Levantamento do Estadão em tribunais de todo o País mostra que 21 dos 81 senadores (25,9%) que vão analisar as mudanças na Lei de Improbidade Administrativa respondem a ações em razão de contratos firmados quando eram prefeitos ou governadores. A alteração da lei pode favorecê-los, caso se decida pela retroatividade da mudança, tese apoiada por advogados.
Ao todo, a reportagem encontrou 37 senadores que respondem a ações penais e ou por improbidade – um deles chegou a ser condenado a 2 anos e 8 meses de prisão por peculato, mas a pena estava prescrita. O levantamento foi feito nos Tribunais de Justiça dos Estados, na Justiça Federal, no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Entre as alterações na Lei de Improbidade já aprovadas pela Câmara dos Deputados está a que acaba com a modalidade culposa. Atualmente, um governante pode responder por improbidade por ter agido com descuido, imprudência ou imperícia. Pela alteração, a culpa não será mais admitida, ainda que grave. Será preciso provar o dolo, a intenção do gestor de provocar o dano aos cofres públicos.
O novo projeto ainda estabelece um prazo máximo de 180 dias, prorrogados pelo mesmo período, para que o inquérito civil público, usado pelo Ministério Público para apurar os casos de improbidade, seja concluído. Promotores e procuradores consideram o prazo exíguo em casos complexos, que dependem de perícias, cooperação internacional e análise de quebras de sigilo.
“Do jeito que está, a lei passará a se chamar Lei da Impunidade Administrativa. É assim que eu e meus colegas estamos chamando esse projeto”, disse o promotor Sílvio Antônio Marques, especialista na legislação. Marques trabalha há 25 anos na Promotoria de Defesa do Patrimônio Público de São Paulo e foi o responsável pela apuração que localizou as contas bancárias do ex-prefeito Paulo Maluf, na Ilha de Jersey, no Reino Unido. “Os dados demoraram três anos para chegar”, observou.
Segundo a procuradora regional da República Samantha Chantal Dobrowolski, algumas alterações na lei, como o prazo de um ano para a conclusão do inquérito civil, parecem “claramente visar que não funcione”. Para ela e para seus colegas, não era necessário retirar da lei a punição por culpa, mas especificar de que se tratava da culpa grave, conforme já definido pelo STJ.
A procuradora regional disse que pontos polêmicos foram incluídos na Câmara sem que houvesse debate. Segundo ela, há, no entanto, avanços, como a possibilidade de acordo judicial. “No passado, houve muito erro. A lei é punitiva e inclui desde a possibilidade de punir o desvio de uma rama de papel até grandes desvios. Conforme o lugar, promotores não faziam o juízo de significância. E houve exageros lá atrás, nos anos 1990. O que existe, às vezes, é um problema de ‘timing’, como entrar com ação em época eleitoral. O preconceito contra a lei vem dessa época.”
Fonte: Estadão Conteúdo