‘Quatro linhas da Constituição é o c*’, ‘guerra civil’, ‘inflamar a massa’: veja áudios em que militares debatem golpe

Brasil

Investigação da PF apontou que militares articularam plano que envolvia conspiração para matar o presidente Lula, o vice, Geraldo Alckmin, e o ministro do STF Alexandre de Moraes.

A investigação da Polícia Federal (PF) sobre a trama golpista após o segundo turno das eleições de 2022 obteve áudios de militares discutindo os preparativos para o plano. A TV Globo teve acesso a 55 áudios que circulavam em grupos de militares de alta patente. Confira trechos mais abaixo.

Segundo a PF, o general da reserva Mario Fernandes, ex-número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, foi o articulador do plano, que envolvia uma conspiração para matar o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva; o vice, Geraldo Alckmin; e o ministro do STF Alexandre de Moraes.

Na quinta-feira (12), a PF indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 36 pessoas pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. Os áudios a seguir são de conversas ocorridas após o segundo turno das eleições de 2022.

Confira abaixo o que disseram os militares:

‘Quatro linhas da Constituição é o c*’

coronel Reginaldo Vieira de Abreu, em uma das conversas com o general Mário Fernandes, justificou a necessidade de um golpe de Estado porque o país estava em guerra e os adversários estavam vencendo.

“O senhor me desculpe a expressão, mas quatro linhas é o c*. Nós estamos em guerra, eles estão vencendo, está quase acabando e eles não deram um tiro por incompetência nossa”, afirmou.

‘Guerra civil agora ou guerra civil depois’

general da reserva e ex-número 2 da Secretaria-Geral da Presidência da República, Mario Fernandes, recebeu um áudio do general-de-brigada da reserva Roberto Criscuoli, em 29 de novembro de 2022, discutindo abertamente a possibilidade de uma “guerra civil”.

“Se nós não tomarmos a rede agora, depois eu acho que vai ser pior. Na realidade vai ser guerra civil agora ou guerra civil depois. Só que a guerra civil agora tem um significativo, o povo tá na rua, nós temos aquele apoio maciço. Daqui a pouco nós vamos entrar numa guerra civil, porque daqui a alguns meses esse cara vai destruir o Exército, vai destruir tudo”, disse.

‘Inflamar a massa’

Segundo a investigação, os acampamentos em frente aos quartéis no fim de 2022 faziam parte de um movimento orquestrado pelos militares e que o general Mário Fernandes se comunicava frequentemente com esses grupos.

“Talvez seja isso que o alto comando, que a defesa quer: o clamor popular, como foi em 64. Nem que seja pra inflamar a massa, para que ela se mantenha nas ruas”, disse.

‘Segurar a PF’

Mensagens de voz do general Mário Fernandes mostram que o militar pediu ao então ajudante de ordens Mauro Cid que Bolsonaro conversasse com o Ministério da Justiça sobre a possibilidade de “segurar” as ações da PF no acampamento golpista montado em frente ao QG do Exército.

“Os caras não podem agir, a área é militar, mas, p*, já andou havendo prisão realizada ali pela Polícia Federal. Então, p*, seria importante, se o presidente pudesse dar um ‘input’ ali pro Ministério da Justiça, pra segurar a PF, né? Ou, p*, pra Defesa alertar o CMP, que, p*, não deixa. Os caminhões estão dentro de área militar”, afirmou.

‘Vou conversar com o presidente’

Em outro áudio, o tenente-coronel Mauro Cid relata conversa com o então presidente Jair Bolsonaro sobre o golpe de Estado.

“Vou conversar com o presidente [Bolsonaro]”, disse Cid. “O negócio é que ele tem essa personalidade às vezes. Ele espera, espera, espera, espera pra ver até onde vai, ver os apoios que tem. Só que às vezes o tempo está curto, não dá pra esperar muito mais passar. Dia 12 seria… Teria que ser antes do dia 12, mas com certeza não vai acontecer nada”, relatou.

‘Quebrar cristais’

general da reserva Mário Fernandes também aparece em um diálogo com Marcelo Câmara, então assessor de Jair Bolsonaro, disposto a enfrentar as consequências de um golpe de Estado.

“Qualquer solução, caveira, tu sabe que ela não vai acontecer sem quebrar ovos, sem quebrar cristais”, afirmou.

‘Qualquer ação pode acontecer até 31 de dezembro’

Em um outro áudio, o general Mário Fernandes disse que teve uma conversa com o então presidente Jair Bolsonaro, sobre a diplomação da chapa Lula e Alckmin, no TSE.

“Durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que o dia 12, pela diplomação do vagabundo, não seria uma restrição? Qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro. Tudo. Mas aí na hora: pô, presidente. A gente já perdeu tantas oportunidades”, mostra o áudio.

No dia 12 de dezembro, data da diplomação, manifestantes tentaram invadir o prédio da PF e incendiaram carros e ônibus em Brasília.

‘Três [oficiais] querem muito’

Em uma troca de mensagens com o general Mário Fernandes, o coronel reformado Reginaldo Vieira de Abreu afirmou que havia uma divisão entre os generais que comandavam a força sobre aderir ou não à tentativa de golpe de Estado.

“Kid Preto, cinco não querem, três querem muito e os outros, zona de conforto. É isso. Infelizmente. E a lição que a gente deu para a esquerda é que o alto comando ele tem que acabar”, disse.

‘Bota o Braga Netto lá’

O general Mário Fernandes, em conversa com o Marcelo Câmara, então assessor de Bolsonaro, em 10 de novembro de 2022, tratou da ideia de tirar o general Paulo Sérgio Nogueira e colocar o general Braga Netto no Ministério da Defesa.

Braga Netto, que foi vice na chapa derrotada de Bolsonaro, é apontado por fontes da Polícia Federal como o principal arquiteto do plano de golpe para manter o ex-presidente no poder mesmo com derrota na eleição de 2022.

“Ontem, falei com o presidente. P*, cara, eu tava pensando aqui, sugeri o presidente até, p*, ele pensar em mudar de novo o MD [Ministério da Defesa], porra. Bota de novo o General Braga Netto lá. General Braga Netto tá indignado, p*, ele vai ter um apoio mais efetivo”, diz Fernandes ao auxiliar do ex-presidente.

Fonte: G1

Foto: Reprodução