Setembro Azul

colunistas Priscila Figueredo

Por PriscilaSoares – Quarta, 30 de setembro de 2020


Criança: “O que é isso no seu ouvido?”

 Eu: “É um ouvido biônico, pra ouvir! Assim como têm pessoas que precisam de óculos pra enxergar, eu preciso do implante pra escutar.”

(Criança olhando atenta)

Criança: “Parece um fone pequeno.”

O diálogo acima ocorreu com uma criança de 5 anos, pois crianças são assim: verdadeiras, curiosas e espontâneas, mas poderia ser também com muitas pessoas adultas que não sabem da existência do implante coclear ou nunca viram. Esses aparelhinhos que enfeitam as minhas orelhas e me devolveu a alegria de poder ouvir/escutar muitos sons ainda é visto com estranheza. 

O implante coclear é um ouvido biônico que tem parte interna (através de cirurgia) e externa e desempenha a função da cóclea. Depois da cirurgia, é imprescindível fazer fonoterapias e mapeamentos para ajustar os sons. 

Quando se fala em surdez, pensa-se apenas em surdos que usam a Libras, mas a surdez é heterogênea e diversa: existem surdos que só usam a Libras (sinalizados), surdos que só usam aparelhos, surdos que usam implantes cocleares (oralizados), surdos que usam aparelhos (AASI ou implante coclear) e também usam Libras, e há também surdos que não usam aparelhos e não sabem Libras. Esses últimos, infelizmente, ficam à margem da sociedade, pois não conseguem acessar a infinidade de conhecimentos produzidos pela humanidade, por ter seu direito à educação negligenciado. Na minha experiência de professora, tive contato com algumas alunas surdas, as quais acabaram evadindo da escola por não ter acessibilidade. 

Mas, qual a importância do Setembro Azul? 

Setembro é um mês com datas importantes para a comunidade surda como o Dia Nacional do Surdo (26/09) escolhido por ser a data de fundação do INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos), a primeira escola para surdos do Brasil; Dia Internacional das Línguas de Sinais (23/09), entre outros marcos importantes. Durante a Segunda Guerra Mundial, as pessoas com deficiência eram obrigadas a usar uma faixa azul no braço, pois os nazistas consideravam-nas inferiores. Mais tarde, a cor azul turquesa foi adotada nas campanhas e movimentos da comunidade surda como símbolo de resistência à opressão. 

Atualmente, foi lançada a campanha: Setembro em todos os tons de Azulpara chamar a atenção no que tange à diversidade da surdez. Segundo o Jornal Estadão, “a ação tem participação do projeto Crônicas da Surdez + Surdos Que Ouvem – da escritora e palestrante Paula Pfeifer -, do projeto Desculpe, Não Ouvi – da escritora Lak Lobato -, da Associação Nacional de Surdos Oralizados (ANASO), Associação dos Usuários de Implante Coclear do Estado do Pará (ADEIPA), Associação Amazonense de Apoio aos Deficientes Auditivos e Usuários de Implante Coclear (AMADA) e da Associação de Pais e Amigos de Surdos e Outras Deficiências (APASOD)”. Garantir acessibilidade para as pessoas surdas vai além de disponibilizar janela de Libras, é importante garantir legendas, canais para comunicação via mensagem de texto (bancos, clínicas, lojas, etc.) Durante a pandemia, veio à tona o quanto a sociedade é inacessível para essa parcela expressiva da população brasileira: lives sem legendas, uso de máscaras sem detalhe transparente pra facilitar a leitura orofacial, filmes nacionais, que mesmo em canais pagos, não dispõem de legendas…

Diante da diversidade existente, é importante salientar a coexistência das duas formas de inclusão dos surdos: Libras e legendas. Se queremos incluir todos os surdos, é preciso garantir acessibilidade para todos. Além disso, é essencial disseminar conhecimento, é inadmissível que uma criança abandone a escola, porque não tem profissional capacitado (professor/intérprete de Libras) para atendê-la, é inadmissível que uma criança continue sem ouvir por falta de informação da família sobre a existência do ouvido biônico. Libras ou implante coclear são escolhas para a vida inteira e são essenciais para ser e estar no mundo, portanto, qualquer que seja a escolha da família deve ser respeitada e encontrar espaço para a vida em sociedade. 


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Priscila Figueredo Soares é professora da Rede Pública Estadual da Bahia e autora da página @estesiapoetica.

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