Dos campos do DF para a poderosa Juventus: conheça Maria Alves, a atacante brasileira que fez história na Itália

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Foi em Brasília que a caminhada até se tornar a primeira mulher brasileira na Juventus começou. Na última semana, logo após conquistar o Campeonato Italiano pela segunda vez consecutiva, a jogadora de 27 anos foi anunciada pelo Palmeiras

Por Carina Ávila — Brasília, DF

01/06/2021

Maria Alves nasceu em Tabocal Grande, município de 3 mil habitantes no interior do Piauí, e veio para a capital federal aos 14 anos tentar uma vida melhor. Em Brasília, começou a jogar futebol entre mulheres, algo inédito para ela. Alguns anos depois, tornou-se colega de clube de Cristiano Ronaldo, Buffon, Dybala e companhia. A atacante foi a primeira mulher brasileira da história contratada pela Juventus.

– Tenho um carinho muito grande por Brasília, posso até dizer que sou brasiliense, porque foi a primeira cidade onde realmente pude jogar com meninas. Então, foi a primeira cidade cidade que me abriu a porta para dar o pontapé inicial na minha carreira. Foi onde tudo começou e não tem como eu me esquecer deste lugar que me apoiou, que me deu a oportunidade de começar – enfatiza Maria.

Brasileira Maria Alves é bicampeã italiana com a Juventus — Foto: Reprodução/Instagram

Brasileira Maria Alves é bicampeã italiana com a Juventus — Foto: Reprodução/Instagram

Na última semana, a jogadora de 27 anos foi anunciada pelo Palmeiras. Chega com destaque após conquistar o segundo título consecutivo do Campeonato Italiano. Na Juventus, também conquistou duas vezes a Supercopa da Itália.

Veja como foi a trajetória de Maria Alves no futebol:

Início no Piauí

A piauiense começou a jogar bola aos 7 anos de idade no interior do estado. Era a única menina entre os meninos e chegou a disputar campeonatos com eles.

– Sou de Tabocal Grande, município pequeno, de 3 mil habitantes. Às vezes até digo que sou de Cristalândia, uma cidade vizinha que é o lugar mais desenvolvido ali perto de onde nasci. Cristalândia é onde meus pais vão uma vez por mês para fazer compras de mercado; tirar aposentadoria, que é um auxílio que eles recebem por mês; então, essa cidade acaba sendo meio que a “atração” da redondeza. Minha família mora em Tabocal Grande até hoje – conta.

Maria Alves foi convocada pela primeira vez para a seleção brasileira principal em 2011 — Foto: Reprodução/Instagram

Maria Alves foi convocada pela primeira vez para a seleção brasileira principal em 2011 — Foto: Reprodução/Instagram

Como grande parte das mulheres no futebol, ela sofreu bastante preconceito na cidade natal, algo que conseguiu reverter com o passar dos anos.

– Todo dia era uma confusão, porque eu acabava me destacando, sempre tive um bom físico. Algumas pessoas não gostavam e me chamavam de “Maria Macho” e outros apelidos do tipo. Por jogar com meninos, acabei aprendendo a entrar forte, a jogar duro como eles. Até tive um pouco de discriminação por parte da minha família no início, mas depois as coisas foram mudando. Eles viram que ser jogadora era um sonho meu, que era o que eu mais queria, e começaram a me apoiar.

A vinda para a capital

Maria jogou com os meninos no Piauí até os 14 anos, quando recebeu o convite de uma prima para morar com ela em Brasília, estudar na capital e tentar jogar futebol.

– Minha prima já morava no DF havia 20 anos. Na época, ela não via a mãe havia seis anos e viajou para Tabocal Grande para reencontrar a família. Lá, ela me viu jogando com meninos, ficou encantada e falou: “Você precisa sair daqui! Vem morar comigo! Eu te ajudo com tudo!”. Foi um pouco difícil convencer meus pais a me deixarem sair de casa sozinha, porque eu era menor de idade, mas no fim deu tudo certo. Fui para Brasília com 14 anos e minha prima me deu todo o suporte durante o tempo que morei na capital, ela me ajudou com tudo que precisei – relembra.

