O daltonismo não possui impacto significativo na vida profissional de seus portadores

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Segundo Renata Moreto, o portador dessa condição não é capaz de atuar somente em áreas específicas, como a de piloto de avião e eletricista

Por Felipe Bueno* – Sábado, 6 de janeiro de 2024

Daltonismo — discromatopsia ou discromopsia em termos científicos — é um distúrbio da visão que provoca no indivíduo afetado uma dificuldade na percepção das cores. É uma condição genética, ligada ao cromossomo X, que influi para que ambos os pais possam transmitir a condição para o filho, e estática, isto é, não apresenta piora no quadro de saúde da pessoa que a possui.

Condição genética

A visão das cores está atribuída ao segmento do cromossomo X; dessa forma, indivíduos que possuem alteração nesse fragmento podem adquirir uma modificação congênita nessa percepção colorida. Nesse sentido, por conta da relação com o cromossomo X, as pessoas do sexo masculino possuem maior número de casos positivos para a condição, visto que são indivíduos XY, enquanto as mulheres são XX.

“As mulheres, indivíduos que possuem dois cromossomos X, em geral são carregadoras de genes alterados para visão de cores, mas, como elas possuem esse segundo cromossomo X, não manifestam a doença. Já os homens, que não recebem o segmento no cromossomo Y, apresentam maior incidência dessa alteração”, explica Renata Moreto, chefe do Departamento de Neuroftalmologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da Universidade de São Paulo, que estima que a incidência no sexo masculino seja em torno de 8% no mundo e de apenas 0,5% para o sexo feminino.

De acordo com a médica, o diagnóstico começa a ser realizado enquanto o indivíduo ainda é criança e apresenta dificuldade para nomeação das cores, mas no início isso pode passar despercebido. Após algum tempo, os responsáveis costumam observar a complicação daquela condição e, para comprovar a diagnose, levam-na ao consultório oftalmológico.

Renata Moreto – Foto: Arquivo Pessoal/LinkedIn

No local, o diagnóstico é baseado em testes de visão de cores, sendo o Teste de Ishihara o mais utilizado, o qual consiste na apresentação de placas com números desenhados, de forma não definida e com certo contraste de cores. A partir disso, existe um gabarito, no qual se verifica se o paciente está pontuando de forma correta e, com esse dado, aponta-se a dificuldade visual que possui.

A especialista desenvolve formas de mitigar o problema e diz que não existem tratamentos ou curas para o distúrbio: “Temos os óculos, que tendem a promover uma melhor visualização das cores que já conseguem enxergar e aumenta o contraste, ou diminui, na intensidade de luz que possuem dificuldade, de forma a produzir uma pista do que está vendo e, assim, vai se conseguir nomear um número maior de cores. Os filtros medicinais promovem a diminuição no Efeito Glare, a entrada de luz e aumento do ofuscamento visual nesses pacientes”.

Percepção das cores

As funções visuais são divididas em categorias que definem diferentes aspectos da visão humana: acuidade visual, relacionada à clareza da visão; sensibilidade ao contraste, capacidade de reconhecer tons de cores diferentes; campo visual, campo de visão periférico; estereopsia, visão em terceira dimensão; e visão de cores.

“Os mamíferos que possuem origem placentária, como, por exemplo, os cães, conseguem enxergar apenas duas cores — são dicromatas; já os primatas, evolutivamente, ganharam um gene a mais relacionado à visão de cores e, portanto, são tricromatas, conseguem ter uma percepção do ambiente à sua volta em cores, visto que possuem três genes para processar três tipos de pigmentos”, explica Renata.

Os cones, células correspondentes à visão mais acurada do indivíduo, de forma geral, são divididos em três: azul, vermelho e verde. Apesar de ser possível identificar apenas esses três comprimentos de onda, eles são ativados em diferentes intensidades de luz e isso proporciona que as cores se misturem para produzir, a partir da ativação de porcentagem específicas de cada cone, cores diferentes.

A percepção das cores é iniciada na retina e o processamento visual termina no cérebro, região posterior onde se localiza o lobo occipital, responsável por realizar a interpretação dos espectros. Nesse sentido, o daltônico possui uma alteração que concebe um pigmento a menos ao indivíduo.

Tipos

A mais comum dos diferentes tipos de daltonismo é a protanomalia, condição em que a pessoa tem dificuldade para enxergar cores relacionadas ao vermelho, porém, ainda consegue identificar alguma intensidade de luz nesse espectro. Quando o defeito é total, ou seja, sem nenhum pigmento nos cones vermelhos, é chamado de protanopia — o indivíduo é cego para a cor vermelha.

Outro tipo é a deuteranomalia, quando a condição está ligada a problemas na visualização de cores verdes, e deuteranopia, no caso da ausência de cones dessa cor. A tritanomalia, terceira categoria da doença e a mais rara, ocorre quando o indivíduo possui dificuldades para enxergar o espectro do azul; se ele for cego para o pigmento, tritanopia.

“Na última condição, há uma ausência total dos pigmentos nos cones, essa situação é chamada de acromatopsia, isto é, esse indivíduo é cego para todas as cores. Então, o acromata pode apresentar uma dificuldade na leitura, com luz alta, nistagmo e fotopsia.” A médica complementa que esse é um quadro considerado patológico e, dessa maneira, requer que haja uma maior atenção a esse paciente do que ao daltônico.

Segundo Renata, os indivíduos afetados pelo daltonismo não possuem impactos no seu desenvolvimento cognitivo, ou seja, não há influência na vida acadêmica nem na profissional. No entanto, eles não são capazes de atuar em algumas áreas específicas, por conta da dificuldade na nomeação de cores: carreira militar, piloto de avião e eletricista, por exemplo.

“Essas pessoas não apresentam dificuldade na leitura e não têm quaisquer outras alterações nos cinco componentes da visão. Então, elas têm boa percepção de campo visual, sensibilidade ao contraste e, também, visão em terceira dimensão”, finaliza.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira

Fonte: Jornal USP

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