ORJI EMUC construindo cidadania musical

cultura

Por Ipirá City – Sexta, 9 de junho de 2023

As orquestras populares, as bandas filarmônicas e as fanfarras do interior do Brasil carregam consigo um know-how inalienável de sobrevivência histórica. Tal recurso seria a versatilidade da montagem dos seus repertórios, a partir da apropriação de elementos da memória coletiva e afetiva como principal mediador de cooptação para introduzir à apreciação da música, especificamente instrumental, sobre um público, muito mais afiliado à música vocalizada (cantada).

Essa realização nunca foi tarefa fácil ontem, tampouco hoje, informa Sue Menezes ( Coord. da ORJI) – Catu EMUC ao Portal Ipirá City.

Sob essa perspectiva de relocalização de protagonismos invisibilizados que acontece com a música sobrevivente fora do eixo, nasceu em dezembro de 2018 a Orquestra Juvenil Itinerante -ORJI- na cidade de Catu, percorrendo caminhos pouco cômodos de produção musical nos tempos atuais, mas não menos enriquecedores, sobretudo na perspectiva comunitária. É signatária direta da resiliente e corajosa proposta de cumprimento da função música coletiva e educação musical gratuita, desenvolvida pelo projeto Escola de Música Cidadã (EMUC) há mais de 20 anos (contabilizando mais de 450 jovens iniciados em música), no mesmo município, pelo seu fundador, o Professor Edinaldo de Paiva (Maestro Mutuquinha).

LAB FACOM

Com ensaios inseridos no intervalo de vida produtiva e\ou estudantil dos seus alunos, a ORJI EMUC dedica-se às tardes dos sábados e, alternadamente, dos domingos à construção e o exercício dos repertórios que compõem os seus concertos. De Bee Gees e temas de cinema, passando por Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Edu Lobo, Moacir Santos, Hermeto Pascoal, Mateus Aleluia, até composições autorais (do próprio Edinaldo) são parte do que é orgulhosamente ofertado àqueles que para além de os ouvirem, permitem-se escutar as suas apresentações.

O conceito de “itinerância” que preenche o nome da ORJI EMUC sinaliza a construção de cidadanias mais generosas para a identidade dos seus membros e do seu entorno, a partir da mobilização dos diálogos de territorialidade que se espelham e se estabelecem com a circulação artístico-cultural. São cerca de 25 alunos-músicos voluntariados na orquestra, regidos por Edinaldo, também mantenedor, compositor, arranjador e músico desta.

A ORJI EMUC realiza a circulação dos seus concertos, sem nenhum apoio institucional -público ou privado- nos potenciais equipamentos de cultura da Bahia, promotores de pautas sociais de ocupação (gratuitas). E, ainda sob o esforço hercúleo (de custeio complementar) dessas pautas, resiste, ocupa e retorna -com novos convites- na maioria dos espaços nos quais se apresenta ovacionadamente.

Dos espaços ocupados -por seleção em pautas sociais ou convites diretos- que constam no currículo da orquestra estão, também, significativos espaços cívico-sociais, culturais e artísticos dentro da região na qual está localizada (escolas estaduais, câmaras dos vereadores e instituições asilares) e fora dela, tais como: Festival Novembro Corpo Negro na UFBA; a Sala do Coro do TCA; a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos; o Cine Metha Glauber Rocha, a Sala Letieres Leite do SESI\FIEB (no próximo dia 18 de junho) e a Flipelô (no  dia 12 de agosto 2023) e mais outros 18. Vale ressaltar que das suas quase 24 apresentações realizadas, até hoje, subtraem-se os quase dois anos de intervalo pandêmico, o que sinaliza uma  média de quase 01 apresentação por mês.

A parcimônia em compreender o potencial de produtividade e retorno cultural, que iniciativas resistentes e até, potencialmente, quixotescas como a ORJI EMUC imprimem ao seu lugar de origem, ao seu entorno e fora das suas fronteiras, manifestam-se na quase total invisibilidade destas iniciativas dentro dos calendários festivos dos seus municípios e\ou na indiferença com alguma demanda que se apresente (transporte e etc), por exemplo. 

Contraditoriamente, entidades dessa monta levam sempre o nome de onde partem e tal iniciativa é ao mesmo tempo uma reafirmação da sua cultura e um restabelecimento do seu sentimento de pertença territorial, ambos combustíveis importantíssimos para a reificação da sua potência. Vale lembrar que projetos como a referida orquestra (que fomenta Educação em música, produz um agente artístico e difunde o resultado musical que circula por sítios outros), com tal regularidade de ensaios e número de componentes, mantida exclusivamente pelo suor (e amor) do seu fundador é rara, senão única no estado.  

Que os novos ventos e investimentos, assim como a atual gestão em Cultura – representada pela mais democratizada paleta de cores dentro da cultura nacional até hoje-  possam enxergar e potencializar projetos e manifestações artísticas marginais que se localizam fora do eixo capital\central, estético, produtivo e criativo, também.

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