Maria Alves com Andrea Pirlo, ex-técnico do time masculino da Juventus — Foto: Reprodução/Instagram

Maria Alves com Andrea Pirlo, ex-técnico do time masculino da Juventus — Foto: Reprodução/Instagram

Foram quase oito anos em Brasília, a maior parte deles na Asa Norte – no último ano, ela se mudou para o Riacho Fundo II. No DF, ela jogou no extinto time da Ascoop (Associação Atlética Esportiva e Recreativa dos Cooperados e Funcionários das Cooperativas do Distrito Federal).

– A maioria das meninas que jogaram comigo está no Minas agora, time que da elite do futebol brasileiro. Queria mandar um abraço para toda a galera de Brasília, principalmente para as atletas e pessoas que me admiram. Sou muito grata a elas e à cidade. Levo sempre um pouco de Brasília dentro de mim – enfatiza.

Trajetória de sucesso no Brasil

Depois de se destacar pela Ascoop, equipe que já representou o DF na extinta Copa do Brasil, Maria acertou com o Ipatinga (MG) em 2011, onde ficou por apenas dois meses. Isso porque recebeu proposta do Vitória das Tabocas (PE), time que figurou por anos entre os melhores do país no ranking da CBF de futebol feminino, disputando – e até sediando – Copa Libertadores.

Maria Alves no Vitória das Tabocas (PE), time que disputou e sediou a Libertadores de 2012 — Foto: Reprodução/Instagram

Maria Alves no Vitória das Tabocas (PE), time que disputou e sediou a Libertadores de 2012 — Foto: Reprodução/Instagram

– Tive oportunidade de jogar em um time com mais visibilidade e me mudei para Vitória de Santo Antão, em Pernambuco. O técnico era o Kleiton Lima e, ali, recebi minha primeira convocação para a seleção brasileira principal. Foi uma pré-convocação para o Pan-americano de Guadalajara, no México. Dois meses depois, disputei o Sul-Americano com a seleção sub-20 e, um tempo depois, o Mundial de 2012 – recorda.

Após dois anos no Vitória, com mais convocações para a seleção principal, a atacante fechou com o Centro Olímpico (SP). Os seis meses durante os quais vestiu a camisa da equipe foram suficientes para que ela vencesse o primeiro Campeonato Brasileiro Feminino da história, em 2013.

Maria Alves acumula convocações para a seleção nos últimos dez anos — Foto: Reprodução/Instagram

Maria Alves acumula convocações para a seleção nos últimos dez anos — Foto: Reprodução/Instagram

– Quando mudei o caminho e fui para São Paulo, começou a maior reviravolta da minha vida, porque acabei ganhando mais visibilidade ainda. Na época, o Centro Olímpico era um timaço: tinha Cristiane, Érika e várias outras jogadoras da Seleção, cheias de conhecimento. Depois de um semestre ali, assinei com o São José (SP), que era outro timaço: tinha Formiga, Andressa Alves e Daiane Bagé, que era uma das melhores zagueiras da Seleção na época. Fiquei um ano lá e fomos campeãs de praticamente tudo.

De fato, em 2014, o São José foi tricampeão da Libertadores, bicampeão paulista e venceu o Mundial de Clubes. Tanto sucesso chamou a atenção do Santos, que não perdeu tempo e logo contratou a atacante piauiense.

Maria Alves foi campeã paulista com o Santos em 2018 — Foto: Reprodução/Instagram

Maria Alves foi campeã paulista com o Santos em 2018 — Foto: Reprodução/Instagram

– Sempre tive o sonho de jogar com as Sereias da Vila. Eu tinha trabalhado com o Modesto Roma em Vitória de Santo Antão. Em 2015, ele era presidente do Santos e me fez o convite. E eu, claro, não podia dizer “não”. Era a realização de um sonho e fui extremamente feliz durante os três anos e meio em que joguei lá. Até que veio mais um passo que eu não esperava: Juventus! Onde passei os últimos dois anos. Essa foi minha trajetória até aqui no futebol.

A Velha Senhora

Maria Alves foi a primeira jogadora brasileira contratada pela Juventus, equipe apelidada de “A Velha Senhora” na Itália. Em dois anos, conquistou quatro títulos: dois Campeonatos Italianos e duas Supercopas da Itália, as competições mais relevantes do país.

