através da música. No programa, também tentamos juntar o conhecimento científico com outros conhecimentos da cultura brasileira, como a literatura.”
Francesca conta que os próximos passos do projeto já estão sendo desenvolvidos. A segunda temporada será um “passeio por biomas e ritmos”. “Vamos passear pelos cinco biomas em que a onça está presente e vamos falar das danças, das músicas e dos povos que vivem ali, além de trazer informações e curiosidades sobre a onça em cada um desses lugares”, revela.
Repertório vasto
Francesca recorda que o projeto surgiu de forma tímida. Desde o final de sua graduação em Ciências Biológicas, na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, no ano 2000, a bióloga deu início a estudos sobre a onça e suas aparições na música através da audição de antigos discos da sua mãe e de músicas tocadas no rádio. As anotações inicialmente feitas por ela de maneira pessoal deram origem ao que se tornaria um extenso repertório, que Francesca possui hoje.
Após concluir o doutorado, que teve como tema os “Modelos de distribuição e de ocupação da onça-pintada (Panthera onca) no bioma Amazônia”, Francesca se tornou pesquisadora associada ao projeto Onças-Pintadas do Contínuo de Paranapiacaba, apoiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). O Contínuo do Paranapiacaba é um corredor ecológico localizado no sul do Estado de São Paulo e reconhecido pela Unesco como Patrimônio da Humanidade.
Coordenado pela pós-doutora em Ecologia pela USP Beatriz Beisiegel, o projeto Onças do Contínuo de Paranapiacaba promove anualmente a Semana de Celebração das Onças-Pintadas do Contínuo, que comemora o Dia Internacional da Onça-Pintada, 29 de novembro – data instituída pela ONU (Organização das Nações Unidas). Anual, o evento conta com diferentes atividades artísticas, ecológicas e educacionais que visam a chamar a atenção do público para a preservação da espécie. Foi durante uma dessas atividades que Francesca descobriu uma playlist, feita pelos pesquisadores do projeto, que se assemelhava àquela que estava desenvolvendo.
Durante a pandemia de covid 19, Francesca passou a utilizar a Twitch TV, serviço de streaming de vídeo ao vivo. “Naquela época, estava tendo um movimento de transmissões ao vivo de DJs. Junto a isso, voltei a ouvir muitas músicas que falavam sobre onças.”
“Conversando com os DJs nos chats, entendi como eles trabalhavam e quais plataformas utilizavam, e passei a fazer uma pesquisa sistematizada dessas músicas”, lembra a bióloga. Naquele momento, a pesquisa de muitos anos sobre a onça e a inspiração pelo trabalho dos DJs se uniram e deram origem ao Baile das Onças.
Os cinco episódios da primeira temporada do programa Baile das Onças, produzido pela bióloga Francesca Belem Lopes Palmeira, estão disponíveis no site do Coletivo Tocaya e na plataforma de streaming SoundCloud. A setlist completa elaborada pela bióloga pode ser consultada no Spotify e no Deezer. Mais informações estão disponíveis no site do Coletivo Tocaya.
*Estagiária sob supervisão de Roberto C. G. Castro.
Fonte: Jornal da USP