O Brasil tem 12,46 casos de internação por doenças relacionados à água contaminada a cada 10 mil habitantes, com um custo de aproximadamente de R$ 99 milhões aos cofres públicos
Por: Rose Talamone e Ferraz Jr – Sexta, 26 de abril de 2024
No último episódio em celebração ao Dia Mundial da Água, em 22 de março, a Rádio USP apresenta uma análise do potencial desperdiçado pelo Brasil ao não capitalizar recursos financeiros com o aproveitamento dos esgotos sanitários, enquanto despende milhões no tratamento de doenças decorrentes da carência de saneamento básico.
A incidência de internações no Brasil por doenças relacionadas à água contaminada, devido à falta de tratamento adequado, atingiu a marca de 12,46 casos para cada 10 mil habitantes, resultando em um custo aproximado de R$ 99 milhões aos cofres públicos, conforme dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus). Esses números, embora referentes a 2017, destacam o significativo impacto econômico provocado pela ausência de universalização do saneamento básico no País, que se traduz na falta de acesso à água potável encanada por 32 milhões de brasileiros e na ausência de sistemas de coleta e tratamento de esgoto para mais de 92 milhões de pessoas.
A professora Giovana Tommaso, da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP em Pirassununga, lamenta que o índice de tratamento de esgotos em relação à quantidade coletada tenha diminuído entre 2015 e 2018, devido ao aumento na coleta ser maior do que no tratamento. Ela enfatiza que, embora não se possa generalizar, mantendo os investimentos atuais, a universalização da coleta poderia ser alcançada por volta de 2030, enquanto a universalização do tratamento só seria possível em torno de 2060.
O Brasil continua enfrentando altos custos para corrigir os problemas decorrentes da falta de saneamento básico universalizado, evidenciando a falta de compreensão das autoridades brasileiras sobre a necessidade urgente de resolver essa questão. Segundo a professora, os investimentos em saneamento e pesquisas são insuficientes para resolver esse problema grave, tanto em termos de saúde pública quanto ambiental.
Para a professora, é essencial que os representantes no poder público sejam indivíduos sérios, comprometidos em abordar de forma adequada a questão dos esgotos sanitários, que é de interesse público, estabelecendo um cronograma mais viável. Ela ressalta que não basta apenas discursar sobre a necessidade de atender às demandas da Organização das Nações Unidas (ONU), que são legítimas, mas é crucial compreender nossas próprias peculiaridades e necessidades locais.
Transformar prejuízo em lucro
Neste contexto, o Brasil perde uma oportunidade valiosa ao não utilizar a matéria orgânica proveniente dos esgotos domésticos e agroindustriais para gerar lucro em vez de prejuízo. Giovana ressalta a importância dessa matéria orgânica, destacando seu potencial na produção de biogás. Em grandes estações, o biogás pode ser convertido em energia elétrica e integrado à rede de distribuição, enquanto em instalações menores, mesmo quando não é economicamente viável, pode ser empregado como fonte de calor para desinfetar subprodutos como os lodos. Giovana também menciona a possibilidade de distribuição do biogás para uso na cocção, devido ao seu alto poder calorífico.
Quanto às águas residuais ou esgotos agroindustriais, há amplas oportunidades de reaproveitamento. Um exemplo, compartilhado pela professora, é a produção de ácidos orgânicos provenientes do tratamento de esgotos industriais concentrados, os quais podem ser usados na construção de bioplásticos. Esses processos, conforme destacado por Giovana, não só agregam valor ao produto final da estação de tratamento de águas residuais como também promovem uma abordagem mais sustentável.
Ao concluir, a professora enfatiza a importância de adotar medidas corretivas para mitigar os danos já causados, ao mesmo tempo em que instiga ações regenerativas em relação ao meio ambiente. “Cuidar da água, elemento que permeia todas as formas de vida, é condição primordial para que nossa existência seja garantida.”
Fonte: Jornal USP / Estação de Tratamento de Esgoto – Foto: Fernando Stankuns/Visual Hunt – CC