Proibição de bebidas alcoólicas em estádios de São Paulo é constitucional

justiça

Por Tábata Viapiana – Sábado, 19 de fevereiro de 2022

O Estatuto do Torcedor não particulariza quais bebidas estão proibidas nos estádios, traçando linhas gerais sobre as condições de ingresso e permanência do torcedor em recintos esportivos, incumbindo aos Estados-membros a adequação da legislação às peculiaridades locais.

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Com base nesse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou a constitucionalidade de duas leis, do estado e do município de São Paulo, que proíbem a comercialização de bebidas alcoólicas em estádios de futebol. 

O caso teve origem em uma ação movida por um clube da capital, que buscava autorização para vender bebidas alcoólicas em seu estádio. Ao apreciar o pedido, a 2ª Câmara de Direito Público suscitou o incidente de inconstitucionalidade, que foi encaminhado ao Órgão Especial, mas julgado improcedente.

No voto, o relator, desembargador Renato Sartorelli, citou a Lei 10.671/2003, que dispõe sobre o Estatuto de Defesa do Torcedor e proíbe em seu artigo 13-A (incluído pela Lei 12.299/2010), o porte de bebidas suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência em recintos esportivos.

“O artigo 13-A não particulariza quais seriam as bebidas de acesso proibido, traçando linhas gerais sobre as condições de ingresso e permanência do torcedor em recintos esportivos, incumbindo aos Estados-membros a adequação da legislação às peculiaridades locais, definindo quais bebidas são proibidas, tudo em homenagem à competência concorrente complementar do legislador estadual consagrada pelo texto constitucional”, disse.

Sartorelli também citou entendimento do TJ-SP de que a medida amplia a segurança dos torcedores, “promovendo a defesa desses grupos de consumidores, assim como de outras pessoas que estejam direta ou indiretamente envolvidas no evento, constituindo legítima expressão da competência normativa concorrente do Estado de São Paulo”.

O relator citou inúmeros julgamentos em que o Órgão Especial reconheceu a inconstitucionalidade de leis municipais que permitiam a venda de bebidas alcoólicas nos estádios em razão da proibição prevista em norma estadual. Ele também indicou precedentes em que o STF reconheceu a autonomia dos estados para decidir pela proibição ou liberação de bebidas alcoólicas em eventos esportivos.

“Logo, tendo a jurisprudência do Pretório Excelso enfatizado a autonomia dos Estados-membros para dispor sobre o tema em questão, não se vislumbra qualquer vício de inconstitucionalidade no artigo 5º, inciso I, da Lei  9.470/1996 do Estado de São Paulo, resultando de opção legítima do legislador estadual à luz das especificidades locais”, completou Sartorelli.

O magistrado afastou o argumento de que a proibição poderia ferir o princípio da isonomia ou da livre concorrência, ou até mesmo interesses comerciais dos clubes de futebol e da indústria de bebidas alcoólicas. Para ele, essas questões não devem se sobrepor à política de segurança pública em vigor no estado.

“É inegável o efeito negativo do álcool sobre o comportamento humano, sendo de conhecimento geral a existência de episódios de violência associados a eventos esportivos, afigurando-se absolutamente despropositado invocar violação ao princípio da isonomia e da livre concorrência ou eventuais interesses comerciais e de arrecadação da indústria de bebidas alcóolicas e dos clubes em detrimento de norma protetiva da segurança de consumidores-torcedores, legitimamente editada pelo Estado-membro e reproduzida na capital”, pontuou.

Interferência indevida do Judiciário


Sartorelli afirmou que a proibição não impede por completo a atividade econômica da indústria de bebidas alcoólicas ou dos clubes de futebol, uma vez que a norma atinge apenas os estádios e ginásios de esportes, não tendo o condão de impedir a atividade-fim dos clubes responsáveis pelos recintos esportivos.

“Conquanto a restrição ao consumo de bebidas alcóolicas não seja a única medida a ser adotada pelo poder público no combate a tema tão complexo como o da violência em estádios, tenho para mim que não é lícito ao Poder Judiciário interferir nas escolhas políticas democraticamente positivadas pelo legislador paulista à luz da realidade local, cumprindo enfatizar que se trata do Estado que abriga as maiores torcidas do país”, afirmou o relator.

Ainda na visão do magistrado, o acolhimento do incidente permitiria a venda e o consumo irrestritos de bebidas alcóolicas em estádios paulistas, “que possuem, historicamente, diversos episódios de violência entre torcidas”, eliminando qualquer mecanismo de controle e regulação estatal relacionado ao tema.

“Colocando o Estado de São Paulo em verdadeiro vazio normativo, diversamente dos Estados que optaram por flexibilizar a matéria, o que constituiria verdadeira iniquidade e retrocesso, em absoluto descompasso com a razoabilidade, resultando em vício de inconstitucionalidade ainda mais grave do que aquele defendido na exordial. Há de prevalecer o bem-estar coletivo e a segurança dos consumidores-torcedores protegidos por norma estadual vigente”, concluiu.

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0037368-14.2021.8.26.0000

Fonte: Conjur


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