– Quando recebi a notícia de que a Juventus queria me contratar, fiquei em choque, não acreditava. Jogar na Europa era um sonho, mas não pensava que Deus fosse me abençoar dessa forma, com esse presentão que é jogar na Juventus, um dos melhores clubes italianos. Foi uma emoção e tanto, fiquei eufórica e nervosa, pensando em tudo: “Meu Deus, como vai ser quando eu chegar lá? Como vou fazer para me comunicar? Onde vou morar?”. Eu imaginava uma coisa e quando cheguei foi outra totalmente diferente, bem melhor do que aquilo que eu imaginava.

Se a comunicação era uma preocupação, chegando lá, a jogadora tirou de letra. A proficiência dela no italiano chama a atenção nas redes sociais. Fãs de várias partes do mundo enviam mensagens em italiano, inglês, espanhol e, claro, português, e Maria responde fluentemente em todos.

– Fiz um pouco de aula de italiano quando cheguei, mas o curso acabou sendo interrompido por causa da pandemia. Então, acabei aprendendo mais no dia a dia. Aprendi um pouco nas aulas, mas eu estudava com meninas que falavam inglês, então ficava tudo mesclado. Também aprendi bastante assistindo a filmes e hoje me viro bem. Antes de vir, eu não falava nenhum idioma além do português, só um pouquinho de espanhol. Aqui acabei aprendendo inglês com as meninas, é mais difícil. Mas entendo bastante coisa. As meninas que falam inglês dizem que aprenderam mais italiano comigo do que na escola quando faziam aula, e eu digo que aprendi mais inglês com elas, no dia a dia, do que em sala. Foi bem importante para mim essa vinda para cá.

Em Turim, o clube cedeu um apartamento para Maria, que vivia sozinha – a Juventus disponibiliza um apartamento para cada jogadora e todas moram sozinhas.

No primeiro ano da brasileira na Itália, a Juve organizou um jantar de Natal com o time principal masculino, o sub-23 e a equipe feminina. Na ocasião, a atacante teve a oportunidade de conhecer vários ídolos e companheiros de clube.

– Foi bem emocionante. Eu não via a hora de que a celebração acabasse para que eu pudesse tirar foto com eles e curtir um pouco aquele momento. Aproveitei e tietei o Cristiano Ronaldo e o Douglas Costa, que admiro e sou muito fã. Foi a primeira vez que tive contato com eles e acho legal a gente ter essa proximidade.

Em campo, a velocidade da atacante logo chamou atenção e ela foi apelidada de “Flash 2.0”. E quando balançou as redes pela primeira vez, em outubro de 2019, fez história a se tornar a primeira mulher brasileira a marcar um gol pela Juventus.

– Quando fiz o primeiro gol pela Juve, fiquei tão emocionada que até cheguei a dançar um sambinha na comemoração. Cheguei com esse jeitinho brasileiro e fui encantando com minha velocidade. Acho que ajudei bastante o time e isso é bem importante.

Na despedida do clube, nesta semana, com o anúncio da contratação pelo Palmeiras, a Juventus homenageou a brasileira:

Depois de duas temporadas juntos, sem falar em dois Campeonatos Italianos e duas Supercopas da Itália, é com estas conquistas que Maria Alves se despede da Juventus para continuar sua carreira no futebol em outro lugar.

A atacante brasileira chegou ao clube no verão de 2019, onde rapidamente se instalou e deslumbrou com sua velocidade ao ser acionada. Depois de estrear na vitória por 2 a 1 sobre o Empoli, Maria marcou o primeiro gol apenas algumas semanas depois contra o Florentia, ocasião em que, mais uma vez, saboreou a vitória.

Desde então, já marcou 10 gols pela Juventus (em todas as competições), enquanto, nesta temporada, deu sete assistências para suas companheiros de equipe Bianconere ao longo da campanha do campeonato (seis delas, de fevereiro para cá). Sua personalidade divertida e vibrante brilhou dentro e fora de campo, conquistando o apoio e a admiração dos fãs.

Agora, enquanto busca se preparar para sua nova aventura, a campeã da Itália pode, sem dúvidas, se orgulhar do que ela conquistou em dois anos no clube.

Obrigada e boa sorte, Maria!

Fonte: Globo Esporte

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