- Bruce Watt e Katarina Fritzon
- Role,*The Conversation
- 29 setembro 2024
Artigos sobre pessoas que não se comportam bem e como identificá-las são comuns. Você não precisa jogar no Google ou rolar a tela por muito tempo para encontrar manchetes como “7 sinais de que seu chefe é um psicopata” ou “Como evitar o sociopata ao lado”.
Você verá frequentemente os termos psicopata e sociopata usados de forma intercambiável. Isso se aplica talvez ao personagem fictício com mal comportamento mais famoso de todos – Hannibal Lecter, o serial killer canibal de O Silêncio dos Inocentes.
No livro em que o filme é baseado, Lecter é descrito como um “sociopata puro”. Mas no filme ele é descrito como um “psicopata puro”. Psiquiatras o diagnosticaram com algo totalmente diferente.
Então, qual é a diferença entre um psicopata e um sociopata?
Como veremos, esses termos foram usados em diferentes momentos da história e se relacionam a alguns conceitos que se sobrepõem.
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O que é um psicopata?
A psicopatia é mencionada na literatura psiquiátrica desde os anos 1800. Mas a última edição do Diagnostic Statistical Manual of Mental Disorders (conhecido coloquialmente como DSM) não a lista como um transtorno clínico reconhecido.
Desde a década de 1950, os rótulos mudaram e termos como “distúrbio de personalidade sociopática” foram substituídos por transtorno de personalidade antissocial, que é o que usamos hoje.
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Alguém com transtorno de personalidade antissocial tem um desrespeito persistente pelos direitos dos outros.
Isso inclui quebrar a lei, mentir repetidamente, comportamento impulsivo, entrar em brigas, desconsiderar a segurança, comportamentos irresponsáveis e indiferença às consequências de suas ações.
Para aumentar a confusão, a seção no DSM sobre transtorno de personalidade antissocial menciona traços de psicopatia (e sociopatia). Em outras palavras, de acordo com o DSM, os traços são parte do transtorno de personalidade antissocial, mas não são transtornos mentais em si.
A primeira descrição formal de traços de psicopatia foi feita pelo psiquiatra americano Hervey Cleckley, em seu livro The Mask of Sanity, de 1941.
Ele baseou sua descrição em observações clínicas de nove pacientes do sexo masculino em um hospital psiquiátrico. Ele identificou várias características-chave, incluindo charme superficial, falta de confiabilidade e falta de remorso ou vergonha.
O psicólogo canadense e professor Robert Hare refinou essas características enfatizando características interpessoais, emocionais e de estilo de vida, além dos comportamentos antissociais listados no DSM.
Quando reunimos todas essas vertentes de evidências, podemos dizer que um psicopata manipula os outros, mostra charme superficial, é grandioso e é persistentemente enganoso. Traços emocionais incluem falta de emoção e empatia, indiferença ao sofrimento dos outros e não aceitar responsabilidade por como seu comportamento afeta os outros.
Finalmente, um psicopata fica entediado facilmente, se aproveita dos outros, não tem objetivos e é persistentemente irresponsável em suas ações.
E um sociopata?
O termo sociopata apareceu pela primeira vez na década de 1930 e foi atribuído ao psicólogo americano George Partridge. Ele enfatizou as consequências sociais do comportamento que comumente viola os direitos dos outros.
Acadêmicos e clínicos frequentemente usavam os termos sociopata e psicopata de forma intercambiável. Mas alguns preferiam o termo sociopata porque diziam que o público às vezes confundia a palavra psicopata com psicose.
“Distúrbio de personalidade sociopática” foi o termo usado na primeira edição do DSM em 1952. E se alinhava a visões predominantes na época, de que os comportamentos antissociais eram em grande parte o produto do ambiente social e que os comportamentos só eram julgados como desviantes se quebrassem regras sociais, legais e/ou culturais.
Algumas dessas primeiras descrições de sociopatia estão mais alinhadas com o que hoje chamamos de transtorno de personalidade antissocial. Outras estão relacionadas a características emocionais semelhantes à definição de psicopata de Cleckley, de 1941.
Em resumo, pessoas diferentes tinham ideias distintas sobre sociopatia e, mesmo hoje, a sociopatia é menos bem definida do que a psicopatia. Portanto, não há uma definição única de sociopatia, ainda hoje. Mas, em geral, os comportamentos antissociais que a caracterizam podem ser semelhantes aos que vemos na psicopatia.
Ao longo das décadas, o termo sociopatia caiu em desuso. A partir do final dos anos 60, os psiquiatras passaram a usar o termo transtorno de personalidade antissocial.
Nato ou adquirido?
Tanto a “sociopatia” (o que agora chamamos de transtorno de personalidade antissocial) quanto a psicopatia têm sido associadas a uma ampla gama de causas de desenvolvimento, biológicas e psicológicas.
Por exemplo, pessoas com traços psicopáticos têm certas diferenças cerebrais, especialmente em regiões associadas a emoções, inibição de comportamento e resolução de problemas. Elas também parecem ter diferenças relacionadas ao sistema nervoso, incluindo uma frequência cardíaca reduzida.
A sociopatia e seus comportamentos antissociais são, no entanto, um produto do ambiente social de alguém e tende a ocorrer na família. Esses comportamentos têm sido associados a abuso físico e conflito parental.
Quais são as consequências?
Apesar de suas representações fictícias — como Hannibal Lecter em O Silêncio dos Inocentes ou Villanelle na série de TV Killing Eve — nem todas as pessoas com psicopatia ou traços de sociopatia são serial killers ou fisicamente violentas.
Mas a psicopatia prevê uma ampla gama de comportamentos prejudiciais. No sistema de justiça criminal, a psicopatia está fortemente ligada à reincidência, particularmente de natureza violenta.
Na população em geral, a psicopatia está associada à dependência de drogas, falta de moradia e a outros transtornos de personalidade. Algumas pesquisas até mostraram que a psicopatia previa o não cumprimento das restrições da Covid.
Mas a sociopatia é menos estabelecida como um fator de risco-chave na identificação de pessoas com maior risco de danos a outras pessoas. E a sociopatia não é um indicador confiável de comportamento antissocial futuro.
Em poucas palavras
Nem a psicopatia, nem a sociopatia são classificadas como transtornos mentais em manuais formais de diagnóstico psiquiátrico.
Ambas são traços de personalidade relacionados a comportamentos antissociais e estão associadas a certas características interpessoais, emocionais e de estilo de vida.
Acredita-se que a psicopatia tenha bases genéticas, biológicas e psicológicas que colocam alguém em maior risco de violar os direitos de outras pessoas. Mas a sociopatia é menos claramente definida e seus comportamentos antissociais são o produto de um ambiente social.
Das duas, a psicopatia tem a maior utilidade na identificação de alguém com maior probabilidade de causar danos a outras pessoas.
* Bruce Watt e Katarina Fritzon são professores associados de Psicologia na Universidade de Bond (Austrália).
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em inglês.
Fonte: BBC Brasil / GETTY IMAGES