Ela é o instrumento que o Bacen utiliza para controlar a inflação, e, por ser a base, ela influencia todas as outras taxas de juros do País, como as de empréstimos, financiamentos e aplicações financeiras.
Nos últimos meses, grande atenção tem se voltado ao Banco Central (Bacen), mais especificamente à diretoria do Copom (Comitê de Política Monetária) –, responsável pela definição da taxa de juro base da economia, a famosa taxa Selic –, visto que ela está em níveis relativamente altos. Mas, afinal de contas, por que todos os agentes econômicos (empresas, famílias e setor público) têm acompanhado com atenção as ações do Copom sobre a definição da Selic?
A taxa Selic é o instrumento que o Bacen utiliza para controlar a inflação, e, por ser a base, ela influencia todas as outras taxas de juros do País, como as de empréstimos, financiamentos e aplicações financeiras. Dessa forma, à medida que ela fica mais alta, encarece o crédito para as empresas e as famílias e aumenta a remuneração dos poupadores na economia, gerando um arrefecimento do consumo, reduzindo, como consequência, a pressão de uma possível inflação da demanda sobre a economia. Por outro lado, faz com que as empresas adiem ou até descartem novos investimentos, dado que encarece o custo de capital e aumenta o custo de oportunidade dos investimentos. Já no caso do setor público, o custo do serviço (ou manutenção) da dívida pública cresce, devido à necessidade de se gerar um montante maior de recursos para pagamento dos juros da dívida pública.
O contrário ocorre quando a Selic recua; e, quando o Bacen não quer estimular nem desestimular a economia, ele define uma taxa neutra, um valor da Selic que manteria a taxa de inflação na meta e seria neutra sobre o nível de atividade da economia (PIB – Produto Interno Bruto). É importante que o quadro fiscal da economia esteja adequado para se compatibilizar essa taxa neutra, de forma a garantir a solvência do país, considerando, desse modo, seu patamar de endividamento.
A variável relevante para a política monetária de determinação do valor da taxa Selic pelo Copom, e que está definida no plano de metas do Bacen, é o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), que é calculado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e serve como medida da variação de preços de uma cesta de produtos importantes para as famílias – como alimentos, transporte e educação. A meta se refere à inflação (valor do IPCA) acumulada no ano, e, para 2023, é de 3,25. Mas é permitido que seu valor possa fechar o ano dentro de um intervalo de 1,5 ponto percentual (p.p.) para mais ou para menos do centro da meta. Ou seja, se o IPCA fechar 2023 com seu valor acumulado entre 1,75% e 4,75%, a inflação brasileira estará dentro do intervalo da meta definida pelo Copom.
A Figura 1 traz a evolução temporal da taxa Selic nominal, valores mensais da taxa efetiva divulgada pelo Bacen; do IPCA e a taxa Selic Real, que é calculada a partir da taxa nominal descontando-se o valor do IPCA (inflação oficial).
De janeiro de 2000 a maio de 2023, verificaram-se seis ciclos de alta mais forte da Selic. Esses ciclos coincidem com momentos de crise da economia brasileira – que pode ter sido influenciada por uma crise internacional, como a financeira de 2007/2008, ou não, como no caso do pico de 2016, que se deu como correção após uma redução injustificada da taxa. Nesse ano observou-se também expressiva quebra de safra agropecuária provocando elevação da inflação. O início do último grande ciclo de alta se dá justamente a partir de 2021, por conta dos efeitos da pandemia e da guerra na Ucrânia sobre a oferta e a demanda agregadas na economia mundial.
Em geral, a curva da Selic nominal segue a curva do IPCA, com alguma defasagem no tempo, ou seja, à medida que a inflação aumenta, o Copom, que a observa a cada reunião, avalia a necessidade de elevação do juro, ou, a partir do momento que inflação cede, pondera o momento de baixar o valor dos juros. Isso ocorre quando se espera que seja uma queda persistente e espalhada pelos preços da economia, para que se tenha certa segurança de que não seja algo sazonal e que não haja o risco de um repique de preços. Embora levar a inflação para o intervalo da meta seja uma decisão técnica, nem sempre se dá na mesma velocidade, como se pode observar na Figura 1, que mostra um processo de queda mais rápido da taxa nominal no ciclo de alta em 2003, do que o observado em 2006, por exemplo.
A decisão em relação ao valor da Selic leva em conta o processo de convergência da inflação para o intervalo da meta e os riscos associados a esse processo de convergência, já que um repique pode ser causado por um novo aumento de preços (de produtos domésticos ou internacionais) e uma desvalorização cambial.
Na Figura 1, percebe-se que a curva da Selic nominal vem se mantendo há algum tempo em seu elevado patamar, sugerindo uma baixa probabilidade de novas altas, mantidas as perspectivas econômico-financeiras atuais, especialmente do quadro que emergirá das decisões fiscais tomadas no parlamento. Ademais, observa-se que a inflação (IPCA) acumulada em 12 meses ficou em 3,94% em maio, dentro do intervalo da meta. Além disso, a taxa real de juro (Selic real) ficou em 9,17% ao ano em maio, taxa que tem sido extremamente alta e eficaz para manter o crescimento do consumo das famílias e da produção e das vendas das empresas em níveis baixos – conforme resultado dos componentes do PIB do primeiro trimestre de 2023 divulgados pelo IBGE.
O relatório do IBGE também traz uma notícia muito favorável em relação à produção agropecuária, que apresentou crescimento de quase 22% no primeiro trimestre de 2023. Esse aumento da produção agrícola é uma boa notícia, já que o aumento da oferta deve contribuir para segurar a inflação nos próximos meses. Isso porque o aumento na produção de grãos tem impactado na redução de seus preços, e milho e soja, por exemplo, são matérias-primas importantes para a produção de ração animal e óleos vegetais, o que, por sua vez, pode influenciar na redução dos preços de carnes, farinhas, leite, ovos, óleos, pescados, margarinas, produtos de limpeza e até do biodiesel. Pesquisas do Cepea mostram que uma diminuição de 10% nos preços da soja em grão tem potencial de reduzir em quase 5% os preços do óleo de soja, que é captado pelo IPCA soja; e no caso do milho, uma queda de 10% em seu preço tem potencial de baixar os preços do leite em 3%, aproximadamente, entre outros impactos.
Além do biodiesel, um quadro favorável (e pouco esperado) emergiu no mercado internacional com a queda dos preços do petróleo . No início de junho, o Banco Central divulgou seu indicador de preços de commodities, o IC-Br. Esse indicador mostra redução nos preços de todos os tipos de commodities, tanto agropecuárias como metálicas e energéticas. A queda em 12 meses do IC-Br composto é de 20%, sendo que a maior contribuição foi do setor de energia, cujos preços caíram 46% em 12 meses. Em maio/23, comparativamente a abril/23, o indicador ainda mostra queda de 4,7%, sendo que, desta, 3,3% se referem à baixa das commodities agropecuárias; 4,7%, à das commodities metálicas; e 9,9%, à das energéticas.
Diante dessas informações, analistas do mercado financeiro (mais focados no curto prazo), que no início do ano esperavam que o IPCA fechasse 2023 próximo de 6%, já o veem dentro do intervalo da meta de inflação neste ano. Dessa forma, a Queda da Selic é dada como bastante provável pelos agentes de mercado; o Quando, no entanto, ainda depende fundamentalmente do balanço a ser feito pelos integrantes do Copom quanto ao cenário fiscal deste e dos próximos anos, o que está em definição política neste momento.
Fonte: Por Andréia Adami, pesquisadora da área de Macroeconomia do Cepea