Bactéria ligada à sífilis já estava no Brasil há 2.000 anos

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Quinta, 1 de fevereiro de 2024

Da América para a Europa ou vice-versa? Origem da sífilis é tema de controvérsia científica. Achado em sítio arqueológico de SC aponta presença da Treponema pallidum em terras indígenas muitos séculos antes de Colombo.

Uma equipe internacional de pesquisadores encontrou vestígios de bactéria da espécie Treponema pallidum, responsável pela sífilis, em restos ósseos humanos datando de 2 mil anos atrás, num sítio arqueológico de Santa Catarina, segundo artigo publicado pela revista científica Nature na quarta-feira (24/01).

sífilis é transmitida por contato sexual e, não tratada, pode resultar em demência e morte. Sua primeira epidemia na Europa foi registrada em 1493, em seguida ao cerco de Nápoles pelas tropas francesas. Uma teoria difundida é que a doença teria chegado ao continente com a tripulação de Cristóvão Colombo. Segundo outros, ela já se encontrava no Velho Mundo, mas ainda não fora identificada.

O atual estudo reforça a possibilidade de o patógeno ter sido transportado da América. “É a prova mais contundente e robusta de que havia a Treponema na América do Sul antes da chegada de Colombo, uma hipótese que até agora não havia sido validada”, explica o coautor Fernando González Candelas, professor de genética da Universidade de Valência.

Pesquisas anteriores constataram indícios indiretos em restos humanos da América Central que “eram compatíveis com treponematoses, mas também com outras enfermidades”, portanto faltavam evidências concretas quanto à propagação geográfica da sífilis, destaca Candelas.

DNA de bactéria encontrada em ossadas de Santa Catarina lança luz sobre origem das treponematosesFoto: José Filippini

Pelo menos 500 anos antes de Colombo

O DNA encontrado no sítio arqueológico Jabuticabeira II, na região catarinense de Laguna, lança luz sobre a intricada origem das treponematoses sífilis, bejel (endêmica e não venérea) e piã ou bouba (transmitida por contato com a pele), causadas por subtipos diversos da T. pallidum.

Ao reconstituir-se o genoma do patógeno que infectou os mortos do sambaqui em Santa Catarina, ficou constatado tratar-se da subespécie T. pallidum endemicum. “O que encontramos é uma bactéria da linhagem da do bejel, que hoje em dia se encontra em climas áridos, secos e quentes, muito diferentes do Brasil de 2 mil anos atrás, de clima tropical e úmido”, explica González Candelas.

Assim o achado reforça hipóteses de que as civilizações da América pré-colombiana sofriam infecções treponêmicas, e que portanto as enfermidades estavam presentes no Novo Mundo muitos seculos antes de Colombo zarpar para suas “descobertas“.

Sífilis já existia no norte europeu no século 15?

O estudo não determina a origem da bactéria responsável pela sífilis, nem pode assegurar que esta tenha realmente chegado à Europa com a tripulação de Cristóvão Colombo. De fato: uma pesquisa dos mesmos autores publicada em 2020 indicava a possibilidade “razoável” de que a T. pallidum já se encontrasse no continente europeu antes das expedições à América.

A hipótese se baseou em vestígios de treponematoses em restos humanos da Finlândia, Estônia e Holanda, datando de princípios do século 15 até o século 18. Os indivíduos teriam sofrido de sífilis e piã, a qual atualmente só se manifesta em regiões tropicais e subtropicais.

Assim estaria demonstrado “com evidência genômica” que a sífilis estava presente na Europa na Idade Moderna, mas “não podemos estabelecer que fosse antes do regresso da primeira expedição de Colombo [em 1492]”, esclarece o geneticista González Candelas.

Para tal, seria necessário encontrar traços do patógeno da sífilis anteriores às viagens à América e “ver se essa linhagem aparece a seguir na Europa, exatamente igual”. Este, todavia, não é o caso, até agora.

av/cn/ra (EFE,ots)

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